Quando se fala de máquina do tempo, a primeira imagem que vem à minha mente é a da máquina do filme de George Pal, A Máquina do Tempo, baseado no livro clássico de H.G. Wells. Talvez seja algo da minha geração, mas a impressão que tenho é de que se trata da máquina do tempo mais famosa de todas. Por alguma razão (que, talvez, só o tempo possa explicar), ela passa a impressão de que realmente funciona. Pensando melhor, não deve ser algo da minha geração, não. Afinal, uma réplica da máquina foi utilizada num episódio da série The Big Bang Theory, e os caras realmente acreditavam que ela poderia, quem sabe, funcionar.
E, apesar de o livro de Wells ser marcante na história do gênero, curiosamente ele não foi o primeiro a “inventar” uma máquina capaz de realizar as viagens. Em The Science Fiction Encyclopedia, John Clute cita o conto The Clock That Went Backward (1881), de Edward Page Mitchell, um autor que, até os anos 1970, era pouco conhecido, tendo publicado suas histórias no jornal nova-iorquino Sun. Em 1973, o historiador da ficção científica, Sam Moskowitz, publicou a coletânea The Crystal Man: Landmark Science Fiction, com esta e outras histórias de Mitchell.
A história foi escrita pensando no público juvenil e tem como personagens dois garotos que viajam no tempo após girarem ao contrário os ponteiros do relógio do século 16, da Tia Gertrude.
Ainda não era exatamente uma “máquina” do tempo, mas quase.
Outro aparelho surgiu em 1887, em El Anacronópete, do autor espanhol Enrique Gaspar y Rimbau. A obra é apresentada como sendo uma zarzuela, uma espécie de ópera espanhola, alternando cenas faladas e cantadas. A máquina em si é uma imensa caixa de ferro, impulsionada por eletricidade; entre outras coisas, ela também um fluido que impede que os passageiros se tornem mais jovens à medida que viajam para o passado. Ela foi desenvolvida pelo cientista Don Sindulfo García, e as viagens incluem uma série de pessoas para ajudá-lo.
A forma de viajar é voando rapidamente no sentido contrário ao da rotação terrestre, expediente ingênuo utilizado muito tempo depois pelo Superman. O grupo parte de Paris, em 1878, e chega ao ano de 1860, depois retornando. Posteriormente, mais viagens são realizadas aos anos de 1492, 690 e 220. Numa terceira série de viagens no tempo, eles passam por Pompeia, na época da erupção do Vesúvio, no ano 79, e chegam ao século 30 a.C., na época de Noé.
Só que, ao final, tem-se a impressão de que tudo não passou de um sonho de Don Sindulfo, que estava assistindo a uma peça baseada em Jules Verne.
A máquina do tempo de H.G. Wells começou a ser construída com seu conto The Chronic Argonauts (1888), mas foi com A Máquina do Tempo (The Time Machine, 1895) que a história das viagens no tempo começou a mudar de fato. O editor e crítico inglês Malcolm J. Edwards, escrevendo sobre o tema em The Science Fiction Encyclopedia, disse que a importância do livro de Wells foi que ele deu ao viajante do tempo mobilidade e controle sobre seus movimentos. “Wells também deu um salto imaginativo”, ele escreveu, “levando seu viajante ao futuro distante, para testemunhar o fim do mundo. (...) A invenção da máquina do tempo de Wells revolucionou as histórias de viagens no tempo, tornando possível ao viajante aventurar-se em outras épocas de forma seletiva e intencional”.
No livro The Visual Encyclopedia of Science Fiction, editado por Brian Ash, diz-se que Wells levou o conceito da mudança evolucionária ao seu limite, “trazendo uma nova perspectiva às histórias utópicas e, de fato, a toda a área da fantasia científica”.
Para quem ainda não conhece a história – se é que isso é possível – um cientista, identificado pelo narrador apenas como Viajante do Tempo, consegue construir uma máquina capaz de levá-lo para o futuro e de volta ao seu tempo. O viajante chega ao ano 802.701, encontrando a sociedade dividida em dois grupos, os Eloi e os Morlock. Os primeiros, formam uma sociedade aparentemente perfeita, ainda que bastante infantilizada, sem ter de trabalhar e levando uma vida sem grandes objetivos ou curiosidade científica. Já os Morlock são criaturas semelhantes a trogloditas, vivendo em comunidades subterrâneas, e que se alimentam dos próprios Eloi. Os Morlocks conseguem capturar sua máquina do tempo, mas o viajante a recupera e viaja para o futuro distante, presenciando o final da vida no planeta e o fim da própria Terra. Eventualmente, ele volta ao seu próprio tempo para contar sua história, mas parte em nova jornada, para nunca mais se ouvir falar dele.
Diz-se que a primeira adaptação visual do livro foi feita pela BBC, em 1949, mas não existem mais cópias. A mais conhecida é, sem dúvida, o filme dirigido por George Pal, A Máquina do Tempo (The Time Machine, 1960), com Rod Taylor como o viajante do tempo, e Yvette Mimieux como Weena, a Eloi que ele encontra no futuro e por quem desenvolve um interesse amoroso.
Rod Taylor, como o Viajante do Tempo, em sua máquina famosa (George Pal Productions/ Galaxy Films Inc./ Metro-Goldwyn-Mayer).
Peter Nicholls – editor de The Science Fiction Encyclopedia – e o escritor John Brosnan, escrevendo sobre o filme na enciclopédia, ressaltam que, ao contrário do que fez com A Guerra dos Mundos (The War of the Worlds, 1953), também baseado no clássico de H.G. Wells, em A Máquina do Tempo, George Pal resolveu situar a história na época vitoriana, no início do filme, “e são essas sequências”, eles entendem, “com o inventor demonstrando sua criação a seus amigos céticos, no meio dos objetos vitorianos de seu mundo confortável, que funcionam melhor”. Mas eles dizem que, após uma jornada pelo tempo visualmente interessante, o filme reduz a parábola inflamada de Wells a uma fórmula de ficção científica de Hollywood. Assim, o filme perde os paralelos simbólicos que o autor estabeleceu entre os Morlocks e a classe trabalhadora da era vitoriana, e entre os Eloi e a classe alta. Para Nicholls e Brosnan, o bom trabalho de arte e de efeitos especiais do filme não compensa a simplificação da história.
