AELITA – A RAINHA DE MARTE (Aelita, 1924)
Direção de Yakov Protazanov.
(Mezhrabpom-Rus).
O filme foi baseado no livro Aelita, de Alexei Tolstoi, mas com a história modificada. Um engenheiro terrestre (Nikolai Tsereteli) viaja a Marte após uma mensagem enigmática ter chegado à Terra vinda do planeta próximo. Lá, ele encontra um governo totalitário e a jovem Aelita do título (Yuliya Solntseva). O jovem soldado que viajou com ele (Nikolay Batalov) tenta fomentar uma revolução popular, mas não consegue. Ao final, ficamos sabendo que tudo não passou de um sonho, uma explicação que, segundo Peter Nicholls, mesmo na época já era um clichê bastante utilizado.
Ainda assim, o filme teve destaque devido aos cenários futuristas de Marte, com design de Isaak Rabinovitch, pinturas de Viktor Simonov e figurinos de Aleksandra Ekster, todos figuras de destaque no cenário artístico mundial. Segundo se diz, esse trabalho visual antecipou e inspirou Flash Gordon, que surgiria no cinema em 1936.
O MÁGICO DE OZ (The Wizard of Oz, 1939)
Direção de Victor Fleming.
Dorothy (Judy Garland), acordando, e de volta ao Kansas (Metro-Goldwyn-Mayer).
Um dos maiores clássicos do cinema (e da literatura infanto-juvenil), o filme traz insinuações de que Dorothy pode ter sonhado com sua aventura, o que não é apresentado no livro. Muitos críticos entendem que o filme deu muito mais fôlego às histórias de Frank L. Baum no mundo de Oz (Ver também na matéria Cidades Fora do Tempo). Em The Ultimate Encyclopedia of Fantasy, editada por David Pringle, o texto sobre o filme diz: “Baum não teria aprovado a forma pela qual o filme transformou sua gentil fantasia consolatória em um melodrama apavorante, cujo significado implícito é que a imaginação é uma coisa terrivelmente perigosa à qual devemos resistir e não nos submeter”. Em outra parte do texto sobre o livro e a diferença com o filme, o texto diz: “Tendo sido transportada para Oz por um estranho redemoinho de vento, eventualmente Dorothy leva sua família para viver lá permanentemente (categoricamente contradizendo a austera mensagem do filme de que ‘Não há lugar como nossa casa’)”.
NA SOLIDÃO DA NOITE (Dead of Night, 1945)
Direção de Alberto Cavalcanti, Charles Crichton, Basil Dearden e Robert Hamer.
O ROBÔ ALIENÍGENA (Robot Monster, 1953)
Direção de Phil Tucker.
DEMÊNCIA (Dementia, (1953)
Direção de John Parker.
OS INVASORES DE MARTE (Invaders From Mars, 1953)
Direção de William Cameron Menzies.
TRÊS CASOS DE ASSASSINATO (Three Cases of Murder, 1955)
Direção de David Eady, Wendy Toye, George More O’Ferrall e Orson Welles (não creditado).
Orson Welles, em Três Casos de Assassinato (London Films/ Wessex Film Productions/ British Lion Film Corporation).
Produção britânica reunindo três histórias, uma das quais, Lord Mountdrago, lida com sonhos, baseada em conto com o mesmo título de William Somerset Maugham, publicado na coletânea The Mixture as Before (1940). O episódio foi dirigido por George More O’Ferrall, mas diz-se que Orson Welles teve sua participação. E é Welles quem interpreta o Lorde Mountdrago do título, político britânico que tem um inimigo político ferrenho (Alan Badel). E eles descobrem que seus sonhos podem afetar um ao outro, inclusive podendo causar a morte.
SONHOS DO DESTINO (The Night My Number Came Up, 1955)
Direção de Leslie Norman.
(Ealing Studios/ Michael Balcon Productions).
Produção britânica geralmente muito bem recebida pela crítica, misturando suspense e fantasia, com história sobre militar da aeronáutica que tem sonhos onde, supostamente, vê o futuro. Em um dos sonhos, vê um acidente envolvendo um avião e alguns amigos. Ele acaba contando o sonho aos conhecidos, incluindo vários detalhes. Eventualmente, eles estão em uma viagem de avião na qual os detalhes do sonho vão ocorrendo, com vários incidentes conspirando para que todos os detalhes citados no sonho tornem-se reais, o que apavora os viajantes, uma vez que o sonho terminava com a queda do avião. O acidente de fato acontece, mas todos são salvos graças às “informações” fornecidas pelo sonhador, que também vira o local onde o avião caíra (ou cairia).
ESCAPEMENT (1958)
Direção de Montgomery Tully.
(Anglo-Guild Productions).
Também com os títulos The Electronic Monster e The Dream Machine. Produção britânica baseada no livro Escapement (1956), de Charles Eric Maine. Segundo Phil Hardy (em The Encyclopedia of Science Fiction Movies), “Escapement foi um dos primeiros filmes de ficção científica a examinar a possibilidade de que uma máquina construída pelo homem se tornasse um monstro, e precursor de filmes mais sofisticados como Projeto Brainstorm (1983) e Videodrome (1982)”.
Rod Cameron interpreta um investigador de uma companhia de seguros que investiga a morte de um homem e, assim, chega a uma clínica dirigida por um médico bem doido (Peter Illing), que possui uma máquina especialmente construída para induzir sonhos em seus pacientes, transformando-os em pesadelos sexuais e fantasias homicidas.
No entanto, Hardy também diz que, apesar do tema interessante, o roteiro, a cargo do próprio Charles Eric Maine e de J. MacLaren Ross, é pesado e falha ao tentar desenvolver a premissa central.
QUEM QUER MATAR JESSIE? (Kdo Chce Zabit Jessii?, 1966)
Direção de Vaclav Vorlicke.
Olga Shoberová, como Jessie, a personagem tornada real (Ceskoslovenský Státní Film/ Filmové studio Barrandov).
A máquina para observar os sonhos.
