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4 HISTÓRIAS DE INVESTIGAÇÕES SOBRE FANTASMAS

ESPECIAIS/VE FANTASMAS

autorGilberto Schoereder
publicado porGilberto Schoereder
data12/01/2017
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1

 

A ASSOMBRAÇÃO DA CASA DA COLINA
(The Haunting of Hill House, 1959)
Shirley Jackson

O livro de Shirley Jackson é apontado por muitos críticos e estudiosos do gênero como um dos principais do século 20. Alguns citam o parágrafo inicial do livro como um dos mais primorosos da literatura norte-americana. Em seu livro Dança Macabra (Danse Macabre, 1981), no qual estuda livros e filmes de terror, Stephen King escreveu sobre esse parágrafo: “Penso que, se alguma houver, serão poucas as passagens descritivas em língua inglesa mais apuradas do que esta; é o tipo de calma epifania que todo escritor almeja; palavras que, de alguma maneira, transcendem a palavra, palavras que, combinadas, formam um todo muito maior que a soma das partes”.
O dr. John Montague, investigador do paranormal, convida três pessoas para irem a Hill House, uma casa que se diz ser assombrada, pretendendo definir o que realmente está acontecendo no local; a tímida Eleanor Vance, que viveu anos em reclusão, cuidando de sua mãe; Luke Sanderson, o jovem herdeiro da mansão; e Theodora. Ela e Eleanor foram as únicas que responderam aos convites enviados pelo dr. Montague a pessoas que já tiveram envolvimento com eventos “sobrenaturais”.
No livro já citado, Stephen King diz que “(...) é a Eleanor, em cuja casa caíram pedras quando ela era menina, que o romance está vitalmente relacionado, e é a personagem de Eleanor e a descrição que Shirley Jackson faz dela que elevam A Assombração da Casa da Colina ao ranking dos grandes romances sobrenaturais”. Na verdade, a análise da personalidade de Eleanor apresentada no livro de Stephen King é tão interessante, extensa e minuciosa que merece ser lida (se alguém ainda conseguir encontrar o livro).
A casa tem uma história incrível, tendo sido construída por um puritano chamado Hugh Crain. Sua jovem esposa faleceu poucos instantes antes de ver a casa pela primeira vez. A segunda esposa morreu de uma queda, com causa desconhecida. Ele teve duas filhas que deixaram a casa após a morte da terceira esposa, e a mais velha retorna a Hill House anos depois, em companhia de uma jovem de uma vila próxima que cuida dela. Ou melhor, que aparentemente não cuida, deixando-a sofrer, até que ela morre. A jovem acaba cometendo suicídio, enforcando-se na torre da casa. E os moradores seguintes não tiveram uma boa vida na casa.
Seja como for, a premissa do dr. Montague é que a própria casa é o mal. E um dos pontos altos da história é que nenhum dos personagens realmente encontra fantasmas, formações ectoplásmicas. Como o próprio investigador explica aos seus companheiros, não existe qualquer caso registrado de um fantasma que tenha ferido uma pessoa. Mas quando eles são malignos, eles agem no espírito das pessoas.
A história obviamente se encaixaria perfeitamente em outras definições que apresentamos aqui, como “casas assombradas” ou “enlouquecendo com os fantasmas”.
A escritora Lisa Tutle, escrevendo sobre o livro em Horror: 100 Best Books (1988/92), considerou que, em geral, os contos sobrenaturais são mais bem sucedidos que os romances de horror; ocorre que, para ela, quando o autor está escrevendo sobre coisas em que nós não acreditamos, como vampiros e fantasmas, o leitor concorda em aceitar uma realidade diferente e acreditar nela pela duração do livro. “Essa desejada suspensão da descrença”, escreve Tutle, “permite que a história seja apreciada, mas também bloqueia uma certa intensidade da experiência: de certa forma, nós estamos fingindo que acreditamos e, assim, estamos apenas fingindo estarmos assustados”.
No caso do livro de Shirley Jackson, Tutle diz que ele não exige qualquer “suspensão da descrença”, ou não mais do que seria exigido por qualquer livro realista ou psicológico de sua época. “Ela não postula vampiros, fantasmas ou hierarquia de espíritos malévolos, mas apenas a existência de algo além de nosso mundo material, tangível, e a experiência de tais fenômenos psíquicos foram realmente relatados”. Lisa Tutle ainda escreve que “(...) Jackson invoca terror menos pelo que ela diz do que pelo que ela não diz; por sugestão mais do que por explanação”.
O livro originou dois filmes.