Yvette Mimieux.
Em The Encyclopedia of Science Fiction Movies, Phil Hardy também bate firme na adaptação de George Pal, entendendo que, apesar de não ter atualizado a história de Wells, ele e o roteirista David Duncan “castraram” a obra no interesse da simplicidade, e o fizeram de tal forma que pouco das visões originais de Wells permaneceram. “O filme”, escreve Hardy, “também omite a visão pessimista de Wells sobre o processo evolucionário que conclui o livro”.
Não há dúvida de que o que mais marcou no filme foi a máquina do tempo, elaborada pelo diretor de arte Bill Ferrari – será, então, que podemos dizer que a máquina do tempo é uma “Ferrari”? –, assim como os efeitos especiais, que ganharam o Oscar, em particular a mudança de cenários e de épocas, à medida que o viajante se desloca no tempo.
Os morlocks, habitantes dos subterrâneos.
Em 1978, outra adaptação foi apresentada, The Time Machine, em produção para a televisão dirigida por Henning Schellerup, mas ainda mais distante da história original de Wells. Faz uma atualização, apresentando o inventor nos anos 1970 e trabalhando para uma empresa. Além disso, a máquina não apenas viaja para o passado como também se desloca no espaço, surgindo em diferentes locais do planeta, antes de ir para o futuro e encontrar os Eloi e os Morlocks.
A refilmagem de 2002, A Máquina do Tempo (The Time Machine), teve como diretor o bisneto do escritor H.G. Wells, Simon Wells, com Guy Pearce como o viajante do tempo, que aqui recebe um nome, Alexander Hartdegen. A história, como sempre, é modificada, e uma tragédia pessoal é acrescentada à vida do inventor: sua noiva é assassinada, e é esse o motivo que o leva a querer construir a máquina e voltar no tempo para salvá-la. Quando percebe que qualquer tentativa que fizer não dará resultado, ele resolve viajar para o futuro, para ver se encontra respostas numa tecnologia mais avançada.
História e máquina repaginada, na versão de A Máquina do Tempo, com Guy Pearce como o viajante do tempo (Warner Bros./ DreamWorks).
Assim, toda a base da história original é deixada de lado, as questões sociais que motivaram a elaboração de H. G. Wells. Eventualmente, ele viaja até o futuro distante, encontrando os Eloi e os Morlocks, assim como um novo amor. Claro que os efeitos especiais são muito bem feitos, mas a história está longe do que Wells, o original, elaborou.
(Delacorte Press).
Em 1979, o escritor Karl Alexander elaborou uma história relacionada com a máquina do tempo de Wells, em Time After Time, que originou o filme Um Século em 43 Minutos. Ele partiu da ideia de que H.G. Wells realmente tinha construído uma máquina e que ele viajou para o ano de 1979, em perseguição a Jack, O Estripador, conhecido de Wells, que usa a máquina para fugir da polícia, quando descobrem que ele é o assassino que está aterrorizando Londres. Em 1979, Stevenson, o Estripador, continua matando mulheres, e Wells tenta deter suas ações, ao mesmo tempo em que se apaixona por uma caixa de banco.
O filme ficou mais conhecido do que o livro, e teve direção de Nicholas Meyer, com Malcolm McDowell como H.G. Wells, David Warner como Stevenson/ Jack, O Estripador e Mary Steenburgen como Amy, o interesse amoroso de Wells.
H.G. Wells (Malcolm McDowell) mostra sua máquina aos colegas, entre eles o Estripador (David Warner, ao fundo) em Um Século em 43 Minutos (Orion Pictures Company/ Warner Bros. Pictures).
O filme segue basicamente a história de Karl Alexander, adaptada por Steve Hayes e com roteiro do próprio Nicholas Meyer. Quando Stevenson rouba a máquina do tempo, vai parar na São Francisco de 1979. A máquina automaticamente retorna para o passado, de modo que Wells pode segui-lo. O contraste interessante entre os dois personagens é que, enquanto Stevenson se adapta perfeitamente à sociedade muito mais violenta do século 20, Wells tem imensas dificuldades em seguir os costumes, e percebe que o futuro não é bem o que ele imaginava.
O livro de Alexander ainda originou a série Time After Time, que teve curtíssima duração, em 2017, com produção da Warner Bros. Television. Apenas cinco episódios foram apresentados pela rede ABC, antes do cancelamento.
Ainda em 1979, o livro Morlock Night, de K.W. Jeter, imagina que o viajante do tempo do livro de Wells retorna ao futuro, mas é morto pelos Morlocks, que se apoderam da máquina do tempo e invadem a Inglaterra de 1892. David Pringle (em The Ultimate Guide to Science Fiction) diz que o livro foi escrito especialmente com um sentido de humor, especialmente quando o Rei Arthur e Merlin são chamados para resolver os problemas. A obra ficou mais famosa porque o autor, Jeter, ao escrever uma carta para a Locus Magazine, em 1987, inventou o termo “steampunk” para descrevê-la, assim como algumas obras de escritores como Tim Powers e James Blaylock.
Em 1995, foi a vez do escritor Stephen Baxter publicar The Time Ships, como uma sequência “oficial” ao livro de H.G. Wells, autorizada pelo espólio do autor. O livro ganhou o John W. Campbell Memorial Award, o Phiip K. Dick Award e o British Science Fiction Association Award, além de ter sido indicado para os prêmios Hugo, Clarke e Locus.
(Harper Collins).
A história é bem complexa, envolvendo o retorno do viajante ao futuro, porém encontrando uma sociedade diferente da que tinha visitado anteriormente. Ele é capturado por Morlocks mais desenvolvidos, e um deles explica que a linha de tempo que ele procura não mais existe, porque o Escritor publicou a história A Máquina do Tempo. O enredo envolve linhas alternativas do tempo, com o governo tendo acesso às viagens temporais, uma Primeira Guerra Mundial que se estende por 24 anos, até 1938, para onde os personagens são levados, e muito mais. Ao que pude apurar, não foi publicado em português.
A cronosfera de Brick Bradford (Arte de Clarence Gray).
