Já falei sobre Simon Stålenhag aqui anteriormente ao comentar a sensacional série Contos do Loop, baseada em uma de suas obras. Em Estado Elétrico – lançado no Brasil em maio de 2022, em edição luxuosa – ele volta a apresentar uma visão aterradora e sombria de uma sociedade completamente entregue à tecnologia, no que ela traz de pior.
A história situa-se em 1997, em um mundo alternativo em que as coisas definitivamente fugiram ao controle. A narração é de uma jovem que se dirige à costa oeste dos EUA em companhia de um pequeno robô. O texto fala não apenas de sua jornada por uma terra assolada por uma tecnologia invasiva terrível, mas também de trechos da vida difícil da jovem órfã e do mundo em que ela vive.
O objetivo da viagem só é revelado ao final, mas até lá, com a ajuda das ilustrações impressionantes de Stålenhag, entramos em contato com o mundo invadido pelas carcaças de máquinas gigantescas, naves de uma guerra jamais explicada e que, agora, jazem em terrenos ou no mar, destruídas e muitas vezes esvaziadas de seus conteúdos. E outras, ainda operantes, e que têm ligação com os estranhos aparelhos que as pessoas utilizam em suas cabeças, conectadas a um mundo virtual viciante ao extremo, de prazeres apenas imaginados e dos quais elas não conseguem abrir mão. Muitas morrem ainda com os aparelhos em suas cabeças, os corpos sem vida, mas de alguma forma com suas bocas ainda se movendo, como se partes delas ainda existissem em algum lugar, controladas pelas máquinas.
Intercalada com a narrativa da jovem, trechos de uma narrativa de alguém que esteve envolvido na guerra e que fala das coisas terríveis que viu, da tentativa das máquinas de tomar o poder e criar seu próprio ser, seu próprio filho. E, pela aparência das pessoas conectadas ao mundo virtual, vagando pelo mundo sem qualquer outro objetivo que não o prazer que lhes é fornecido, tudo indica que as máquinas controlam tudo, ou irão controlar em breve.
A sensação é de que não há escapatória, de que o mundo está definitivamente condenado, e que os seres humanos foram responsáveis por sua própria destruição.
E, em meio a tudo isso, resiste o objetivo final da narradora, alheia aos absurdos que a cercam e movida unicamente por um amor incondicional.
Sua narrativa termina tão abruptamente como começou e a parte final de sua jornada é contada com as imagens do autor. Para onde ela e a humanidade vão após isso, parece não ter qualquer importância, e o que permanece é o sentido maior e mais profundo de sua missão obstinada.
Um livro impressionante e maravilhoso de Stålenhag.
ESTADO ELÉTRICO (Passagen, 2017)
Simon Stålenhag.
Quadrinhos na Cia.
144 páginas.