 

DESAFIO AO ALÉM
(The Haunting, 1963)
 

A partir da esquerda, Richard Johnson (Dr. John Markway), Claire Bloom (Theodora), Russ Tamblyn (Luke Sanderson) e Julie Harris (Eleanor Lance), o grupo de pesquisadores reunidos na sala em Desafio ao Além (MGM).

O diretor Rober Wise fez uma adaptação excepcional do romance de Shirley Jackson, seguindo o que foi apresentado no livro, ou seja, jamais mostrando claramente, mas apenas sugerindo, e igualmente centrando a narrativa na personagem Eleanor, com uma interpretação maravilhosa de Julie Harris. Claire Bloom interpreta Theodora, e Russ Tamblyn interpreta Luke. Richard Johnson é o doutor, que teve seu nome alterado para John Markway.
O foco na personagem Eleanor fica bem claro quando ouvimos seus pensamentos o tempo inteiro, com as expressões mutantes de Julie Harris enquanto Eleanor passa de momentos de terror a alegria, suas dúvidas com relação a como se relacionar com os demais companheiros e sobre o que de fato a casa quer que ela faça.

Claire Bloom e Julie Harris, aterrorizadas por algo que só conseguem ouvir.

Não sei se o fato de ter sido filmado em preto e branco ajuda a criar o clima, mas creio que sim, com o trabalho de câmera de David Boulton realçando as sombras, aquilo que não se vê, assim como os efeitos sonoros. Em The Psychotronic Encyclopedia of Film (1983), Michael Weldon escreveu sobre o filme: “Você não vê quaisquer fantasmas, mas paredes pulsantes, sons altos de pancadas, o choro de uma pequena criança e a histeria de Julie Harris deveria fazer você querer deixar uma luz acesa à noite depois de assistir ao que é, indubitavelmente, o mais assustador filme de fantasma já realizado”.

O doutor tenta ajudar Eleanor a superar seus medos, numa das cenas mais legais do filme.

Como no livro é sugerido que Hill House foi construída com os ângulos totalmente errados, Wise conseguiu criar esse efeito com o posicionamento das câmeras e com a iluminação, sem necessidade de efeitos especiais. E ainda tem uma cena apavorante numa escada em espiral. E, de fato, nada parece estar sendo visto de um ângulo normal, costumeiro. É uma beleza de filme, e realmente apavorante.
No Brasil, o filme foi lançado em DVD (Continental) e em Blu-Ray (Warner H.V.), com o título Desafio do Além, mas aparentemente não está mais disponível para venda.

 

A CASA AMALDIÇOADA
(The Haunting, 1999)
 

A equipe de pesquisadores, na versão explícita da história (DreamWorks Pictures).

A segunda versão da história de Shirley Jackson foi dirigida por Jan de Bont, com Liam Neeson, Lili Taylor, Catherine Zeta-Jones e Owen Wilson. Como um sinal inequívoco de que os tempos mudaram, e muito, no cinema de terror, esta aberração é tudo o que o livro e o filme de Robert Wise não são. Ou seja, é totalmente específico, com efeitos especiais que tomam grande parte da narrativa, varrendo para longe todo o clima que a autora pretendeu criar no livro. Em outras palavras, a premissa da história é a mesma, mas o resultado é o oposto.

Lili Taylor sofrendo com os fantasmas. O que antes era sugerido virou efeitos especiais para todo lado.