Um viajante do tempo que ficou bastante conhecido em sua época foi Brick Bradford. O personagem foi desenvolvido para os quadrinhos em 1933, pelo escritor William Ritt e pelo desenhista Clarence Gray, surgindo nas tiras diárias de jornais dos Estados Unidos. Ele inicia suas aventuras como um aviador, mas a partir de 1935 os autores passaram a incluir uma máquina do tempo nas aventuras, a cronosfera – em inglês, a máquina conhecida como Time Top, parecida com um balão imenso.
Kane Richmond, como Brick Bradford, saindo de sua cronosfera com Linda Johnson (Linda Leighton).
Em 1947, o viajante do tempo foi para o cinema, com Brick Bradford (Brick Bradford), um seriado em 15 capítulos, com direção de Spencer Gordon Bennet e Thomas Carr, e Kane Richmond como Brick Bradford.
As aventuras envolvem uma viagem à Lua e, é claro, uma viagem ao passado com a cronosfera.
O personagem não chegou a ter a mesma importância de Flash Gordon, mas ainda assim teve longa duração nos quadrinhos, enquanto o seriado foi, em geral, massacrado pela crítica.
O prolífico escritor Isaac Asimov também deu sua contribuição importante para as histórias de viagens no tempo. No livro O Futuro Começou (The Early Asimov) encontramos o conto A Corrida da Rainha de Copas (The Red Queen’s Race,1948/49), publicado inicialmente na revista Astounding Science Fiction. O título faz referência à Rainha Vermelha, personagem criada por Lewis Carroll no livro Alice Através do Espelho (Through the Looking-Glass, 1871).
Capa da primeira edição (Doubleday).
A história é narrada por um investigador que tenta descobrir o que aconteceu com o físico Tywood, encontrado morto numa usina nuclear que foi, literalmente, derretida. Ao conversar com os alunos envolvidos nas pesquisas do cientista, fica sabendo que ele trabalhava com as viagens no tempo, ou o que um jovem chama de “translação microtemporal”, algo que requeria quantidades consideráveis de energia para enviar objetos para o passado. Ele descobre que o cientista pretendia alterar a história enviando informações modernas de química para a Grécia helenística.
Capa da primeira edição (Doubleday).
No livro Júpiter à Venda (Buy Jupiter), outros quatro contos abordam as viagens no tempo. O Dia dos Caçadores (Day of the Hunters, 1950) foi publicado pela primeira vez em Future Combined with Science Fiction. É um conto bem curto no qual três jovens conversam num bar, sobre a extinção dos dinossauros, quando um bêbado que está ao lado se intromete na conversa, afirmando saber exatamente o que aconteceu com os dinossauros. Ele diz ser um cientista que construiu uma máquina do tempo e, com ela, recuou à era Mesozoica, encontrando pequenos répteis portando cintos metálicos e revólveres de energia, que caçavam os répteis maiores. Eles apenas não sobreviveram porque, na falta de caça, começaram a matar uns aos outros. Ele se despede dos jovens, irado, dizendo que o ser humano está seguindo o mesmo caminho, numa clara alusão ao momento de Guerra Fria – às vezes nem tão fria – em que os EUA e a União Soviética se encontravam.
Em Botão, Botão (Button, Button, 1953), publicado em Startling Stories, Asimov também escreve com senso de humor, ao contar a história do cientista Otto Schlemmelmayer, criador do “efeito Schlemmelmayer”, um aparelho capaz de fazer as flautas tocarem com o poder do pensamento, invenção que foi revertida para o uso militar, para seu imenso desgosto. Resolvido a continuar tentando criar música a partir do pensamento, ele desenvolve uma máquina do tempo. Porém precisando de dinheiro para seus projetos, pede ao seu sobrinho advogado que pense em algum objeto que pese poucas gramas e que possa ser recuperado do passado para ser vendido no presente. Ele consegue uma assinatura rara de um dos que assinaram a Declaração de Independência dos EUA, mas só se esquece que, quando o papel chega ao presente, ele continua novo, e é tido como uma falsificação.
Em Vazio (Blank, 1957), conto publicado em Infinity Science Fiction, um cientista convence seu auxiliar a entrar com ele na máquina do tempo, garantindo que não existe o perigo dos paradoxos, que o assistente teme. Eles entram na máquina, que se move para o futuro, até parar com um tranco. Quando eles saem, percebem que não existe nada ao seu redor, uma vez que ficaram retidos no “não-tempo”, entre duas partículas, enquanto seus pensamentos também desaparecem.
(Renown Publications / Alex Schomburg).
Em Uma Estátua Para Papai (A Statue For Father, 1959), publicado originalmente em Satellite Science Fiction, mais uma vez Asimov envereda pelo humor. Pai e filho trabalham numa máquina do tempo, o crono-funil, mas com muitas dificuldades. Uma única vez, conseguem manter estável uma abertura para o passado, por 10 minutos, e nesse período alguns ovos são jogados para o presente. O filho resolve chocar os ovos e nascem pequenos dinossauros que, com o tempo, mostram-se afáveis e se multiplicam. Quando estão sem dinheiro, ocorre um incidente é um dinossauro é eletrocutado no laboratório, destruindo toda a aparelhagem. Porém, pai e filho percebem que a carne tostada do ser é deliciosa e não têm dúvidas quanto a comercializá-la, com o nome dinofrango, o que os torna ricos. O pai é homenageado com a estátua “O homem que deu ao mundo o dinofrango”, apesar de que ele buscasse uma glória maior.
Capa da primeira edição (Doubleday).
Outros três contos sobre viagens no tempo aparecem no livro A Terra Tem Espaço (Earth Is Room Enough). O Passado Morto (The Dead Past) foi publicado pela primeira vez em 1956, em Astounding Science Fiction, e no conto Asimov apresenta o cronoscópio, uma máquina do tempo, sim, mas que apenas permite a visão de momentos específicos do passado. O professor Potterley, estudioso de história e que quer fazer um levantamento completo sobre Cartago, quer utilizar o aparelho, mas não consegue obter permissão para tal. A ciência que possibilita a construção do cronoscópio é a “neutrínica”, e ele tenta realizar uma pesquisa com um físico que conheça o assunto, mas também não consegue: no momento em que a história se passa, qualquer tentativa de pesquisa fora da especialidade do cientista é considerada “anarquia intelectual”.