Produção da antiga Tchecoeslováquia. O filme estava sendo produzido para o público infantil quando, segundo Peter Nicholls e John Brosnan, os realizadores perceberam que ele tinha grande potencial para uma sátira. Assim, realizaram uma obra em ritmo de comédia e loucura. Uma cientista inventa uma máquina capaz de materializar os sonhos das pessoas em uma tela; assim, ela pode alterar os pesadelos e transformá-los em sonhos suaves. Quando experimenta com seu marido, ela percebe que ele tem um sonho recorrente com uma heroína sensual de histórias em quadrinhos e, é claro, a esposa tenta acabar com isso. Só que a máquina funciona mal e, ao contrário do que se esperava, faz com que a heroína apareça em carne e osso na vida real.
Phil Hardy diz que o filme é repleto de piadas e efeitos inventivos, mas poderia ter sido ainda melhor se fosse em cores. Muitos dos esfeitos ficaram a cargo do ilustrador de histórias em quadrinhos Kája Saudek, um dos principais da área em seu país. E o filme utiliza os balões dos quadrinhos em alguns momentos, estabelecendo um contraste com o mundo real.
A FACE DA CORRUPÇÃO (Corruption, 1967)
Direção de Robert Hartford-Davis.
Peter Cushing e Sue Lloyd, em A Face da Corrupção (Oakshire Productions/ Titan International Productions).
Produção inglesa com Peter Cushing – um dos nomes mais constantes dos filmes de terror britânicos – como um cirurgião plástico. O filme segue a linha já manjada do sonho que pode ou não transformar-se em realidade. A noiva do cirurgião teve sua face arruinada em um acidente em uma festa, e o médico descobre que, para restaurar seu rosto, precisa utilizar métodos nada convencionais, mas ainda assim bastante manjados nos filmes do gênero, ou seja, matando mulheres para, de alguma forma, utilizar seus corpos para a restauração necessária. Ao final, ele acorda, percebendo que tudo foi um sonho. Só que ele vai à festa onde seu sonho começou, revivendo os momentos iniciais do pesadelo.
UMA SOMBRA PASSOU POR AQUI (The Illustrated Man, 1968)
Direção de Jack Smight.
Rod Steiger, Christine Matchett e Tim Weldon (SKM/ Warner Bros.).
Baseado no livro com o mesmo nome de Ray Bradbury, um dos seus melhores trabalhos, do qual aproveita três contos, mais o prólogo e epílogo. O conto A Última Noite (The Last Night of the World) foi adaptado para a terceira história do filme, com Rod Steiger e Claire Bloom interpretando os pais de duas crianças em um futuro indeterminado. Um dia, todos os adultos do planeta acordam e sabem que tiveram o mesmo sonho, mostrando que o mundo irá acabar naquele dia. Eles resolvem dar comprimidos às crianças, para que elas morram tranquilamente, sem sofrer, mas no dia seguinte ficam sabendo que houve um erro nas “projeções” das pessoas, e o mundo não acabou e todas as crianças foram mortas.
DE SADE 70 (1970)
Direção de Jesús Franco.
Christopher Lee, em De Sade 70 (Hape-Film Company/ Producciones Cinematográficas Balcazar/ Video-Tel International Productions).
Também com os títulos: Eugenie – The Story of Her Journey Into Perversion; Philosophy in the Boudoir; Die Jungfrau und die Peitsche.
Produção conjunta da Espanha e da Alemanha Ocidental, o filme apresenta uma narrativa circular, contando a história de Eugenie (Marie Liljedahl), que passa um fim de semana num retiro numa ilha de Madame St Ange (Maria Rohm) e seu irmão Mirvel (Jack Taylor), onde ela toma parte nas práticas de rituais sádicos presididos por Dolmance (Christopher Lee). Eugenie é drogada e sujeitada a tortura sexual e humilhações. Mais tarde dizem a ela que suas experiências foram apenas um sonho, mas ela não acredita e mata seus atormentadores. Quando parece que ela acordou de seu pesadelo, ela recebe um convite para passar um fim de semana na ilha de St Ange, em um tipo de narrativa já muito utilizada desde Na Solidão da Noite (1945).
O HOMEM QUE SONHAVA COM A REALIDADE (The Deadly Dream, 1971)
Direção de Alf Kjellin.
Lloyd Bridges em O Homem Que Sonhava Com a Realidade (Universal Television).
Produção para a televisão, com excelente elenco liderado por Lloyd Bridges e Janet Leigh. O filme aborda os universos paralelos, mais especificamente, um mundo de sonhos visto como um universo paralelo. Lloyd Bridges interpreta um cientista que realizou uma importante descoberta e começa a ter pesadelos muito reais, nos quais é perseguido por pessoas que não desejam que sua descoberta seja revelada à humanidade. Os pesadelos vão se tornando cada vez mais reais, a ponto do cientista não conseguir mais distinguir o que é sonho e o que é realidade. Ele existe nos dois universos, muito parecidos um com o outro, apenas com pequenas alterações.
O filme não chegou a ter boa recepção por parte da crítica, mas tem um excelente clima de suspense e um final muito bem elaborado, com os acontecimentos chegando a um termo nos dois universos. Está entre os melhores, ainda que menos comentados, filmes sobre o tema de sua época, e infelizmente muito pouco reprisado na televisão.
UMA LAGARTIXA NUM CORPO DE MULHER (Uma Lucertola com la Pelle di Donna, 1971)
Direção de Lucio Fulci.
Também com os títulos: Una Lugartija com Piel de Mujer; La Vénin de la Peur; A Lizard in a Woman’s Skin. Lucio Fulci foi um dos principais diretores do cinema de terror italiano, e esse é um de filmes bem considerados pela crítica, com produção conjunta da Itália, Espanha e França. A atriz principal é a brasileira Florinda Bolkan, que teve longa carreira na Europa. Ela interpreta uma mulher assolada por fantasias e pesadelos que começam a tornar-se reais.
