Assisti a Coherence sem saber muito bem o que esperar. Não tinha lido nada a respeito – por puro desleixo, devo dizer – e só tinha as informações vagas de sinopses meio vagabundas da internet.
Melhor, porque assim a surpresa ficou ainda mais agradável. Acho que se junta a O Predestinado como uma das melhores produções recentes de ficção científica. E também lidando com a questão do tempo, ainda que com valores de produção bem inferiores.

Assustados, os personagens começam a elaborar teorias, em Coherence (Bellanova Films).

É o filme de estreia do diretor James Ward Byrkit e foi rodado em sua própria casa, com ênfase na interpretação dos atores e num enredo muito bem desenvolvido. Em entrevista para Scott Tobias, do site The Dissolve, o diretor disse que a ideia para o filme surgiu da realidade de não ter quaisquer recursos. Ele tinha uma câmera, um grupo de atores muito bons e a sala de sua casa. Assim, por um ano eles elaboraram o roteiro, com um enredo inspirado pelo tipo de histórias apresentadas no seriado Além da Imaginação, ainda que os diálogos tenham sido pensados para se aproximar da forma pela qual as pessoas realmente conversam, às vezes com as falas se atropelando.
O resultado é excelente.

Um jantar tranquilo, até a energia acabar.

O ponto de partida é um jantar de quatro casais na casa de um deles. O pano de fundo é um cometa que está passando pelas proximidades da Terra e, logo se percebe, começa a provocar algumas alterações nas comunicações. O que realmente acontece a seguir jamais é completamente explicado, mesmo porque não parecem existir explicações. Os personagens levantam suposições, algumas delas aparentemente baseadas em teorias científicas, mas os eventos vão muito além disso.
Durante o jantar – que, apesar do clima de camaradagem e amizade de longa data, já é um tanto tenso devido a certos problemas em relacionamentos do passado – a energia acaba. Todo o bairro fica às escuras, com exceção de uma casa a duas quadras de distância, que parece ter um gerador. Sem saber o que está acontecendo e percebendo que telefones e internet não funcionam, dois deles resolvem ir até a casa com energia para tentar telefonar. Um dos personagens cita seu irmão, um cientista, que lhe disse que se algo de “estranho” acontecesse quando o cometa passasse, que ligasse para ele, o que deixa todos mais preocupados, imaginando que algum problema realmente grande pode ser causado pelo cometa.
Depois que os dois saem da casa, os demais continuam conversando sobre o cometa e seus possíveis efeitos na Terra, e se assustam quando ouvem batidas na porta, mas não encontram ninguém do lado de fora. Quando os dois retornam, estão assustados e trazem uma caixa da outra casa. E mais: dizem que eles mesmos estão na casa.
E suas vidas jamais serão as mesmas novamente.

Um encontro com eles mesmos, habitantes de outra casa.

Um dos pontos interessantes da história é que os personagens sabem tanto quanto nós sobre o que está acontecendo, de modo que suas sugestões de explicações para a situação compõem o clima de estranheza e paranoia e levam o espectador na mesma direção. Em determinado momento, chegamos a duvidar do que está acontecendo, porque uma das mulheres tinha levado para o jantar um preparado que continha quetamina; e, pelas conversas entre eles, sabemos que em outra ocasião eles já experimentaram cogumelos. Eles próprios começam a pensar se não estão imaginando o estranho mundo em que penetraram.
Para não falar muito sobre o desenvolvimento da história, basta dizer que a casa deles é uma de muitas na mesma situação. E em todas elas estão as mesmas pessoas, porém em universos paralelos. Suas histórias são semelhantes, mas não completamente iguais. E o final é intrigante, sugerindo diferentes possibilidades.
Ao longo de meus x anos de vida já vi muitos filmes de ficção científica. Muitos mesmo. Poucos lidaram com o tema dos universos paralelos. Um dos melhores foi, na verdade, um episódio de Além da Imaginação, ainda que sem relação com o filme de Byrkit. De qualquer forma, acredito que nenhum tratou o tema com tanta competência quanto Coherence. O filme é intrigante do começo ao fim; os eventos misteriosos estão espalhados ao longo do filme, desde sua apresentação até a última cena.
Uma beleza de filme que vale a pena procurar.

Outros filmes que tratam de universos paralelos