Ainda assim, Potterley percebe que, após o primeiro livro sobre neutrínica, nada mais havia sido publicado, e dá continuidade a seus estudos, percebendo que ele mesmo poderia construir o aparelho. Para seu desespero, também percebe que o aparelho só consegue observar até 120 anos no passado, e por isso ninguém conseguia autorização para seu uso. A ideia é que o cronoscópio, podendo ser ajustado para qualquer data, possibilitaria que milhões de pessoas, em suas casas, com seus próprios aparelhos, pudessem investigar a vida de qualquer um, acabando com toda e qualquer privacidade.
Ao final do conto, as propriedades do cronoscópio são reveladas ao público, e as previsões são de que o mundo mudará radicalmente e, provavelmente para pior.
Em A Mensagem (The Message, 1956), conto publicado originalmente em The Magazine of Fantasy and Science Fiction, Asimov volta ao humor, imaginando que um viajante do tempo do século 30 esteve observando de perto os acontecimentos da Segunda Guerra Mundial, deixando sua marca numa cabana da África, com os dizeres “George Kilroy esteve aqui”. Essa era uma frase que surgia em vários pontos pelos quais os americanos passavam na Segunda Guerra (Kilroy was here).
Capa de Universe Science Fiction, Maio de 1954 (Palmer Publications/Robert Gibson Jones).
O Bardo Imortal (The Immortal Bard) foi publicado em 1954 em Universe Science Fiction, e, também em tom de humor, mostra uma conversa entre um cientista e um professor de inglês numa festa de Natal. Já meio bêbado, o cientista afirma que pode trazer personagens do passado ao presente em sua máquina do tempo. Tentou com várias personagens, mas teve de mandá-las de volta porque elas não se enquadravam na sociedade. Então, trouxe Shakespeare, porque ele possuía um espírito universal. E Shakespeare ficara encantado com o que dizem de suas obras, não acreditando que tanto possa ser dito de tão pouco. Tão encantado que é matriculado no curso sobre Shakespeare do professor. E o cientista teve de mandá-lo embora também, porque ele ficou muito deprimido e sentiu-se humilhado demais para aguentar quando foi reprovado pelo professor.
Mais um conto sobre viagens no tempo surge em Nove Amanhãs (Nine Tomorrows, 1959). Trata-se de O Garotinho Feio (The Ugly Little Boy), publicado em 1958, na revista Galaxy Science Fiction, com o título Lastborn. Na história, a empresa de pesquisas Estase e Cia., consegue trazer um garoto neanderthal do passado, mas ele tem de ser mantido dentro de um ambiente controlado no qual, segundo explica um cientista, “o tempo, tal como nós o compreendemos convencionalmente, não existe”. Ele fica aos cuidados de uma enfermeira de crianças e que não apenas ensina o garoto a falar inglês como se afeiçoa a ele de tal forma que, quando ele tem de ser devolvido a seu tempo, ela resolve ir junto.
A história, que Asimov considerava um de suas favoritas, foi adaptada para a televisão em 1977, com o mesmo título, numa produção canadense dirigida por Barry Morse e Don Thompson. A adaptação pode ser vista aqui, na versão em inglês. Em 1992, Robert Silverberg publicou uma versão expandida da história, com o título Child of Time.
Esses contos de Isaac Asimov são bastante conhecidos e comentados pelos especialistas, mas estão longe de representar o que existe de melhor ou mais interessante nas histórias de viagens no tempo, ainda que muitos deles sejam bem agradáveis.
(Ace Books).
O escritor Clifford D. Simak escreveu inúmeras histórias em que o tempo tem papel importante, ainda que a maioria delas lide mais diretamente com o tema dos universos paralelos. No entanto, em Guerra no Tempo (Time and Again, 1951), as viagens no tempo fazem parte importante do enredo. O livro foi publicado inicialmente em capítulos, na revista Galaxy, e também foi publicado com o título First He Died. Não existe uma explicação detalhada sobre as viagens no tempo, mas parte-se do pressuposto de que elas existem e de que são realizadas utilizando-se máquinas do tempo. E não se fala mais nisso!
A história se passa oito mil anos no futuro, quando a raça humana já conquistou a galáxia e não existem mais guerras na Terra. No entanto, os humanos ainda fazem suas conquistas com violência, utilizando também androides, muitos deles nada contentes com a situação e a obrigação de matar em nome da humanidade.
O personagem Christopher Adams, supervisor de “Negócios Estrangeiros” – o que significa que ele é o responsável por um setor do espaço conquistado pelos humanos – recebe a visita de um homem que diz vir do futuro e que é seu sucessor. Ele diz que um homem chamado Ashter Sutton, que partiu em uma missão há 20 anos e foi dado como desaparecido, está para voltar, e que ele deve ser morto.
(Dell Book).
Não é uma trama muito fácil de ser seguida, com muitas idas e vindas e, é claro, deslocações no tempo. Envolve um conhecimento importante para todo o universo e que está relacionado aos seres que habitam o sistema de 61 Cygni – estrela binária da constelação do Cisne. O planeta em que esses seres moram está fechado por um tipo desconhecido de energia, mas Sutton foi admitido, uma vez que eles pretendiam que ele retornasse com uma mensagem para os demais habitantes do universo. O segundo título pelo qual o livro ficou conhecido já entrega algo que ficamos sabendo lá pela metade do livro (“primeiro ele morreu”).
O tema central está ligado à noção do destino, que apareceria de formas diferentes em outros livros de Simak, e a “guerra no tempo” que está sendo travada diz respeito a diferentes grupos de humanos e androides, uns desejando que a mensagem em questão – um livro escrito por Sutton – não seja repassada, para que possam continuar suas conquistas, outros desejando que a mensagem seja compreendida e que a vida na galáxia mude para sempre. Simak apresenta o destino como uma realidade incontestável, assim como o fato de que ele está ligado a todo tipo de vida, sem exceção; todas as vidas estão conectadas, de modo que a agressão a qualquer uma delas significa a agressão a todas as vidas.
Esse não é o melhor livro de Clifford D. Simak, mas ainda assim apresenta ideias interessantes. No livro The Ultimate Guide to Science Fiction (1990), de David Pringle, o verbete dedicado ao livro dá duas de quatro estrelas possíveis, e ele é apresentado como uma complexa “space-and-time opera”, fazendo referência às space-operas que foram muito comuns nos primórdios do gênero, mas na verdade o livro tem pouca relação com o estilo. Também diz que a obra é liberal, antirracista e cheia de respeito pela diversidade da vida, posturas que acompanharam toda a obra do autor.
