O HOMEM DO TERNO BRANCO (The Man in the White Suit, 1951)
Alec Guiness (Ealing Studios).
Direção de Alexander Mackendrick.
Produção inglesa do Ealing Studios, um dos mais conhecidos do mundo e o mais antigo em atividade contínua desde 1902. Entre outras produções, ele ficou famoso por uma série de comédias, o que levou o crítico John Brosnan (em The Encyclopedia of Science Fiction) a dizer que “Esse filme agradável é uma sátira inteligente e pertinente, cujo sucesso se deve mais às tradições das comédias do Ealing Studios do que à ficção científica propriamente dita”.
E certamente é um daqueles filmes que não são imediatamente reconhecidos como pertencendo ao gênero, ainda que tenha sido eleito pelo jornal The Guardian como um dos 20 melhores filmes ingleses de fc, e o British Film Institute considerou o 58º melhor filme britânico de todos os tempos.
O grande ator Alec Guiness interpreta Sidney Stratton, um químico que desenvolve uma fórmula para a construção da roupa perfeita, que nunca se acaba. Mas isso é apenas o começo de seus problemas, uma vez que as indústrias não podem aceitar que seu produto seja colocado no mercado, o que acabaria com os lucros deles. Obviamente, os trabalhadores do setor tampouco o apoiam, uma vez que isso significará o fim de suas possibilidades de trabalho.
Ele acaba sendo perseguido por todos, até que se descobre que o produto não é estável, desfazendo-se tempos depois. No entanto, o final sugere que, longe de ter acabado o problema na economia mundial, ele está recomeçando, pois o inventor tem outra ideia para solucionar a falha em sua invenção.
O filme lida diretamente com as implicações sociais da pesquisa cientifica e sua aplicação no dia-a-dia. Um filme excelente, rodado em preto e branco, e que não é exibido no Brasil há muito. Aparentemente, está disponível no Uol Play com o título O Homem no Terno Branco.
O INVENTOR DA MOCIDADE (Monkey Business, 1952)
Cary Grant, Ginger Rogers, Marilyn Monroe e Robert Cornthwaite (Twentieth Century Fox).
Direção de Howard Hawks.
Uma comédia clássica com direção de um dos maiores cineastas da história do cinema, autor de inúmeros clássicos em diversos gêneros, incluindo uma participação não creditada na ficção científica O Monstro do Ártico (The Thing From Another World, 1951). E ainda tem a presença de Cary Grant, Ginger Rogers, Charles Coburn e Marilyn Monroe.
Grant interpreta o cientista Dr. Barnaby Fulton, que pesquisa o soro da juventude, o elixir B-4, que acaba sendo descoberto acidentalmente por um chimpanzé que se solta no laboratório. O elixir é colocado por engano no bebedor de água, e Grant e a esposa Edwina (Ginger Rogers) retornam aos seus tempos de adolescentes, causando uma imensa confusão entre cientistas e pessoal do laboratório.
O filme é uma delícia, engraçado e com grandes atuações. O crítico Peter Nicholls disse que “Em meio à farsa bem orquestrada, um ponto bastante sério é levantado sobre experiências com hormônios, quando a anarquia assola fortemente no coração da vida adulta”. Phil Hardy disse que “(...) o filme é um ensaio sobre a responsabilidade, no qual o elixir B-4 abre o assustador mundo anárquico (visto em sua forma mais perturbadora na conclusão do filme, na qual todos os principais personagens retornam a comportamentos infantis, balançando pelo laboratório como chimpanzés) que se encontra logo abaixo da superfície da vida civilizada”. Hardy ainda entende que essa é uma das mais admiráveis comédias americanas.
No Brasil, lançado em DVD (Classicline)
OS OLHOS SEM ROSTO (Les Yeux Sans Visage, 1960)
Edith Scob, com sua máscara escondendo o rosto destruído (Champs-Élysées Productions/ Lux Film).
Direção de Georges Franju.
Produção conjunta da França e Itália, também conhecida pelos títulos Eyes Without a Face e The Horror Chamber of Dr Faustus. Pierre Brasseur interpreta o médico que tenta consertar o rosto de sua filha (Edith Scob), destruído em um acidente causado por ele mesmo. Para isso, precisa da pele de outras mulheres. Outro filme que causou reações opostas, uns amando, outros odiando o trabalho de Georges Franju, de resto um diretor bastante conceituado.