Phil Hardy disse que “Seguindo o exemplo de Dario Argento, que introduziu elementos de sexo e horror em seus thrillers de crime”, o filme de Fulci recorre a imagens sangrentas e góticas. Segundo Hardy, a obra traz um tema claustrofóbico típico dos filmes do diretor, com as imagens mais memoráveis sendo as sequências de sonhos, desenhadas pelo especialista Carlo Rambaldi, figura importante em filmes como Alien, O Oitavo Passageiro (1979) e E.T.: O Extraterrestre (1982), para citar apenas dois de uma lista imensa de trabalhos fundamentais (No Brasil em DVD Versátil).
Abaixo: Florinda Bolkan, em Uma Lagartixa Num Corpo de Mulher (International Apollo Films/ Les Films Corona/ Atlántida Films), e Florinda Bolkan e Anita Strindberg.
BABA YAGA (1973)
Direção de Corrado Farina.
Isabelle De Funès, em Baba Yaga (14 Luglio Cinematografica/ Productions Simone Allouche/ Rewind Film).
Produção conjunta da Itália e França, com adaptação livre da personagem famosa dos quadrinhos de Guido Crepax, a heroína Valentina, interpretada por Isabelle De Funès. Aqui, ela é uma fotógrafa que tem um estranho encontro com uma mulher mais velha que se apresenta como sendo Baba Yaga (Carroll Baker). E esse é o início de uma série de acontecimentos estranhos vividos por Valentina, como sonhos ou pesadelos, e descobre que Baba Yaga é uma feiticeira que a prende em seu castelo, onde é submetida a abusos sexuais.
O diretor Farina disse que os produtores editaram seu filme, cortando uma fatia considerável, incluindo alguns diálogos politicamente relevantes.
SEIZURE (Seizure, 1974)
Direção de Oliver Stone.
Martine Beswick e Mary Woronov, em Seizure (Astral Bellevue Pathé/ Cine Films Inc./ Cinerama Productions Corp./ Euro-American Pictures/ Intercontinental Leisure Industries Ltd./ Queen of Evil Ltd.).
Esse é o primeiro filme de Oliver Stone, e muito mal visto pela crítica. Jonathan Frid interpreta um escritor especializado em temas sobrenaturais que convida seis pessoas para um fim de semana, dizendo que sonhou que eles deverão ser visitados por três invenções de sua mente, na verdade materializações do romance que está escrevendo. As materializações são a Rainha da Maldade (Martine Beswick), um carrasco gigantesco (Henry Judd Baker) e um anão malévolo (Hervé Villechaize), e iniciam uma série de jogos perigosos nos quais os convidados encontram destinos terríveis e o próprio escritor é ameaçado por seus familiares.
Henry Judd Baker, Roger De Koven e Hervé Villechaize, em Seizure.
Mas o escritor acorda e percebe que tudo era um pesadelo, só que o pesadelo tem sequência após acordar, e ele morre de um ataque do coração.
Phil Hardy disse que o roteiro, também escrito por Oliver com Edward Mann, parece esforçar-se para dizer alguma coisa a respeito da imaginação criativa, mas não sabemos exatamente o que ele pretendia.
Ainda que às vezes confuso e, certamente, estranho, o filme ainda tem momentos bem interessantes, apesar do truque já bem antigo do sonho que se torna realidade.
THE LATHE OF HEAVEN (1980)
Direção de David R. Loxton e Fred Barzyk.
(Public Broadcasting Service/ Taurus Film/ WNET Channel 13 New York).
Primeira adaptação para a TV da ótima história de Ursula K. Le Guin (A Curva do Sonho), sobre o homem que tem a capacidade de alterar a realidade a partir de seus sonhos, capacidade descoberta por um psiquiatra que tenta se utilizar do homem para alterar a realidade de acordo com seus desejos.
Uma das atrações é a presença do artista Ed Emshwiller na equipe de efeitos especiais, ele que foi um dos principais ilustradores de revistas e livros de ficção científica a partir dos anos 1950.
A segunda versão da história, O Flagelo dos Céus (Lathe of Heaven, 2002) também foi produzida para a televisão, e considerada inferior, com direção de Philip Haas.
A MORTE NOS SONHOS (Dreamscape, 1982)
Direção de Joseph Ruben.
THE SLAYER – O ASSASSINO (The Slayer, 1982).
Direção de J.S. Cardone.
Sarah Kendall, acordando de mais um pesadelo, em The Slayer - O Assassino (The International Picture Show Company).
Pequena produção apresentando uma mulher que, desde pequena, tem sonhos, às vezes assustadores, outras vezes nem tanto. Já adulta, seus sonhos se intensificam e ela vai com o marido, o irmão e a esposa dele para descansar em uma ilha. Porém, chegando ao local, percebem que as construções locais estão abandonadas há muito, e que aquele é o local com o qual ele sonha desde criança, e coisas terríveis devem ocorrer. Ao final, não se sabe muito bem se tudo foi um pesadelo da criança.
A COMPANHIA DOS LOBOS (The Company of Wolves, 1984)
Direção de Neil Jordan.
(Incorporated Television Company/ Palace Pictures).
O filme é baseado no conto A Companhia dos Lobos, escrito por Angela Carter em 1979, publicado na coletânea O Quarto do Barba-Azul.
A história de chapeuzinho vermelho é desenvolvida de forma estupenda nesse estranho filme inglês, com filmagens magníficas e um clima de fantasia poucas vezes visto nas telas. A explicação para a existência de um lobo que devora as pessoas na floresta perigosa é que se trata de um lobisomem, que encanta as mulheres com sua forma masculina. A maneira como se chega até a história da chapeuzinho propriamente dita é fantástica, uma vez que se trata de um sonho de uma garota em seu quarto, local onde surgem vários lobos andando em alcateia, perseguindo-a, no mesmo momento em que o seu cachorro sobe as escadas de casa, procurando-a.
Sarah Patterson e Angela Lansbury, netinha e vovó, enquanto seu Lobo não vem.