Os anos 1960 marcaram o surgimento de dois seriados de televisão bastante populares: Doutor Who, que surgiu em 1963, em produção inglesa da BBC; e O Túnel do Tempo, que surgiu em 1966, em produção norte-americana da Fox. Doctor Who foi, ou é, o seriado com a mais longa duração na história da televisão. A primeira etapa teve 26 temporadas, de 1963 até 1989; em 1996, um especial da TV apresentou o “oitavo doutor”, com Paul McGann no papel do doutor; posteriormente, em 2005, o seriado foi retomado, estendendo-se até hoje.
A aparência externa do TARDIS (BBC).
Para quem ainda não sabe, o Doutor em questão é um Senhor do Tempo, um extraterrestre do planeta Gallifrey, que se movimenta pelo tempo e espaço com sua nave chamada TARDIS (Time and Relative Dimension in Space), talvez uma das máquinas do tempo/espaçonave mais conhecidas do universo da ficção científica: é o que os ingleses chamam de “police box”, uma cabine telefônica utilizada por policiais ou por pessoas que queiram entrar em contato com a polícia. Só que a do doutor é beeem maior por dentro.
Inicialmente, a ideia era juntar as aventuras com conhecimentos históricos reais, uma vez que a série era dirigida ao público jovem. Mas em seguida o escritor Terry Nation surgiu com o conceito dos daleks, seres do planeta Skaro que sofreram uma mutação provocada pelo cientista Davros, que colocou seus corpos dentro de armaduras mecânicas para que pudessem se movimentar melhor; os daleks acabaram se tornando os mais antigos e constantes inimigos do doutor.
A ideia de “trocar” de doutores, utilizando diferentes atores ao longo do tempo – já estão no décimo segundo – surgiu quando o primeiro doutor, William Hartnell, que interpretou o papel de 1963 a 1966, ficou doente e não pode mais continuar no programa. Assim, os novos doutores passaram a ser apresentados como tendo passado por um processo de regeneração.
Por alguma razão, o seriado não foi apresentado no Brasil, pelo menos em suas versões iniciais, ao contrário dos seriados ingleses produzidos pela ITC – como Thunderbirds e todos os demais com os bonecos, e também O Prisioneiro, um dos seriados mais famosos da ficção científica; ou O Santo, com Roger Moore; e tantos outros.
As primeiras aparições do doutor por aqui foram com os filmes produzidos em 1965 e 1966: A Guerra dos Daleks (Dr. Who and the Daleks) e Ano 2150: A Invasão dos Daleks (Daleks – Invasion Earth: 2150 AD). William Hartnell, o primeiro Doutor, que ainda interpretava o personagem na época, não foi escolhido para atuar no cinema.
A Guerra dos Daleks (AARU Productions/ Amicus Productions).
Os produtores preferiram chamar um grande nome dos filmes de terror e ficção, Peter Cushing. Aqui, ele e suas duas netas (Jennie Linden e Roberta Tovey) são transportados para o próprio planeta Skaro, no futuro, que enfrenta uma guerra de nêutrons entre os daleks e os thals.
Na sequência, o Doutor e suas netas (Roberta Tovey e Jill Curzon) vão parar na Terra do futuro, com os daleks dominando o planeta e planejando transformá-lo em uma gigantesca nave espacial, mais uma vez, o Doutor salva a humanidade.
No geral, os filmes não foram muito bem recebidos pela crítica e não chegaram a ser grande sucesso de público.
Ano 2150: A Invasão dos Daleks (AARU Productions/ British Lion Films).
Quando o videocassete chegou ao Brasil, a distribuidora VTI lançou Os Robôs da Morte (Dr. Who and the Robots of Death, 1977), compilação dos quatro episódios que compõem o quinto seriado da 14 temporada, com Tom Baker como o quarto Doutor (que ele interpretou de 1974 a 1981). Ele chega com o TARDIS a um planeta onde está sendo realizada uma grande operação de prospecção mineral utilizando robôs, e mortes misteriosas começam a ocorrer.
Como já dissemos, o oitavo doutor, Paul McGann, foi apresentado no especial para a TV Doctor Who – O Senhor do Tempo (Doctor Who, 1996), uma produção conjunta entre Inglaterra e EUA, com a BBC, Universal Television e Fox Network.
Se Doutor Who não ficou conhecido do público brasileiro nos anos 1960, o mesmo não se pode dizer do seriado Túnel do Tempo (The Time Tunnel, 1966-1967). O seriado foi criado e produzido por Irwin Allen, e apesar de ter sido cancelado precocemente pela rede ABC, no momento em que tinha boa audiência, acabou se tornando um cult das séries de ficção científica.
A máquina do tempo em si foi uma das grandes sacadas da série (ABC/ 20th Century Fox Television/ Irwin Allen Productions/ Kent Productions).
Irwin Allen foi um dos principais nomes do gênero na televisão dos anos 1960. Foram dele as séries Viagem ao Fundo do Mar (Voyage to the Bottom of the Sea, 1964-1968) – cuidado Kowalski – Perdidos no Espaço (Lost in Space, 1965-1968) e Terra de Gigantes (Land of the Giants, 1968-1970).
Uma máquina do tempo gigantesca é construída num complexo subterrâneo, nos EUA, no projeto chamado Tic-Toc – ou, em português, Tic-Tac – empregando milhares de pessoas e a um custo altíssimo. No momento em que a história inicia, já se vão dez anos de pesquisas e o projeto está ameaçado de ser cortado devido à investigação de um senador, segundo o qual muito dinheiro já foi gasto para nada.
Os cientistas responsáveis pelo projeto são o Dr. Anthony Newman (James Darren), Dr. Douglas Phillips (Robert Colbert) e a Dra. Ann MacGregor (Lee Meriwether, que ficou conhecida como a Mulher-Gato da série Batman, também em 1966). O general Heywood Kirk (Whit Bissel) é um dos diretores responsáveis pelo projeto. Com a pressão do senador para que uma viagem com humanos seja realizada logo, Tony resolve ir por conta própria, e logo Doug também vai atrás dele.