Às vezes, é tido unicamente como um filme de terror; outras vezes, é citado entre aqueles no limite da ficção científica.
Phil Hardy disse que o filme é uma obra-prima “sombriamente poética” de Franju, que causou repulsa entre os críticos quando estreou na Inglaterra, depois de ter uma estreia controvertida no Festival de Edimburgo, com alguns espectadores chegando a desmaiar. Certamente, devido a algumas cenas explícitas, como a do médico cortando e removendo a pele do rosto de uma das vítimas, cena que Michael Weldon disse que, 20 anos depois, os efeitos de maquiagem não conseguiam duplicar.
Hardy ainda lembra que o filme de Franju foi produzido na mesma época que Satã e a Mulher Nua (Die Nackte und der Satan, 1959), dirigido por Victor Trivas, e os dois estabeleceram os elementos básicos de praticamente todos os filmes seguintes apresentando médicos loucos.
No Brasil, lançado em DVD (Magnus Opus).
SETE DIAS EM MAIO (Seven Days in May, 1964)
Burt Lancaster e Kirk Douglas (John Frankenheimer Productions Inc./ Joel Productions/ Seven Arts Productions/ Cayuga Productions/ Paramount Pictures).
Direção de John Frankenheimer.
Um bom exemplo de filme no limite, quase nunca surgindo em enciclopédias do gênero. Tinha tudo para dar certo, e deu. O diretor John Frankenheimer em grande momento, vindo dos sensacionais O Homem de Alcatraz (Birdman of Alcatraz, 1962) e Sob o Domínio do Mal (The Manchurian Candidate, 1962); roteiro de Rod Serling, o criador de Além da Imaginação (The Twilight Zone, 1959-1964), baseado em livro de sucesso de Fletcher Knebel e Charles W. Bailey II (no Brasil, lançado pela Record com o título Sete Dias de Maio, o mesmo título do relançamento do filme em VHS e em DVD da Classicline); elenco excepcional com Burt Lancaster, Kirk Douglas, Frederic March, Ava Gardner e Edmond O’Brien.
A história apresenta os Estados Unidos passando por momentos difíceis. O presidente Jordan Lyman (March) assina um tratado nuclear com os soviéticos, enquanto o general Scott (Lancaster) planeja um golpe de estado com a intenção de “colocar o país nos eixos”, ou seja, estabelecer uma linha dura de direita, o que ao longo do filme é apresentado como um perigo real, mesmo em uma democracia tida como inabalável como a dos EUA. Kirk Douglas é o coronel Martin Casey, que descobre o que está sendo planejado em uma base secreta no Texas, e alerta o presidente.
Um dos melhores filmes da década e, como o outro filme de Frankenheimer comentado a seguir (O Segundo Rosto), com tons sombrios que envolvem completamente a audiência, criando um clima de paranoia, com a sensação de perigo iminente.
Em 1994, a HBO produziu uma nova adaptação, com o título Ninho de Cobras (The Enemy Within), com direção de Jonathan Darby, com Forest Whitaker, Sam Waterston e Jason Robards. O novo roteiro adapta as situações para a época pós-Guerra Fria em que o país vivia, e tem boas soluções, ainda que não tenha o mesmo impacto e categoria do filme de Frankenheimer.
O SEGUNDO ROSTO (Seconds, 1966)
Rock Hudson (Joel Productions/ John Frankenheimer Productions Inc./ Gibraltar Productions).
Direção de John Frankenheimer.
Ainda que o filme apareça em várias enciclopédias de FC, O Segundo Rosto é certamente um daqueles filmes que estão no limite. E é um dos melhores e mais impressionantes de sua época, impactante ainda hoje, com roteiro preciso de Lewis John Carlino, baseado no livro com o mesmo título, de David Ely (1963, no Brasil, lançado pela José Olympio), e fotografia excepcional de James Wong Howe, além da atuação impecável de Rock Hudson.
O diretor Frankenheimer, no ponto alto de sua carreira, penetra no pesadelo e na paranoia do mundo contemporâneo, criando imagens envolventes que, por vezes, beiram o surrealismo, e conseguindo manter um clima de pesadelo, suspense e dúvida do primeiro ao último momento.