No sonho, misturam-se cenas inexistentes, no caso os lobos, com cenas existentes no quarto em que ela dorme. Ela se desloca cada vez mais para dentro do mundo dos sonhos, e o exterior deixa de ter importância. No próprio sonho são contadas histórias, e a personagem infantil imagina e sonha novamente, quebrando o ritmo de narração em diversas partes, como é próprio dos sonhos.
A menina começa sonhando que sua irmã mais velha está morta, atacada pelos lobos da floresta, e isso ocorre enquanto a irmã bate na porta do quarto onde ela dorme, querendo que ela se levante. Ela faz todo o percurso dentro do sonho, até chegar ao ponto de ir visitar sua avó, levando-lhe doces. Encontra-se com um estranho, que é o lobo ou lobisomem, com o qual tem um contato bastante sensual. Ele tenta conquistá-la e aposta que chegará antes na casa da avó. De fato o faz, e liquida a velhinha. Quando a menina chega, tem um longo diálogo com o lobisomem, que se transforma de homem em lobo à sua frente. Os pais da menina, já preocupados, vão procurá-la na floresta com a vila inteira, encontrando os dois transformados em lobos na casa da avó. Ela foge com ele, correm pelas florestas, juntam-se à alcateia e fazem todo o caminho contrário que ela fez para penetrar no sonho, passando pelos objetos familiares do quarto onde ela dorme, entrando na casa onde ela está, subindo as escadas como o seu cachorro havia feito e, finalmente, penetrando no quarto. A última cena é de um lobo entrando pelo vidro que se quebra, a cena congelando e um objeto dela caindo ao chão, dando a impressão de que ela acordou de repente do sonho, ou de que o sonho penetrou de vez em sua vida.
Tudo isso ocorre em meio a uma série de imagens fantásticas, como o banquete dos ricos que se transformam em lobisomens, devido a uma maldição levantada por uma mulher que faz parte de uma história que a menina do sonho imagina quando sua avó lhe conta uma lenda. São histórias dentro de histórias dentro de histórias. Um filme de fantasia e horror quase perfeito.
Em The Encyclopedia of Fantasy, John Grant disse que a estrutura da história é uma versão distorcida do conto da Chapeuzinho Vermelho, “(...) na qual os lobos tornam-se o símbolo da sexualidade adulta despertando na garota-criança Rosaleen. O caçador também é o lobo e, como tal, também é o cavaleiro sedutor que finalmente atrai Rosaleen do mundo dos humanos para o mundo dos lobos. (...) Esse filme está no centro da fantasia e vibra de acordo com sua pulsação: ele é tanto fantasia quanto sobre fantasia”.
Em The Ultimate Encyclopedia of Fantasy, editado por David Pringle, o texto sobre o filme segue uma visão semelhante. “Uma maravilhosamente atmosférica visualização da peça radiofônica de Angela Carter (baseada em duas histórias de The Blood Chamber [O Quarto do Barba-Azul]) explorando o simbolismo sexual entranhado em contos tradicionais como Chapeuzinho Vermelho, e transformando seus elementos admonitórios em uma celebração da sexualidade feminina. (...) Carter foi uma das mais significantes fantasistas do século 20, e esse filme conserva tanto de sua graça e complexidade literária quanto é cinematograficamente possível”.
A produção também é apresentada como um filme de terror e, em The Aurum Film Encyclopedia: Horror, Phil Hardy que esse é o mais inteligente e visualmente impressionante filme britânico de fantasia desde o auge da Hammer nos anos 1960 e, talvez ironicamente, foi dirigido por um escritor irlandês. “A trama foi construída na moda de uma ‘caixa chinesa’, com uma narrativa gerando outra, cada uma aprimorando ou modificando os elementos que vieram antes. Os principais personagens são a contadora de histórias Granny (a avó, Angela Lansbury) e Rosaleen (Sarah Patterson), que está em crescimento e cuja jornada em direção à maturidade sexual fornece o fio que mantém a narrativa fragmentada coesa. De forma refrescante, o filme rechaça qualquer equiparação simples entre lobos e sexualidade masculina, preferindo dramatizar as ambiguidades inerentes à própria fantasia: o medo de Patterson com relação aos lobos iguala-se à sua fascinação erótica por eles, tornando ‘as bestas’ uma metáfora para o despertar sexual tanto em garotos quanto em garotas”.
Hardy ainda disse que a intensidade visual do filme raramente foi vista em produções britânicas, com “(...) a adorável, ameaçadoramente estranha e maravilhosa floresta, e a delirantemente gótica praça da vila são reminiscentes do melhor do Expressionismo alemão”. Para Hardy, A Companhia dos Lobos tem como sua maior realização a apresentação bem sucedida da própria estrutura da fantasia. “(...) Enquanto Maria Bava e outros tiveram sucesso nisso ao desprezar os aspectos literários de seus roteiros frequentemente bobos, o audacioso filme de Jordan parte desde o início para estruturas de fantasia e lógica de sonho, fazendo com que o filme seja impossível de ser contido dentro de qualquer gênero existente. Ele não muda de direção de um conto de fadas para o terror e o humor negro, mas consegue ser tudo ao mesmo tempo, o tempo todo. O resultado é um filme incomum, lindo e inteligente, uma combinação rara nos melhores momentos, mas especialmente no cinema britânico”.
Abaixo, imagens de A Companhia dos Lobos: Micha Bergese; Micha Bergese e Sarah Patterson; o lobo dentro do humano.
A HORA DO PESADELO (A Nightmare on Elm Street, 1984)
Direção de Wes Craven.
(New Line Cinema/ Media Home Entertainment/ Smart Egg Pictures/ The Elm Street Venture).
O filme de Wes Craven deu origem a um grande número de fãs e inaugurou a franquia que teria mais oito filmes, além de um seriado de TV, livros, quadrinhos, games e muito mais. E, por mais que a franquia tenha sido bem sucedida no que diz respeito ao faturamento, o filme original de Wes Craven é o único que merece maior atenção. Os demais apenas seguem o conceito dos produtores de Hollywood de espremer uma boa ideia (e, às vezes, nem tão boa assim) até não sobrar nada, até a exaustão, repetindo fórmulas e desgastando o conceito inicial.