Doug e Tony são observados pelo pessoal no laboratório.
Daí para a frente, inúmeras viagens são realizadas por eles, mas muitas coisas dão errado e eles não conseguem retornar ao seu próprio tempo. Com o cancelamento da série, a história ficou sem um final apropriado.
Um dos problemas da trama é que os dois viajantes sempre apareciam em momentos importantes da história, e nenhuma explicação era fornecida para tal. Nos livros derivados da série o escritor Murray Leinster trabalhou esse aspecto. Leinster, pseudônimo de William Fitzgerald Jenkins (1896-1975), foi um dos mais prolíficos escritores de ficção científica, produzindo também roteiros para a televisão, cinema e rádio. O primeiro livro baseado na série foi O Túnel do Tempo (The Time Tunnel). O segundo livro foi Timeslip: Time Tunnel Adventure #2.
Existe alguma confusão com os livros, uma vez que Murray Leinster já havia publicado um livro chamado Time Tunnel, em 1964, sem qualquer relação com a série. Seja como for, no livro publicado em Portugal, os cientistas carregam às costas um dispositivo que complementa a função do túnel existente na sede do projeto. O autor também considera que certos eventos no tempo formam uma espécie de nó temporal, de modo que os viajantes são atraídos para os momentos especiais da história.
A década de 1960 ainda viu o famoso cineasta francês Alain Resnais experimentar com o tema das viagens no tempo, em Eu Te Amo, Eu Te Amo (Je T’Aime, Je T’Aime, 1967), com Claude Rich como o sujeito que é convencido a participar de um experimento de viagem no tempo, logo após deixar um hospital devido a uma tentativa de suicídio. Os cientistas já tinham experimentado com ratos, que retornavam do passado após um minuto, mas Claude experimenta diversos momentos de seu passado, de forma fragmentada, inclusive os eventos trágicos que levaram à sua tentativa de suicídio.
Os cientistas fazendo os ajustes finais na estranha máquina do tempo, em Eu Te Amo, Eu Te Amo (Les Productions Fox Europa/ Parc Film).
A máquina do tempo é, talvez, a mais estranha do cinema. Phil Hardy (em The Encyclopedia of Science Fiction Movies) diz que ela parece uma pera gigante; Baird Searles (em Films of Science Fiction and Fantasy) diz que a máquina é um aparelho orgânico e que “sua semelhança com um útero dificilmente é coincidente”.
O filme sempre despertou inúmeras interpretações. Phil Hardy diz que “Repetição (como no título do filme), tempo e memória tem sido temas constantes nos filmes de Resnais de Hiroshima, Meu Amor (1958) para a frente. No entanto, Resnais raramente precisou do suporte estrutural da ficção científica. Em O Ano Passado em Marienbad (1961), por exemplo, ele simplesmente contrasta as memórias do personagem central com outras versões do passado e do presente, recusando-se a indicar qual das várias versões da ‘realidade’ é a ‘certa’. Mas aqui, como se tentando desafiar visões racionais do Tempo cuidando delas de frente, Resnais explicitamente inclui a parafernália tecnológica dos filmes de ficção científica. (...) O resultado é um filme complexo, ainda que surpreendentemente acessível”.
Claude Rich, acomodado em seu "útero" do tempo.
Philip Strick (em Science Fiction Movies, 1976), diz que o filme conta praticamente a mesma história de La Jetée (1962), dirigido por Chris Marker – que também trabalho como editor com Alain Resnais – porém sem a guerra nuclear. Segundo Strick, é fácil interpretar o filme como o tipo de história na qual os momentos importantes na vida de uma pessoa passam à sua frente no momento da morte. E, segundo ele, também há espaço para argumentar que o relacionamento entre Claude e a garota – que levou à sua tentativa de suicídio – poderia ser apresentado sem os ornamentos da ficção científica. No entanto, segundo Strick, os cientistas providenciam o contexto necessário para a história ao tomarem conta da existência de Claude, como se soubessem melhor do que ele o que fazer com ela. E Claude sabe que está vivendo as situações pela segunda vez, assim como sabe que continuará sendo incapaz de mudar o curso dos acontecimentos.
OUTRAS HISTÓRIAS COM MÁQUINAS DO TEMPO
THE TECHNICOLOR TIME MACHINE
Harry Harrison.
1967
(Doubleday).
Harry Harrison (1925-2012) é um dos mais importantes escritores da ficção científica, tendo produzido obras como À Beira do Fim (Make Room, Make Room), que originou o filme No Mundo de 2020, e A Oeste do Eden (West of Eden). Alguns de seus livros são famosos pela mistura de ficção científica e humor, até mesmo com críticas mordazes contra os clichês do gênero, como fez nos excelentes O Rato de Aço Inoxidável (1961) e Bill, O Herói Galáctico (1965).
The Technicolor Time Machine segue nessa linha, apresentando uma companhia produtora de cinema dos EUA que está à beira da falência, e um diretor medíocre, que tomam posse de uma máquina do tempo e resolvem voltar ao passado, mais exatamente ao século 11, e filmar uma história épica com vikings reais.
TIME’S LAST GIFT
Philip José Farmer.
1972
(Titan Books).
O livro é apresentado como sendo o primeiro da série conhecida como Khokarsa, que é o nome de um império imaginário na África. Mas também está relacionado ao conceito desenvolvido pelo autor, conhecido como “Wold Newton Family”, imaginado a partir de um acontecimento real: em 1795, um meteorito caiu na vila de Wold Newton, em Yorkshire, Inglaterra. A partir desse evento real, Farmer imaginou que o meteorito era radioativo e causou mutações genéticas nos passageiros de uma carruagem que passava próximo ao local. Dessa forma, os descendentes das pessoas que estavam nessa carruagem começaram a apresentar algumas características super-humanas. Entre esses descendentes, Farmer listou personagens clássicos como Doc Savage, Fu Manchu, Tarzan, James Bond, Sherlock Holmes, professor Moriarty e muitos mais, e eles aparecem em vários livros do autor.
Aqui, várias pessoas do ano 2070 embarcam numa “nave do tempo” e viajam para o ano 12.000 a.C., entre eles John Gribardsun, que também é identificado como o Tarzan, de Edgar Rice Burroughs, um viajante do tempo imortal, que surge em diversas histórias do autor.