John Randolph interpreta Arthur Hamilton, um homem que está chegando aos 60 anos e sente que sua vida não teve muito sentido. Quer mudar, quer algo novo. Em uma estação de metrô recebe um bilhete onde é indicado o local onde deve se apresentar para uma entrevista que poderá resolver seu problema. Trata-se de uma organização secreta, misteriosa, que realiza operações de rejuvenescimento. Aparentemente, uma operação inédita é realizada com ele, modificando todo seu corpo de forma a lhe dar uma nova identidade, a de Antiochus Wilson (Rock Hudson). A organização se encarrega de apagar sua vida passada, simulando sua morte. Toda sua vida futura é preparada por eles e Wilson vai morar em uma casa afastada, na praia, para ser um pintor e apaixonar-se por Nora Marcus (Salome Jens).
Salome Jens.
Encontra novos amigos, todos jovens, e embebeda-se em sua nova vida, até perceber que todas as pessoas no local passaram pelo mesmo processo que ele. Torna-se amargurado, com vontade de retornar à sua antiga vida, à família, mas isso já não é mais possível e ele tem de ceder seu novo corpo para alguém que deseje utilizá-lo de fato.
Os momentos de terror e alucinação de Hudson são sublinhados por imagens distorcidas, a organização secreta se mostra perigosíssima, e o final é arrepiante.
John Brosnan e Peter Nicholls disseram que a ideia do filme é antiga, “(...) mas sua fria evocação de paranoia – todos os melhores filmes de Frankenheimer apresentam conspirações poderosas utilizando meios tecnológicos de manipulação – (...) estava à frente de seu tempo, antecipando os sombrios filmes de conspiração dos anos 1970”.
Para Phil Hardy (em The Encyclopedia of Science Fiction Movies) o filme é um estudo convincente sobre a paranoia, sendo mais um representante da crescente desilusão de Frankenheimer com a tecnologia, como os anteriores Sete Dias em Maio e Sob o Domínio do Mal.
Um grande filme, imperdível, e infelizmente pouco reprisado no Brasil, mas lançado em DVD (Lume Filmes).
O HOMEM QUE SONHAVA COM A REALIDADE (The Deadly Dream, 1971)
Lloyd Bridges (Universal Television).
Direção de Alf Kjellin.
Produção feita para a TV e praticamente desconhecida, com Lloyd Bridges no papel central como um cientista que realizou uma descoberta importante e começa a ter pesadelos terríveis, nos quais é perseguido por pessoas que não desejam que sua descoberta seja revelada à humanidade. Os pesadelos são muito reais, e logo ele começa a perceber indícios físicos de que os pesadelos são reais. A situação se torna cada vez mais intensa, a ponto dele não saber mais o que é sonho e o que é realidade.
Parece um filme de fantasia, ou terror, mas de alguma forma sempre considerei como uma história de universos paralelos, para os quais o personagem atravessa por meio dos sonhos, muito parecido com Os Demônios de Randolph Carter e outras histórias de H.P. Lovecraft.
Seja como for, apesar de nem sempre ser bem recebido pela crítica – e, geralmente, ignorado – o filme tem um excelente clima de suspense e paranoia crescente, com os eventos chegando a um termo nos dois universos, ainda que o final seja mantido em aberto.
Infelizmente, não é o tipo de filme que costuma ser reprisado na televisão e muito menos nos canais de streaming.
Direção de B.W.L.Norton.
O HOMEM TERMINAL (The Terminal Man, 1974)
George Segal (Warner Bros.).
Direção de Mike Hodges.
Baseado no livro com o mesmo título de Michael Crichton, apresenta George Segal como um técnico em computação que passa por problemas mentais, atravessando períodos de inconsciência e alucinação nos quais se sente compelido à agressividade.
Uma equipe de cientistas resolve realizar uma operação inédita, implantando eletrodos em seu cérebro, ligados a um computador, de tal forma que, cada vez que as alucinações começarem, ele recebe pequenos choques que detêm o ataque. E no início tudo vai bem, mas seu cérebro começa a forjar os ataques para receber os choques nos quais se viciou, levando Segal a um estado de alucinação e violência constante, com um final nada favorável a ele.