O personagem central, o vilão do mundo dos pesadelos, Freddy Krueger, tornou-se um ícone da cultura popular imediatamente reconhecível em todo o mundo. Em alguma de suas entrevistas, Craven chegou a dizer que sua ideia era realizar um filme que evitasse o excesso de sangue que fora apresentado em suas produções anteriores, mas ainda assim existem cenas em que o sangue jorra aos borbotões. Mas ele conseguiu trabalhar com imagens mais contidas e com resultados impressionantes, ainda mais considerando-se que foi um filme realizado com muito pouco dinheiro. Assim, o ponto alto dos efeitos especiais e visuais é a criatividade.
Robert Englund, como Freddy Krueger.
O enredo conseguiu colocar o mundo dos sonhos e, mais especificamente, dos pesadelos, em um novo nível de terror, na história em que sonho e realidade misturam-se de forma alucinante e definitiva quando vários jovens residentes da calma Rua Elm têm o mesmo sonho, no qual um homem estranho os persegue, tentando matá-los utilizando-se de uma luva na qual ele prendeu quatro navalhas, como extensões de seus dedos; não tão eficiente quanto o Wolverine, mas ainda assim aterrorizante, especialmente por o vilão Freddy Krueger ter um amplo domínio do ambiente de pesadelo em que vive. Os pesadelos ganham dimensão de realidade, com objetos podendo ser trazidos do mundo dos sonhos para a realidade.
Heather Langenkamp, e o pesadelo invadindo a realidade.
À medida que as sequências de sonho e realidade vão se alternando, a alucinação vai ganhando credibilidade e as pessoas envolvidas perdem o que lhes resta de razão. E, assim como a realidade é levada aos sonhos, seja por meio de processos inconscientes, seja por meios conscientes, o pesadelo também se mostra igualmente passível de ser trazido ao mundo real. E se um pesadelo surgir em nosso mundo, o que se pode esperar que aconteça? Talvez, sonhos dentro de sonhos, dentro de sonhos, eternamente?
O final do filme é uma surpresa, sem propor solução alguma, apenas dando a ideia de continuidade, que é o que deve estar presente em um pesadelo que se preze. No entanto, alguns críticos não gostaram exatamente do final. O cinema acaba, mas o pesadelo não. Infelizmente, para quem gosta de bom cinema de terror, a franquia também não acabou, despejando uma série de obras menores e desnecessárias, a não ser para quem ganhou muito dinheiro com elas.
Os atores, jovens e desconhecidos na época, estão excelentes como os filhos insatisfeitos de famílias desfeitas. Os problemas estão por trás da aparência de ordem e tranquilidade de uma rua de classe média americana, ficando bem claro que cabe aos pais a culpa pelo terror que se infiltra no mundo.
É um dos excelentes filmes de terror de sua época.
Abaixo, mais imagens de A Hora do Pesadelo: Robert Englund como Freddy Krueger; Heather Langenkamp, sonhando acordada; Amanda Wyss; Robert Englund e Heather Langenkamp.
BRAZIL, O FILME (Brazil, 1985)
Direção de Terry Gilliam.
VIAGEM AO MUNDO DOS SONHOS (Explorers, 1985)
Direção de Joe Dante.
River Phoenix, Ethan Hawke e Jason Presson (Paramount Pictures).
O filme de Joe Dante foi um imenso fracasso de bilheteria, em parte por ter sido lançado alguns dias após a estreia de De Volta Para o Futuro. Segue a aventura de jovens amigos após um deles receber, durante seus sonhos, instruções para construir uma nave espacial, o que conseguem fazer e partir da Terra, eventualmente encontrando um alienígena e sua irmã, que são criaturas muito engraçadas; o alienígena recebe sinais de televisão da Terra e fala e age interpretando os maiores nomes da cultura norte-americana; e isso é o que o filme tem de melhor. De resto, não funciona como certamente o diretor e os produtores esperavam.
CONFRONTO COM O DIABO (Dream Demon, 1987)
Direção de Harley Cokliss.
(Palace Pictures).
Duas jovens de personalidades diferentes descobrem que estão tendo os mesmos sonhos, e que os sonhos estão se tornando pesadelos que infestam sua vida real, tirando suas forças. Como o título diz, os sonhos têm a ver com demônios, que podem se manifestar no mundo real.
LIMITE DA LOUCURA (Shadow Zone, 1990)
Direção de J.S. Cardone.
(Full Moon Entertainment).
A NASA realiza experiências e pesquisas relacionadas com os sonhos, mas as coisas não saem como imaginavam. Os sonhos surgem como portais para um universo paralelo, e seres de outra dimensão aparecem em nosso mundo. O filme até que é bem feitinho, com efeitos competentes e algum suspense. A produção é da empresa de Charles Band, especialista nos gêneros ficção científica e terror, ainda que geralmente sem muita qualidade.
A CASA DOS SONHOS (Paperhouse, 1988)
Direção de Bernard Rose.
Charlotte Burke, em A Casa dos Sonhos (Working Title Films).
Filme baseado na história Marianne Dreams, de Catherine Storr, escrito nos anos 1950, e que fala de uma garota criando um mundo de sonhos em seus desenhos e continuamente mudando suas fronteiras ao adicionar novos desenhos. No mundo dos seus sonhos, tudo o que ela deseja é tornado real, mas os sonhos começam a ficar cada vez mais perigosos e fora do controle.
MORTE CEREBRAL (Brain Dead, 1990)
Direção de Adam Simon.
Bill Pullman, George Kennedy, Bill Paxton e Bud Cort (Concorde Pictures/ New Horizons).
