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O MONSTRO DA LAGOA NEGRA

DVD

autorGilberto Schoereder
publicado porGilberto Schoereder
data02/10/2014
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A Universal lança edição comemorativa dos 60 anos do clássico de Jack Arnold, com versões em 3D e 2D.

Os filmes com seres monstruosos foram muito populares nos anos 1950 e 1960, na ficção científica e terror. Quase sempre, esses monstros iam atrás da “mocinha” do filme, por nenhuma outra razão que não o desejo de estar em sua companhia. Ou então, queriam mesmo era copular.
O mesmo acontece no clássico O Monstro da Lagoa Negra, que está ganhando uma edição comemorativa de 60 anos, em Blu-Ray da Universal, com versões em 3D e 2D. A perseguida, no caso, é Julia Adams. Como ela é a única personagem feminina do filme, o monstro não teria muitas opções, mas, cá entre nós, se eu fosse o monstro, também iria persegui-la.


Para quem ainda não conhece o básico, uma expedição geológica ao Amazonas descobre os restos fossilizados de uma garra, que indica a existência de um ser anfíbio ainda desconhecido. O cientista responsável retorna com as evidências ao seu instituto de biologia marinha, também no Brasil, e convence seus colegas cientistas a acompanharem-no ao local para averiguar melhor o achado. Claro que, chegando lá, percebem que o ser anfíbio é mais do que um fóssil, e ameaça suas vidas. E, aparentemente, como já disse, também quer copular.
É verdade que, hoje em dia, os filmes de ficção científica e de terror dos anos 1950 são, muitas vezes, menosprezados pela audiência mais jovem (ou nem tão jovem assim), em especial pela pobreza dos efeitos especiais quando comparados com os atuais. Claro que a diferença é brutal, mas é importante também levar-se em consideração que aquela foi uma das décadas mais ricas para o cinema do gênero, com o surgimento de vários clássicos.


A criatura em si, também chamada de Gill Man, tem lugar de destaque entre os famosos monstros da Universal, e o filme tornou-se uma inspiração para sucessos mais recentes. É o caso de Tubarão, de Steven Spielberg. Phil Hardy, no livro Encyclopedia of Science Fiction Movies, diz que Spielberg foi fortemente influenciado pelo estilo e atmosfera do filme de Jack Arnold. Quem vê as cenas do monstro observando Julia Adams nadando, certamente vai fazer a relação com a cena inicial de Tubarão. Arnold disse que queria explorar ao máximo o medo básico que as pessoas têm a respeito do que pode estar abaixo de qualquer superfície de água, o medo do desconhecido; mas também queria criar uma simpatia com relação ao monstro.



Stephen King é outro que se lembra do filme, tanto da primeira vez a que assistiu, como quando viu já adulto. Em seu livro Dança Macabra, ele destacou que, apesar dos valores de produção baixos, Arnold conseguiu o que todo escritor ou diretor que já trabalhou com o gênero espera: “Envolvimento emocional total, engrossado pela ausência de todo e qualquer processo intelectual propriamente dito. Para manter o clima é necessário existir o que Coleridge, em seu ensaio sobre a poesia imaginativa, chamou de ‘suspensão da desconfiança’”. King ainda diz que “A diferença em vendas entre Arthur Hailey e H.P. Lovecraft pode existir devido ao fato de que todo mundo acredita em carros e bancos, mas é uma operação intelectual sofisticada e penosa acreditar, mesmo que por alguns instantes, em Nyarlathotep, o Cego Sem Rosto que Uiva Durante a Noite”. E completou com a frase deliciosa: “E a qualquer momento em que eu me depare com alguém que expresse um sentimento numa sentença como ‘Eu não leio fantasia, nem vou a nenhum desses filmes; nada disso existe’, eu sinto uma espécie de comiseração. Eles simplesmente não conseguem sustentar o peso da fantasia. Os músculos da imaginação tornaram-se atrofiados”.


A “suspensão da desconfiança”, é claro, torna-se absolutamente necessária para assistir a O Monstro da Lagoa Negra, em particular numa época em que os efeitos especiais definitivamente substituíram a cuidadosa elaboração de um clima de terror ou fantástico. Seja como for, é uma boa oportunidade para quem gosta do gênero conhecer, rever ou simplesmente ter no acervo mais um clássico.


Jack Arnold
Apesar da fama, O Monstro da Lagoa Negra não é o melhor do diretor Jack Arnold. Esse título certamente fica com o excepcional O Incrível Homem que Encolheu (The Incredible Shrinking Man, 1957), também da Universal, que tem como vantagem ter sido escrito por Richard Matheson, nada menos do que um dos maiores escritores de literatura fantástica de sua época.
Ter um filme entre os clássicos do cinema fantástico parece muito bom para um diretor; ter dois filmes nessa lista, melhor ainda. Mas Arnold já estreou dirigindo o que também se tornaria um clássico: Veio do Espaço (It Came From Outer Space, 1953. Universal), baseado no conto “O Meteoro”, de Ray Bradbury.
Arnold também dirigiu a sequência A Revanche do Monstro (Revenge of the Creature, 1955), mas ficou fora do terceiro filme da série, Caça ao Monstro (The Creature Walks Among Us, 1956). Sim! Desde aquela época os estúdios já se preocupavam em realizar sequências absolutamente insípidas para faturar o máximo possível com a mesma história, ou monstro, no caso.
Jack Arnold também dirigiu outros filmes no gênero fantástico, uns melhores, outros piores, mas nenhum como os seus “clássicos”. Tarântula (Tarantula, 1955), Mensagem do Planeta Desconhecido (The Space Children, 1958) e Monstro Sanguinário (Monster on the Campus, 1958) são alguns desses trabalhos menores, ainda que, às vezes, interessantes.
Ele também dirigiu alguns episódios da série Science Fiction Theatre, em 1955, quase desconhecido no Brasil, mas bastante famosa nos EUA.
Teve uma passagem mais do que interessante pela comédia em 1959, com o excelente O Rato Que Ruge (The Mouse That Roared), com Peter Sellers, que interpreta três personagens.
E, a partir do final dos anos 1950, dirigiu episódios de seriados muito conhecidos como Peter Gunn (1959/1960), Dr. Kildare (1963), Perry Mason (1964/1965), A Ilha dos Birutas (Gilligan’s Island, 1966), A Mulher Maravilha (Wonder Woman, 1977), A Mulher Biônica (The Bionic Woman, 1978), Buck Rogers (Buck Rogers in the 25th Century, 1981) e O Barco do Amor (The Love Boat, 1979/1981/1983/1984).
Jack Arnold faleceu em 1992, aos 75 anos.