O LIVRO DO JUÍZO FINAL (Doomsday Book)
Connie Willis.
1992
Primeiro de uma série, o livro ganhou os prêmios Hugo e Nebula, e apresenta um futuro próximo no qual historiadores usam uma máquina do tempo para visitar o passado como parte de seus estudos de observação dos eventos ao vivo. No entanto, a máquina do tempo não permite que alguns tempos e locais específicos sejam visitados, de forma que o passado não possa ser alterado e os paradoxos sejam evitados. As autoridades também proíbem viagens a períodos considerados extremamente perigosos.
Na sequência da série foram publicados: To Say Nothing of the Dog (1998); Blackout/ All Clear (2010).
PRIMER
EUA
2004
Direção de Shane Carruth.
Praticamente o filme de um homem só, Shane Carruth, também responsável pela produção, roteiro e música, além de interpretar o papel principal. Uma produção independente de cerca de 7 mil dólares, e que se tornou um dos filmes mais comentados na época, vencendo o prêmio do júri no Festival de Sundance – conhecido por sua abertura aos trabalhos experimentais. Dizem que existem pelo menos 10 linhas narrativas diferentes no filme, entrelaçadas, e os diálogos certamente não foram elaborados para facilitar a vida de quem está assistindo.
Shane Carruth (à esquerda) e David Sullivan, os cientistas prestes a entrar em sua máquina do tempo, em Primer (ERBP).
Tudo começa com quatro amigos desenvolvendo seu próprio projeto tecnológico – que não sabemos exatamente qual é – por conta própria, na garagem de um deles. Dois deles resolvem levar o projeto adiante sozinhos e, acidentalmente, descobrem que o que eles construíram é capaz de realizar viagens no tempo. E a partir daí, não é mais possível entender o que está acontecendo. Eles resolvem construir câmaras de viagem no tempo para eles, e começam a deslocar-se no tempo, sempre por algumas horas, vendo seus duplos em outros momentos, tentando ganhar dinheiro com aplicação na Bolsa e envolvendo-se em alterações da realidade. Talvez, a intenção de Carruth tenha sido justamente a de mostrar que as viagens no tempo, com seus possíveis e inimagináveis paradoxos, iriam tornar a realidade incompreensível para quem as realizasse. Nesse sentido, o filme consegue criar um clima opressivo, perturbador, ainda que seja virtualmente impossível entender o que está sendo apresentado na tela ou em que tempo as ações estão ocorrendo. Ao final, um dos personagens surge num imenso galpão, instruindo trabalhadores, supostamente para construir uma máquina ainda maior.
CRIMES TEMPORAIS (Los Cronocrímenes)
Espanha
2007
Direção de Nacho Vigalondo.
(Karbo Vantas Entertainment).
Outro filme envolvendo inúmeras viagens no tempo e vários encontros do personagem com ele mesmo. Héctor (Karra Elejalde) é atacado por um homem com bandagens no rosto e esfaqueado no braço. Ele fala com um cientista por meio de um rádio, e este manda que ele vá até o local onde se encontra e se esconda do homem com o rosto coberto. O cientista coloca Héctor num aparelho e, quando Héctor sai de lá percebe que viajou no tempo, para cerca de uma hora antes, e os eventos começam a seguir seu curso, com três versões dele mesmo, em tempos diferentes.
THE ACCIDENTAL TIME MACHINE
Joe Haldeman.
2007
(Ace).
Como em Primer, aqui a viagem no tempo também é descoberta por acaso, por Matthew Fuller, um pesquisador do MIT. A máquina que ele inventa por acaso só viaja para o futuro, em intervalos sempre crescentes. Fuller vai pulando para o futuro e sempre encontrando alguns problemas que o obrigam a viajar novamente. Assim, ele chega ao século 23, época em que a sociedade é uma teocracia; posteriormente, avança milhares de anos, chegando à Califórnia formada por uma sociedade apática. Los Angeles é controlada por uma inteligência artificial que quer se juntar a ele e encontrar o final dos tempos para descobrir se ela pode morrer.
O HOMEM DO FUTURO
Brasil
2011
Direção de Cláudio Torres.
(Conspiração Filmes/ Globo Filmes).
Outra máquina do tempo construída por acaso, num raro filme brasileiro de ficção científica, com Wagner Moura como o cientista Zero, trabalhando numa máquina que deverá garantir uma fonte de energia sustentável. Só que, quando vai fazer uma experiência, a máquina acaba abrindo uma passagem para o passado, e ele surge em 1991, exatamente a época em que viveu um evento traumático na faculdade, e que ele jamais esqueceu. Ele tenta reverter os eventos, mas acaba causando alterações dramáticas no futuro.
CAPTAIN Z-RO
EUA
1955/ 1956
(Captain Z-RO Productions/ W.A. Palmer Films Inc.).
A data de 1955 marca o início da transmissão do seriado em todos os EUA, ainda que ele tenha sido apresentado anteriormente na região de São Francisco e Los Angeles, de 1951 a 1953. Inicialmente, as histórias tinham 15 minutos de duração, passando depois para o formato de 30 minutos, em preto e branco.
Criado por Roy Steffens e Friedrich Schiller, trazia o próprio Steffens como o capitão Z-Ro, que inventou uma máquina do tempo que o transportava com seu assistente Jet (Bruce Haynes) para diferentes períodos de nossa história.
O seriado foi produzido para crianças, com intenções educacionais, como aconteceria, anos depois, com Dr. Who, na Inglaterra.
A GAROTA DO FUTURO (The Girl From Tomorrow)
Austrália
1991
(Film Australia/ Nine Network Australia).
Seriado com produção bem cuidada e com bons efeitos e cenários, no Brasil apresentada pela TV Cultura e voltada para público jovem. A maior parte da ação situa-se no ano 2500, época em que se encontram alguns jovens do ano 3000 e de 1990, que conseguem viajar através de uma fenda no tempo graças a uma invenção dos anos 3000. Em 2500, o mundo é praticamente dominado por uma organização, a Globocorp, que protege a Terra de uma devastação nuclear, tendo instalado satélites protetores ao redor do planeta, e iniciando a colonização da Lua. A situação do planeta não é das melhores, com pessoas sendo escravizadas, transformadas em zumbis para realizarem trabalhos perigosos. Os jovens envolvem-se na luta pelo poder de grupos dentro da empresa, alguns com ideias de dominação total e querendo apoderar-se da máquina do tempo.