Também com o titulo Paranoia. Produção da empresa de Roger Corman, com história de Charles Beaumont, um dos mais frequentes e melhores escritores da série clássica Além da Imaginação. Apesar de nem sempre ser bem recebido pela crítica, o filme apresenta uma viagem fantástica pelo cérebro humano quando sujeito a intervenções externas, em uma série de imagens de sonho e pesadelo que se confundem e indefinem a trama principal até o final. Começa apresentando Bill Pullman como o dr. Martin, neurocirurgião brilhante que é contatado por uma grande corporação para operar a cabeça de um matemático excepcional que havia descoberto uma equação que a companhia deseja a todo custo; ou então apagar de vez a fórmula de sua cabeça. O sujeito está internado em um sanatório, com uma paranoia daquelas e, nesse caso, com razão.
Quando as coisas parecem estar se resolvendo, com o matemático sendo operado, a história começa a mudar completamente, e o dr. Martin passa a ser identificado como o matemático, sofrendo da mesma paranoia, até a revelação final, quando se sabe que ele se encontra em uma mesa de operações, imaginando e vivendo tudo aquilo, com o cérebro aberto sendo explorado, após ele sofrer um acidente.
A sucessão de situações em que ele está sempre acordando de um pesadelo ou entrando em outro é muito boa, muito bem orquestrada, em uma história boa e roteiro enxuto e preciso. Um belo pesadelo do cinema de terror.
SONHOS (Dreams, 1990)
Direção de Akira Kurosawa.
(Warner Bros./ Akira Kurosawa USA).
O filme reúne oito histórias que surgiram de sonhos recorrentes do excepcional diretor Akira Kurosawa, em produção conjunta do Japão e EUA, com Steven Spielberg como produtor executivo. E certamente é um dos grandes momentos de Kurosawa, com as histórias, de certa forma, e sempre com um tom onírico, fazendo uma retrospectiva de sua própria vida. O sonho descrito no segmento O Túnel, um dos momentos mais marcantes, mostra uma tropa de soldados japoneses mortos surgindo de um túnel em uma estrada, enquanto seu comandante desculpa-se por estar vivo e ordena-lhes que retornem. Outras duas sequências retratam o horror da destruição nuclear; em Monte Fuji em Vermelho, uma usina nuclear entra em colapso, fazendo com que milhões de pessoas fujam em direção ao oceano; em O Demônio Que Chora, um homem que vagueia por uma região enevoada encontra um humano mutante com um chifre, como um demônio, que lhe explica que ocorreu um holocausto nuclear.
Um filme exuberante.
TWIN PEAKS (Twin Peaks, 1990-1991)
Criado por Mark Frost e David Lynch.
Kyle MacLachlan e Carel Struycken (Lynch-Frost Productions/ Propaganda Films/ Spelling Entertainment/ Twin Peaks Productions).
Esse é, provavelmente, um dos seriados mais estranhos já produzidos para a televisão, o que não é de se estranhar já que foi realizado por David Lynch, do estranhíssimo e sensacional Eraserhead, entre outros filmes do diretor.
É uma história policial com um pé no fantástico e na fantasia. Kyle MacLachlan interpreta o agente do FBI com métodos de investigação bem diferentes e com a mania de falar para um gravador como se estivesse conversando com uma amiga. Ele chega à cidadezinha de Twin Peaks para investigar a morte da jovem Laura Palmer. À medida que a investigação prossegue, ficamos sabendo da vida secreta e dos podres de todos os habitantes da cidade, além de inúmeros motivos que poderiam levar ao assassinato da jovem, e ainda de outros assassinatos.
Pessoas enlouquecendo, conversas secretas, ambientes fantasmagóricos, tudo contribui para o clima pesado da série, ainda que o humor seja constante. O agente Dale Cooper tem visões, sonhos alucinógenos nos quais aparecem um gigante, que lhe dá dicas para seguir com as investigações, seres estranhos e aparentemente sem sentido, anões, mulheres misteriosas. Foi um dos grandes sucessos e entre os melhores momentos da televisão.
ATÉ O FIM DO MUNDO (Until the End of the World, 1991)
Direção de Wim Wenders.
Max von Sydow e Jeanne Moreau (Argos Films/ Road Movies Filmproduktion/ Village Roadshow Pictures/ Warner Bros./ Wim Wenders Stiftung).
William Hurt interpreta o sujeito que, em 1999, sai pelo mundo captando imagens utilizando um aparelho inventado pelo pai (Max Von Sydow), que irá permitir que sua mãe cega (Jeanne Moreau) enxergue. Ele é seguido por uma mulher (Solveig Dommartin) e o amante/amigo dela (Sam Neill), ao mesmo tempo que um satélite indiano está prestes a cair sobre o planeta e causar uma catástrofe. Os EUA planejam destruí-lo com uma explosão nuclear que pode causar uma reação em cadeia e o fim do mundo.
O filme foi tido como o projeto mais ambicioso do famoso cineasta Wim Wenders, com resultados que dividiram a crítica. Segundo Wenders, o filme fala sobre o perigo das imagens, o mal das imagens que, no momento, estão perdendo sua relação com a realidade. “A imagem eletrônica”, ele disse em uma entrevista, “quebrou a ligação que havia com o momento original. Estamos no início de uma nova época, com a imagem digital, em que ninguém pode diferenciar o que é original do que é cópia”, entendendo que isso é grave. O escritor Philip K. Dick já sabia disso e explorou de forma mais abrangente em seus livros dos anos 1960/70.
No filme, Von Sydow e Hurt conseguem gravar até mesmo os sonhos. Eles e Dommartin ficam viciados nas imagens dos sonhos que, em vão, tentam interpretar. Um filme quase sempre interessante, ainda que um tanto cansativo e algumas vezes confuso.
LADRÃO DE SONHOS (La Cité des Enfants Perdus, 1995)
Direção de Marc Caro e Jean-Pierre Jeunet.
Ron Perlman e Judith Vittet (Canal+/ Centre National de la Cinématographie/ Eurimages/ France 3 Cinéma/ Televisión Española).