Os fantasmas são reais, gráficos, todos podem ver, e eles não agem no espírito das pessoas, mas em seus corpos, literalmente ameaçando suas existências. Pode causar calafrios num público que, nos últimos tempos, acostumou-se com os efeitos especiais sensacionais e com sustos imediatos, mas sequer chega perto de provocar o incômodo, o desconforto e o medo intenso e constante causados pelo livro e pelo filme original.
Uma perda de tempo e dinheiro.

 

 

2

 

A CASA DA NOITE ETERNA
(The Legend of Hell House, 1973)
 

Cena de apresentação da casa maldita em A Casa da Noite Eterna (Academy Pictures Corp./ 20th Century-Fox).

Apesar do filme de 1973, dirigido por John Hough, ser baseado no livro Hell House – A Casa Infernal (Hell House, 1971), de Richard Matheson, este é um caso (raro) de uma produção para o cinema que supera o original literário. E mais raro ainda por se tratar de um escritor consagrado nos gêneros terror e ficção científica – Matheson é o autor de Eu Sou a Lenda, O Incrível Homem que Encolheu e Amor Além da Vida, além de centenas de contos importantes e roteiros para o famoso seriado Além da Imaginação.

Os quatro investigadores, um tanto assustados após um "incidente" com a mesa.

A história também apresenta uma “casa maldita” visitada por um grupo de pessoas com o objetivo de pesquisar os terríveis incidentes ocorridos ali. O grupo é composto pelo dr. Barrett (Clive Revill), sua esposa Ann Barrett (Gayle Hunnicutt), a médium Florence Tanner (Pamela Franklin) e o médium Benjamin Fisher (Roddy McDowall). O dr. Barrett é um físico contratado por um milionário prestes a morrer para realizar uma pesquisa sobre a sobrevivência após a morte, e o local escolhido é a mansão Belasco, que tem uma história de investigações anteriores com resultados trágicos. Fisher é o médium que foi o único sobrevivente de uma investigação feita na casa 20 anos antes, mas o físico não acredita que as mortes tenham ocorrido devido a alguma atividade sobrenatural, mas que quaisquer fenômenos relacionados ao local têm a ver com energia eletromagnética. Até mesmo por isso ele conseguiu desenvolver um aparelho que não apenas mede essa energia, mas que pode anulá-la; é uma geringonça monstruosa que ele coloca na sala da mansão.

O doutor e sua esposa diante da estranha máquina que pretende acabar com os fantasmas no local.

Apavorado por voltar à casa, Fisher “se fecha” para quaisquer fenômenos, enquanto a médium Florence é quem tem a missão de tentar entrar em contato com qualquer entidade que permaneça no local.

Pamela Franklin, na cena em que a médium tem uma manifestação de ectoplasma.

Diferente de Desafio ao Além, as coisas aqui são bem mais explícitas, ainda que as referências a problemas psíquicos dos personagens também tenham sua participação importante na história. As pessoas são definitivamente afetadas pela casa, seja por fantasmas, seja pela energia eletromagnética, e isso causa alterações em suas personalidades, talvez até mesmo revelando alguns desejos mais profundos de suas mentes.
O clima de tensão sexual, apenas sugerido em Hill House, aqui se torna explícito. O que se supõe que seja o fantasma assombrando a mansão, seu primeiro morador, Emeric Belasco, parece estar fazendo um jogo com os investigadores, às vezes se fazendo passar pelo fantasma de outras pessoas. É assim que ele consegue fazer amor com a médium, no que Michael Weldon (em The Psychotronic Encyclopedia of Film) disse ser a primeira vez que foi apresentada uma cena de sexo com um fantasma no cinema.

A médium recebe a visitinha noturna de seu amante fantasma.

O filme nem sempre foi muito bem recebido pela crítica, mas é efetivo na criação de um clima de suspense e terror, além de ter excelentes interpretações, em particular de Pamela Franklin.
Foi lançado em DVD no Brasil (Vintage Fims), mas é bem difícil de se encontrar hoje em dia.