O livro teve uma recepção bem mais favorável da crítica do que o filme. Peter Nicholls, David Langford e John Brosnan ressaltaram que as citações de T.S. Eliot, a música de Bach e vários simbolismos apresentados no filme parecem ambicionar algum significado, mas, no final, não são muito profundos. “A relação mutuamente destrutiva entre o homem e a máquina”, dizem, “é interessante; os estereótipos (médicos monstruosos, etc.) são rudes”.
Já Phil Hardy considerou o filme um thriller superior, apesar das críticas recebidas em sua estreia norte-americana devido à sua autoconsciência, que se dizia ser fora de lugar em um filme de “ação”. Para Hardy, o filme examina a perspectiva assustadora de homem e máquina presos em uma relação simbiótica que é mutuamente destrutiva. “O resultado”, diz Hardy, “é um filme que cobre o mesmo terreno de A Laranja Mecânica (1971), mas com a diferença de que enquanto Stanley Kubrick celebra a violência de Malcolm McDowell como uma marca do livre-arbítrio em uma sociedade totalitária, Segal, depois de ter sido operado por médicos bem intencionados, é o mesmo de antes”.
O filme foi lançado em DVD no Brasil (Versátil), e apesar das críticas nem sempre favoráveis, vale a pena ser visto.
LUA NEGRA (Black Moon, 1975)
Cathryn Harrison (Nouvelles Éditions de Films/ Bioskop Film).
Direção de Louis Malle.
Apesar de situar-se em um suposto futuro em que ocorre uma guerra civil entre homens e mulheres, o filme quase sempre é situada no ambiente da fantasia e terror, repleto de imagens simbólicas, geralmente de difícil interpretação.
A jovem Lily (Cathryn Harrison) procura fugir dessa situação, seguindo em seu carro por uma estrada até chegar a um local aparentemente isolado de tudo. Ali, encontra um unicórnio, um casal de irmãos que pouco ou nada falam, e uma velha deitada em uma cama, fazendo relatórios sobre a jovem para um aparelho de rádio.
Tudo indica que o mundo fantástico que a jovem presencia é sua forma de escapar da realidade violenta do mundo, que insiste em se imiscuir em seu universo de fantasias quando os dois irmãos começam a brigar.
Momentos interessantes, mas não se trata de um filme para ser acompanhado por qualquer um, e sua relação com a FC é, na melhor das hipóteses, apenas tênue. Segundo alguns críticos, foi parcialmente inspirado na Alice de Lewis Carroll.
Direção de David Lynch.
Direção de Brian De Palma.
Vários filmes que abordam o tema dos poderes mentais extraordinários, muitas vezes não são clasificados como ficção científica, como é o caso desse A Fúria e de A Incendiária, listado mais abaixo.
E, apesar de não ter sido recebido com muito entusiasmo pela crítica, é injustamente menosprezado e vale a pena asistir.
Quase nunca é reapresentado na TV, mas no Brasil chegou a ser lançado em DVD (Fox).
Direção de Joe Dante.
Direção de David Cronenberg.
SÍNDROME DA CHINA (The China Syndrome, 1979)
Jack Lemmon, Michael Douglas e Jane Fonda (Columbia Pictures/ IPC Films/ Major Studio Partners).
Direção de James Bridges.
Jane Fonda interpreta a repórter Kimberly Wells que, junto com seu cinegrafista Richard Adams (Michael Douglas), está em uma usina nuclear fazendo uma reportagem quando presencia um acidente causado por um tremor de terra, filmando o desespero do supervisor da usina, Jack Godell (Jack Lemmon), que por sua atuação ganhou o prêmio de melhor ator no Festival de Cannes.
Nas investigações que se seguem, Lemmon tenta provar que a usina não é segura e que poderá ocorrer a chamada “síndrome da China”, o derretimento do núcleo do reator, que atravessaria a crosta terrestre, com danos incalculáveis ao planeta.
As interpretações de Jane Fonda, Jack Lemmon e Michael Douglas sustentam o clima de suspense e, além disso, o filme chamou ainda mais a atenção por tornar-se, apenas duas semanas após sua estreia, o retrato da realidade, com o acidente ocorrido na usina nuclear de Three Mile Island, na Pennsylvania.