Uma fantasia excepcional, com cuidados técnicos e cenários deslumbrantes. A ação acontece em uma cidade cuja localização jamais é definida, um local quase que só água, onde as crianças estão desaparecendo, sendo raptadas pelos ciclopes, seres que só podem observar o nosso mundo através de uma lente especial em um dos olhos, e que estão ligados a um grupo de clones que habitam uma construção semelhante a um poço de petróleo, no meio da água, cercados por minas gigantescas. Um dos clones é somente um cérebro dentro de um aquário, e os demais servem a um sujeito que está utilizando as crianças para capturar seus sonhos, com objetivos nunca exatamente definidos. Na cidade, um homem musculoso e que quase não sabe falar (Ron Perlman), mas com coração de ouro, vai atrás de seu “irmãozinho”, raptado pelos ciclopes, e é ajudado por uma garota pertencente a crianças que roubam de tudo para as gêmeas malvadas. Uma loucura total, com roteiro composto de retalhos que vão formando um quadro geral fantástico. Faz parte do universo estranhíssimo da dupla Jeunet e Caro, iniciado com Delicatessen, em 1991.
Daniel Emilfork.
John Scalzi (em The Rough Guide to Sci-Fi Movies) disse que “(…) Delicatessen foi apenas um aquecimento para Ladrão de Sonhos, um filme quase indescritivelmente estranho que genuinamente alcança o estado de sonho que muitos filmes estranhos tentam e não conseguem produzir”. David Pringle considerou o filme a mais extraordinária fantasia cinematográfica do final do século 20.
E os elogios não são exagerados. Ladrão de Sonhos é um dos melhores filmes do gênero já realizados, e simplesmente impossível de deixar passar em branco.
GERAÇÃO X (Generation X, 1996)
Direção de Jack Sholder.
Os quadrinhos da Marvel ficaram bastante famosos, mas o filme é fraco. Tanto a história quanto o desenvolvimento é mais voltado para jovens, apresentando adolescentes como mutantes que vão para o Instituto Xavier com o objetivo de desenvolver suas capacidades, em uma época em que grande número de mutações começou a surgir na sociedade, sendo caçados pela polícia e estigmatizados pela população. Matt Frewer interpreta o cientista obcecado pelo poder que os sonhos podem ter e que elabora uma máquina para entrar nos sonhos das pessoas e dominá-las, sendo combatido pelos jovens poderosos.
SLEEPWALKERS (1997-1998)
Criação de David S. Goyer e Stephen Kronish.
(Columbia TriStar Television/ NBC Studios).
Série que durou apenas nove episódios e que diz respeito a um grupo de cientistas que pesquisam com os sonhos. São capazes de, eletronicamente, “enviar” pessoas para dentro dos sonhos, ambiente no qual não apenas vivenciam os sonhos e pesadelos dos outros, mas capazes de interagir. São contratados para resolver problemas psicológicos de pacientes. Na época já não era uma ideia muito nova.
SONHANDO ACORDADO (La Science des Rêves, 2006)
Direção de Michel Gondry.
Gael Garcia Bernal (Partizan Films/ Gaumont/ France 3 Cinéma).
Gael Garcia Bernal interpreta um homem cujos sonhos, extremamente reais, interferem em sua vida, atrapalhando sua convivência com a realidade. A história segue sua vida quando ele se muda para Paris e conhece uma mulher por quem se interessa, e seus sonhos passam a invadir sua vida de modo que se torna quase impossível discernir o que é sonho e o que é realidade.
A ORIGEM (Inception, 2010)
Direção de Christopher Nolan.
Leonardo DiCaprio e Ellen Page em um sonho criado em A Origem (Warner Bros./ Legendary Entertainment/ Syncopy).
Um dos grandes filmes de ficção científica de sua época. Parece impossível falar de A Origem sem mencionar Philip K. Dick e suas realidades dentro de realidades, os jogos em que nunca se sabe – nós e os personagens – exatamente em que universo estão transitando, ou quais regras devem ser seguidas a cada momento. O filme é, também, um excelente exemplo de como os efeitos especiais podem trabalhar a favor da história, junto com ela, servindo à história e não se sobrepondo a ela.
Em um futuro indeterminado, desenvolveu-se uma tecnologia que permite às pessoas entrar no sonho de outras, de modo que surgem também as pessoas com habilidades especiais para fazer esse serviço, como Cobb (Leonardo Di Caprio). Ainda que a técnica seja estudada e desenvolvida em laboratórios e universidades, muitas pessoas com essas habilidades são contratadas por grandes corporações para penetrar no sonho de concorrentes e roubar informações; conseguem drogar o sonhador e conectar-se a ele, penetrando em seu sonho, na verdade construindo um cenário apropriado para obter as informações que querem, sem que o sonhador perceba o que está acontecendo.
Joseph Gordon-Levitt, em um dos níveis do sonho.
Cobb é contratado pelo milionário Saito (Ken Watanabe) para realizar uma missão única: em vez de roubar informações, implantar uma ideia na mente de Robert Fisher (Cillian Murphy), de modo que ele, ao herdar a empresa de energia de seu pai, não dê continuidade ao seu império, o que significaria um monopólio mundial na indústria de energia. Para Cobb, é a oportunidade dele se redimir e poder voltar para casa, nos EUA, onde é procurado pela polícia.
Um grande plano é arquitetado, com grau de dificuldade jamais visto, uma vez que não basta implantar a ideia; ela tem de surgir na mente do homem como se fosse proveniente dele mesmo e, assim, o grupo de invasores dos sonhos tem de chegar ao subconsciente do sujeito. Para tanto, planejam atingir três níveis diferentes de sonhos, cada vez mais profundos, e em cada um o tempo passa de forma diferente; e cada nível tem de ser atingido a partir do outro, com o processo de penetrar no sonho sendo realizado novamente. Entre os inúmeros problemas e dificuldades de organização para a tarefa está o fato de que o próprio Cobb tem sérios problemas com imagens de seu subconsciente, como sua esposa falecida que surge em todas as imagens de sonho que percorre.