 

 

 

 

3

 

1408

Conto de Stephen King, também adaptado para o cinema. O conto surgiu originalmente em áudio-livro, na coleção Blood and Smoke, em 1999. Em 2002, foi publicado na coletânea Tudo É Eventual (Everything’s Eventual).
O personagem central, Mike Enslin, é um escritor especializado em livros sobre assombrações, não-ficção. Ele escreveu best-sellers como Dez Noites em Dez Casas Assombradas, Dez Noites em Dez Cemitérios Assombrados e Dez Noites em Dez Castelos Assombrados. E apesar de seu sucesso comercial, ele não acredita realmente em eventos paranormais e sobrenaturais.
E é com essa postura que ele se prepara para mais um livro, Dez Noites em Dez Hotéis Assombrados. O primeiro escolhido foi o Dolphin, em Nova York, que tem um suposto quarto assombrado ou, mais do que isso, amaldiçoado: o quarto 1408. O gerente do hotel conta a ele coisas terríveis que teriam ocorrido no local; tão terríveis que o quarto permanece fechado. São 68 anos de histórias envolvendo 42 mortes, 12 delas por suicídio.
E os problemas de Enslin começam antes mesmo de entrar no quarto. Ele começa a ter visões, ou o que podem ser alucinações, com a porta parecendo estar fora de simetria. E lá dentro as coisas só pioram, com as alucinações surgindo a cada instante, com os objetos se modificando, transformando-se em outras coisas, às vezes aterrorizantes, outras vezes perigosas.
Enslin quase morre ao atear fogo à sua própria roupa, e escapa por pouco, ainda que sua vida posterior tenha mudado para sempre, a ponto de ele não ser mais capaz de dormir com a luz apagada.
No livro Sobre a Escrita (On Writing, 2000. Suma de Letras, 2015), Stephen King utilizou os rascunhos da história para explicar como funciona o seu processo de edição de uma história.
O conto foi adaptado para o cinema.

 

1408
(1408, 2007)
Direção de Mikael Hafstrom.
 

John Cusack, enfrentando as alucinações em 1408 (Dimension Films).

Na versão para o cinema, John Cusack interpreta Mike Enslin, e Samuel L. Jackson o gerente do hotel.
Os eventos estendem-se um pouco mais do que no conto – afinal, o filme tem 104 minutos, ou 114, na versão do diretor – e foram filmados outros três finais possíveis para a história, mas nenhum coincide com a versão original de Stephen King.

John Cusack e Jasmine Jessica Anthony, em 1408.

Seja como for, o filme é bem legal, e foi bem nas bilheterias, recebendo críticas geralmente boas. Não é a melhor adaptação cinematográfica de histórias de Stephen King, mas está bem longe de constar entre as piores.
No Brasil, foi lançado em DVD pela Imagem Filmes.

 

 

4

 

ROSE RED – A CASA ADORMECIDA
(Rose Red, 2002)
Direção de Craig R. Baxley.
 

Os pesquisadores chegam a Rose Red ((ABC/ Warner H.V.).

Minissérie com história e roteiro de Stephen King, a respeito de uma professora de psicologia de uma universidade que lidera um grupo de pesquisadores e médiuns a uma casa em Seattle, conhecida como Rose Red, com o objetivo de obter informações e provas científicas de fenômenos paranormais. A casa tem um longo histórico de casos tidos como assombração, e diz-se que pelo menos 23 pessoas já morreram ou desapareceram em seu interior que, sabe-se lá como, parece que consegue aumentar de tamanho.
Quando estão no local, os eventos começam a ocorrer, fantasmas aparecem e a equipe vai descobrindo alguns dos segredos envolvendo a mansão.
Certamente não é a melhor história de Stephen King, mas a minissérie funciona bem. Talvez a melhor ideia seja a da casa que vai se expandindo internamente, ainda que permaneça igual por fora.