TERROR FROM THE YEAR 5,000
EUA
1958
Direção de Robert Gurney Jr.
Também conhecido pelo título Cage of Doom, o filme também teve produção e roteiro de Gurney Jr.
O cientista Howard Erling (Frederick Downs) constrói uma máquina do tempo e consegue trazer uma mulher do futuro (Salome Jens), do ano 5.000, época em que a raça humana está agonizante. Só que ela acaba criando uma série de problemas, uma vez que tem a capacidade de hipnotizar pessoas. Seu objetivo é levá-las para o futuro, para revitalizar a raça humana. Não consegue!
(La Jolla Productions).
Alguns citam o filme entre os piores de todos os tempos. O roteiro foi baseado, ainda que não tenha sido creditado, no conto Bottle Baby, de Henry Slesar, publicado na revista Fantastic, em 1957.
Também foi a estreia de Salome Jens no cinema, e ela teria papéis em produções bem mais interessantes e ficaria mais conhecida por sua atuação em Star Trek: Deep Space Nine.
COM HÉRCULES NO OLIMPO (The Three Stooges Meet Hercules)
EUA
1962
(Normandy Productions).
Esse é considerado um dos bons momentos dos Três Patetas (Moe Howard, Larry Fine e Joe De Rita) no cinema. Eles viajam numa máquina no tempo, partindo de Ítaca, em Nova York, para Ítaca, na Grécia, no ano 961 a.C. O inventor da máquina se faz passar por Hércules, até que o verdadeiro Hércules aparece e eles vão parar nas galés. Nem todo mundo gosta do humor do trio, mas para quem é chegado é um prato cheio.
A CIDADE DA NEBLINA VERDE
VIAGEM AO NÚCLEO DO TEMPO (Journey to the Center of Time)
EUA
1967
Direção de David L. Hewitt.
Os cientistas, entediados consigo mesmos (Borealis Enterprises/ Dorad Corporation).
Um filme chatíssimo e mal feito no qual cientistas procuram provar que sua máquina do tempo funciona, antes que os fundos de suas pesquisas sejam cortados. Eles vão para a Terra do futuro, no ano 6.968, e encontram o planeta envolvido numa guerra com extraterrestres. Depois, retornam ao passado e encontram com eles mesmos, percebendo o quanto são chatos e como trabalham mal.
TRAVESSIA PARA O FUTURO (Idaho Transfer)
EUA
1973
Direção de Peter Fonda.
(Kathleen Film Prod. Co./ Pando Company Inc.).
Um raro filme de Peter Fonda, uma espécie de cult dos anos 1970, ainda que não muito bem recebido pela crítica, seguindo a linha ecológica da ficção científica, comentando a destruição do meio ambiente e o consequente extermínio da humanidade. Por acaso, um grupo de cientistas inventa uma máquina do tempo, ao mesmo tempo em que se prevê uma catástrofe global para os próximos anos. Assim, rewsolvem enviar para o futuro um grupo de jovens para reestabelecer a civilização.
OPERAÇÃO CAVALO DE TROIA (Caballo de Troya 1: Jerusalén)
1984
J.J. Benítez.
O jornalista e ufólogo espanhol Juan José Benítez tornou-se famoso com a série Cavalo de Troia, que até aqui conta com nove livros. Inicialmente, foi publicada no Brasil pela Editora Mercuryo. Atualmente, os nove livros podem ser encontrados pela Editora Planeta. Benítez compôs a trama colocando-se como personagem; um oficial da Força Aérea dos EUA entrega a ele um diário no qual narra uma viagem no tempo, realizada por uma operação secreta chamada Cavalo de Troia. O próprio oficial, conhecido inicialmente apenas como Major, agora aposentado, foi o viajante temporal que presenciou as últimas semanas da vida de Jesus Cristo.
Confesso que só consegui ler o primeiro volume da série, que tem as primeiras 60 ou 100 páginas em bom ritmo, mas que a partir de então se arrasta por cerca de 500 páginas em uma espécie de enfadonho manual de medidas e procedimentos, perdendo completamente o ritmo narrativo e o suspense.
A MÁQUINA DO OUTRO MUNDO (My Science Project)
EUA
1985
Direção de Jonathan Betuel.
(Silver Screen Partners II/ Touchstone Pictures).
Um estudante que precisa realizar um projeto de ciências para se formar procura alguma coisa no ferro-velho da Aeronáutica. Encontra um pequeno aparelho alienígena guardado numa sala subterrânea desde 1957, quando caiu na Terra e os militares não sabiam o que fazer com ele. O aparelho causa uma alteração no espaço-tempo, trazendo para a escola seres e pessoas de outras épocas e muitos problemas para o estudante. Uma produção bem cuidada, com bons efeitos e atuação engraçada de Dennis Hopper, que viaja no tempo reencontrando os anos 1960 e seus momentos de hippie.
SEM SEGURANÇA NENHUMA (Safety Not Guaranteed, 2012)
Direção de Colin Trevorrow.
Um filme delicioso sobre uma viagem no tempo que pode ou não ter ocorrido. O ponto de partida é um anúncio colocado na seção de classificados de um jornal, de um sujeito solicitando alguém para viajar no tempo com ele, para o passado, com o detalhe que não garante a segurança.
(FilmDistrict/ Big Beach Films/ Duplass Brothers Productions).
Uma equipe do Seattle Magazine é enviada para averiguar a história, e entre os componentes está Darius Britt (Aubrey Plaza), estagiária na revista, e bem chateada com a vida que está levando. Ela entra em contato com o sujeito que colocou o anúncio, Kenneth Calloway (Mark Duplass), que ela não consegue decifrar se está completamente louco e paranoico. Como preparação para a viagem ele a faz passar por uma série de exercícios físicos, e quanto mais ela fica conhecendo o sujeito, mais passa a gostar dele.
Enfim, a paranoia dele parece ter um fundo de verdade, uma vez que agentes do governo estão observando seus passos. E ele de fato construiu uma máquina, estranhíssima, que ele deixa perto de um lago. E ele consegue fazer com que ela funcione, mas não ficamos sabendo se a viagem dos dois ocorreu ou não.