Leonardo DiCaprio e Marion Cotillard.
Os sonhadores costumam carregar consigo o que chamam de “totem”, um objeto qualquer que tenha significado específico para eles. O objetivo é, durante a permanência no sonho, poder olhar para o objeto e ter certeza de que ainda está dentro do sonho porque, quanto mais tempo eles passam entrando e saindo dos sonhos alheios e construindo cenários para os sonhos dos outros, mais difícil fica para eles distinguir o sonho da realidade. E é exatamente o totem utilizado por Cobb que, ao final do filme, abre a possibilidade de mais de uma interpretação para o filme. Cobb diz que passou 50 anos (no tempo dos sonhos) vivendo com a esposa em um mundo que eles foram construindo aos poucos. Ela começou a pensar que aquele mundo era a realidade e, para convencê-la a sair do sonho – e a forma mais rápida para fazer isso nos sonhos é morrendo – ele implantou uma ideia em sua mente, o conceito de que aquele mundo não era real. Os dois se mataram deitando-se num trilho de trem, mas ao acordar no mundo real, a ideia implantada no sonho continuou a prevalecer, de modo que a esposa continua achando que o mundo em que vivia não era o mundo real, e pulou da janela do apartamento. Cobb, punindo-se pelo que fez, manteve as memórias da esposa trancadas dentro de si, e ela se voltava contra ele em cada incursão que fazia nos sonhos.
O pião "totem", girando em cima da mesa, sem que saibamos se o sonho continua ou não.
Cobb usava um pequeno pião como totem; se ele girasse o pião e este não parasse jamais de girar, significava que ele ainda estava dentro do sonho; se o pião parasse de girar e caísse, ele estava fora do sonho. Na última cena do filme, Cobb supostamente conseguiu implantar a ideia na mente do magnata, e Saito conseguiu que as acusações contra ele fossem retiradas, de modo que ele pôde entrar nos EUA e rever seus filhos. Ao chegar à sua casa, desconfiado, ele gira o pião em cima da mesa, enquanto observa seus filhos. Cobb esquece o pião, a câmera focaliza o objeto, girando sem parar, e o filme termina. O pião vai parar ou vai continuar para sempre? Cobb conseguiu sair do sonho ou não? E, mais do que isso, a dubiedade final abre a possibilidade de que tudo, absolutamente tudo, desde o início do filme, seja um sonho interminável. Ou abre a discussão em torno da ideia de que não existem, de fato, meios científicos capazes de determinar se estamos sonhando ou não, se nossa vida é um sonho dentro de um sonho, dentro de outro sonho, interminavelmente. Em que ponto começa e termina um sonho, e onde começa e termina a realidade? É, na verdade, um verdadeiro pesadelo, quando se leva o pensamento às últimas consequências, e é um dos temas mais interessantes no ambiente da fc, tratado no filme de forma magistral.
A VIDA SECRETA DE WALTER MITTY (The Secret Life of Walter Mitty, 2013)
Direção de Ben Stiller.
Ben Stiller e Sean Penn (Twentieth Century Fox/ TSG Entertainment/ Samuel Goldwyn Films/ Red Hour Films).
Ben Stiller dirige e é o protagonista da comédia fantástica baseada no conto com o mesmo título, escrito por James Thurber em 1939 e publicado pela primeira vez na revista The New Yorker. A historia já havia sido adaptada para o cinema em 1947 como O Homem de Oito Vidas (The Secret Life of Walter Mitty), dirigido por Norman Z. McLeod, com o comediante Danny Kaye como o personagem central. Como a primeira adaptação, o filme de Stiller foi bem recebido pela crítica e, também como seu antecessor, modificou bastante a história de Thurber.
Aqui, Stiller interpreta Walter Mitty, que trabalha na revista Life como o responsável pelas imagens de capa enviadas pelo fotógrafo Sean O’Connell (Sean Penn), em um momento em que a revista está preparando sua última edição impressa. E Walter tem constantes sonhos nos quais vive fantásticas aventuras, mostrando uma personalidade totalmente oposta à de sua vida diária. O problema é que ele tem esses sonhos durante o dia, em momentos em que ele simplesmente “apaga” para o que está à sua volta.
Ben Stiller e Kristen Wiig.
Ele também está muito interessado em sua colega de revista Cheryl (Kristen Wiig), e é esse interesse que o leva a viver de fato algumas aventuras, quando resolve tentar recuperar o negativo da foto que O’Connell enviou para a última capa da revista, e que Walter perdeu. Sua busca por O’Connell leva-o à Groenlândia e à Islândia, enfrentando um ataque de tubarão e uma explosão vulcânica, porém sem êxito. A pista que faltava para localizar o fotógrafo surge quando ele retorna a Nova York, e ele consegue encontrá-lo numa região inóspita do Himalaia.
Talvez alguns críticos esperassem apenas uma comédia, já que é a especialidade de Ben Stiller, mas o filme é mais do que isso, com uma mensagem bem legal e imagens sensacionais. Vale a pena.
O SONO DA MORTE (Before I Wake, 2016)
Direção de Mike Flanagan.
Kate Bosworth em O Sono da Morte (Intrepid Pictures/ Demarest Films/ MICA Entertainment).
Fantasia com toques de terror, apresentando a capacidade do jovem Cody, de oito anos. Ele passa a morar com uma família adotiva que logo descobre que ele tem sonhos recorrentes, e que esses sonhos têm a capacidade de manifestar-se fisicamente em nosso mundo, e geralmente de forma nada agradável.
CAMINHOS CRUZADOS (Falling Water, 2016-2018)
Criação de Henry Bromell e Blake Masters.
(Gangtackle Productions/ Valhalla Entertainment/ Universal Cable Productions).
Seriado que durou apenas duas temporadas, com história centrada em três personagens que descobrem que estão sonhando partes diferentes de um mesmo sonho. Aos poucos, também percebem que os sonhos vão muito além do que imaginavam. No Brasil, foi apresentado no Prime Video, o canal da Amazon.