Peter Nicholls definiu o filme como uma ficção científica na “linha divisória”, podendo ser colocado em um subgênero de desastres tecnológicos em um futuro próximo – como A Morte Vem do Céu (Endangered Species, 1982) e Jogos de Guerra (WarGames, 1983) – e uma espécie de ficção científica na extremidade do gênero, ainda que normalmente feita na forma de um thriller de conspiração.
No Brasil, foi lançado em VHS e em DVD (Lk-Tel/ Sony).
Direção de Ken Russell.
Direção de Terry Gilliam.
A GUERRA DO FOGO (La Guerre du Feu, 1981)
Rae Dawn Chong e Everett McGill, observando a Lua (International Cinema Corporation/ Ciné Trail/ Belstar Productions/ Stéphan Films/ Gruskoff Film Organization).
Direção de Jean Jacques Annaud.
Produção franco-canadense. Com certeza o mais belo exemplar no cinema da chamada “FC no passado”, baseado em história do escritor belga J.H. Rosny Aîné, La Guerre du Feu (1909). A história situa-se milhares de anos no passado, quando os primitivos seres humanos começavam a descobrir suas potencialidades e do seu planeta.
Uma tribo é a base da história, em sua busca desesperada pelo fogo, que guardavam com todo o cuidado, mas que acabaram perdendo. Em sua jornada, vêm sua pequena tribo ser despedaçada aos poucos, mas ganham em experiência, principalmente no que diz respeito ao contato com grupos mais adiantados e que já conheciam o uso do fogo e como prepará-lo.
Alguns momentos de intensa magia, como quando se encontram com os mastodontes, considerados por eles seres mágicos, e fazem uma oferenda para que os deixem passar por seu campo.
O filme nem sempre foi muito bem recebido pela crítica, mas é simplesmente fabuloso, uma das mais completas e perfeitas reconstituições de uma época, com a participação de Desmond Morris (O Macaco Nu) na elaboração de uma linguagem gestual e corporal para os primitivos, e de Anthony Burgess (A Laranja Mecânica) para a linguagem articulada.
No Brasil, lançado em VHS e em DVD (Abril Vídeo/ Obras Primas do Cinema).
CHAMAS DA VINGANÇA (Firestarter, 1984)
David Keith, Drew Barrymore e Heather Locklear (Dino De Laurentiis Company/ Universal Pictures).
Direção de Mark Lester.
Baseado no livro A Incendiária (Firestarter, 1980), de Stephen King, adaptado em roteiro do veterano Stanley Mann (também responsável, entre tantos, pelos excelentes O Rato que Ruge [The Mouse That Roared, 1959], O Colecionador [The Collector, 1965], As Sete Máscaras da Morte [Theatre of Blood, 1973]). Como ocorre com outros filmes envolvendo capacidades telepáticas, nem sempre é visto como ficção científica.
Tem ótimas interpretações de Drew Barrymore, então com nove anos, George C. Scott e Martin Sheen. Ela interpreta Charlie McGee, uma jovem com poderes paranormais excepcionais, sendo o principal deles a capacidade de incendiar quaisquer objetos. A explicação é que seus pais, Andrew (David Keith) e Vicky (Heather Locklear), serviram como cobaias em uma experiência do governo quando estudavam na faculdade, com uma droga chamada LOT-6. Outras pessoas que participaram da experiência sofreram com os efeitos colaterais, mas os dois desenvolveram capacidades telepáticas.
Anos mais tarde, com a menina desenvolvendo seus poderes herdados dos pais, entra em cena um departamento governamental maléfico, conhecido como A Loja (The Shop), que mata Vicky e sequestra Charlie, desejando estudar suas habilidades para transformar em uma arma de guerra.
Martin Sheen é o responsável pelo departamento, enquanto George C. Scott interpreta John Rainbird, que se faz passar por alguém inocente para ganhar a confiança da menina.
Esse é outro filme que nem sempre foi muito bem recebido pela crítica e não chegou a ser um sucesso de bilheteria, mas é bem interessante, com bons efeitos e excelentes interpretações. E com trilha sonora do grupo alemão Tangerine Dream. No Brasil, lançado em DVD (Flashstar).
Em 2002 foi produzida uma minissérie para a TV, Vingança em Chamas (Firestarter: Rekindled), dirigida por Robert Iscove, como uma sequência aos eventos da história original, e não tão boa quanto o filme. Uma refilmagem, igualmente bem inferior, foi produzida em 2022, Chamas da Vingança (Firestarter), dirigida por Keith Thomas.
Direção de Tom Schiller.
Direção de Terry Gilliam.
Direção de Alan Rudolph.
PRÍNCIPE DAS SOMBRAS (Prince of Darkness, 1987)
A equipe reunida diante do cilindro (Alive Films/ Larry Franco Productions/ Haunted Machine Productions).
Direção de John Carpenter.
Peter Nicholls disse que frequentemente um filme aparentemente de ficção científica se revela como terror e que, no caso do filme de Carpenter, é um filme aparentemente de terror que se revela como sendo ficção científica. Ele está certo, mas também se deve considerar que, frequentemente, os dois gêneros estão intimamente relacionados; Alien, o Oitavo Passageiro, por exemplo, costuma constar de listagens de filmes dos dois gêneros.
De qualquer forma, Nicholls disse que esse é o pior filme de Carpenter. Para mim, é um dos melhores, senão o melhor, e chegou a ganhar o Grande Prêmio da Crítica no Festival do Filme Fantástico de Avoriaz. O roteiro é do próprio Carpenter, que assinou como Martin Quatermass, uma homenagem ao escritor inglês Nigel Kneale, criador da série de TV e cinema com o personagem Bernard Quatermass.
A história é centrada na intervenção das chamadas forças divinas e diabólicas no planeta. Donald Pleasance é um padre católico que, por acaso, descobre a existência de uma seita secreta dentro da Igreja Católica, conhecida como a Irmandade do Sono. Ela mantém, no porão de uma igreja decadente de Los Angeles, um cilindro que contém o ser chamado “o príncipe das sombras”, uma entidade alienígena mantida prisioneira por sete milhões de anos, e que está iniciando seus movimentos para sair ao mundo e resgatar seu pai do antiuniverso onde tem sido mantido prisioneiro por milhões de anos. Assim, o príncipe é o próprio anticristo, vindo de um antiuniverso.
Segundo um livro encontrado na mesma igreja e traduzido, Cristo era um enviado, filho de um extraterrestre, com a notícia de que os terrestres deveriam manter o cilindro bem guardado. O padre chama um grupo de cientistas e um famoso físico para estudarem o objeto. Os números encontrados no livro de dois mil anos de idade formam equações diferenciais que tentam explicar o que se passa no universo e no antiuniverso. Os cientistas, enquanto dormem, recebem estranhas mensagens visuais do futuro, de 1999, ano em que, segundo profecias, o Mal se mostraria ao mundo para uma batalha final com as forças opostas, e tudo indica que isso deverá ocorrer.
As ideias se aproximam de algumas elaboradas pelo escritor Philip K. Dick em livros como Valis e A Invasão Divina, levadas à tela como jamais foram antes.
No Brasil, lançado em VHS e DVD (LK-Tel/ Universal/ 1Films Entretenimento).
RENASCIDO DAS TREVAS (The Resurrected, 1991)
Chris Sarandon (Scotti Brothers Pictures/ Borde-Raich/ Eurobrothers Productions).
Direção de Dan O'Bannon.
Produção canadense baseado no livro O Caso de Charles Dexter Ward, de H.P. Lovecraft, e também conhecida pelo título O Filho das Trevas. Esse é um daqueles exemplos típicos em que muitas pessoas berram que o filme “não é FC”, enquanto outros berram de volta, “É, sim”. Mas é claro que pode ser fc e terror ao mesmo tempo, ainda que seja a fc um tanto estranha de Lovecraft.
A história está incluída na série conhecida como Os Mitos de Cthulhu, com ligações mais do que evidentes com seres de outros planetas e universos, ainda que sejam forças demoníacas que surgem em nosso mundo por meios considerados não científicos. Essa é uma das melhores, senão a melhor versão de histórias de Lovecraft para o cinema, ainda que a história em si não esteja entre suas melhores criações. John Terry é o investigador particular contratado para descobrir o que é que Charles Ward (Chris Sarandon) está fazendo em seu laboratório, que o levou a mudar tão radicalmente de atitude com relação à esposa.
Com a narração entremeada por flash-backs, ele vai descobrindo que Ward pesquisava antigas fórmulas para ressuscitar os mortos. As experiências criaram monstros disformes, com partes humanas e imenso apetite para o sangue fresco e carne humana. O passeio dos heróis pelas catacumbas da casa de Ward é aterrorizante, com cenários excelentes. Um bom filme.
Direção de Victor Salva.
Direção de Jon Turteltaub.
CUBO (Cube, 1997)
Maurice Dean Wint (Cube Libre/ Odeon Films/ Ontario Film Development Corporation).
Direção de Vincenzo Natali.
Produção canadense do diretor Natali, que chegou a ser recebido como o novo Cronenberg com esse filme de pequeno orçamento, cerca de 350 mil dólares, quase todo rodado em um único cenário.
Um grupo de pessoas acorda dentro de algo que eles não sabem o que é, uma estrutura em forma de cubo, com portas para outros cubos, cada um deles contendo seis portas que levam a outros cubos. Nenhuma das pessoas se lembra como foi parar ali, mas sabem que podem morrer em algumas armadilhas que os cubos contêm. Não se sabe quem construiu o gigantesco aparelho ou qual seu objetivo, apenas que ele está ali, quase como uma máquina independente, nascida da vontade dos homens, mas sem qualquer função prática.
De certa forma, o filme pode ser encarado como uma imagem simbólica da sociedade ou de uma possível sociedade futura, em que as coisas são construídas sem qualquer objetivo. Não chega a Cronenberg, mas é muito interessante, e claustrofóbico.
Mathew Downward, um dos editores da Encyclopedia of Science Fiction, estabeleceu uma relação entre a história do filme e a do conto A Biblioteca de Babel, de Jorge Luis Borges (no Brasil, publicado no livro Ficções), com os 26 aposentos do cubo lembrando as salas hexagonais da história de Borges, na qual livros combinam 25 caracteres básicos em todas as variações possíveis, um tema sugerido pela primeira vez pelo cientista e escritor de fc alemão Kurd Lasswitz (1848-1910). “Aqui”, diz Downward, “os números são a linguagem da natureza: as regras do Cubo apenas parecem arbitrárias e sem sentido. O inimigo real é a falta de perspectiva dos prisioneiros”.
Downward também estabeleceu uma relação com a peça de Luigi Pirandello (1867-1936), Seis Personagens à Procura de Autor (1921), que examina preocupações autorais por meio do absurdo. “Cubo usa uma configuração semelhante para ilustrar a disparidade entre a narrativa humana e a verdade matemática”.
Posteriormente, surgiram sequências inferiores. Cubo 2: Hipercubo (Cube 2: Hypercube, 2002), dirigido por Andrzej Sekula; Cubo Zero (Cube Zero, 2004), dirigido por Ernie Barbarash; Cubo: A Caixa do Medo (Cube, 2021), uma refilmagem japonesa do original, com direção de Yasuhiko Shimizu.
PI (PI, 1998)
Sean Gullette (Harvest Filmworks/ Truth and Soul Pictures/ Plantain Films/ Protozoa Pictures).
Direção de Darren Aronofsky.
O filme recebeu o prêmio de Melhor Diretor no Sundance Film Festival, dedicado a produções independentes. É recheado de informações e citações matemáticas e referentes à Cabala, Corão, e ao jogo chinês Go. É o primeiro longa-metragem de Aronofsky, produzido com pouco mais de 100 mil dólares, e um sucesso de crítica e bilheteria.
Sean Gullette é Maximilian Cohen, um gênio da matemática que construiu um supercomputador em sua casa. Por meio dele pode obter algo que pode ser entendido como a chave para a compreensão de toda a existência. Ele passa a ser seduzido por empresas poderosas de Wall Street e também por seitas hasídicas cabalistas, que tentam encontrar mistérios matemáticos perdidos há muito tempo na Torá.
Para complicar a situação, Max tem um problema crônico desde criança, sofrendo com dores de cabeça insuportáveis que lhe causam alucinações. E mais, os dois grupos interessados em seu trabalho não são o que se pode chamar de bem intencionados. Um filme muito bom, bem diferente do que se costuma ver no gênero e, certamente, um dos que se encontram no limite da fc.
No Brasil, lançado em DVD (Europa Filmes).
Direção de Peter Weir.
Direção de Richard Schenkman.
Direção de Robert Schwentke.