Durante e após a Segunda Guerra Mundial as histórias de FC situadas em ambientes de impérios e outros tipos de governos galácticos continuaram a surgir. Uma das mais conhecidas é a de Theodore R. Cogswell, The Specter General, publicada na revista Astounding Science Fiction em junho de 1952. É o que os norte-americanos chamam de novella, maior do que um conto, menor do que um romance.
Capa de H. R. Van Dongen (1952).
Narrada com humor, a história foi considerada uma das melhores do período e incluída na coletânea The Science Fiction Hall of Fame, Volume Two. Apresenta um império estelar que se desintegrou, com os planetas perdendo sua tecnologia e entrando em guerras. Ainda mantêm a capacidade de viagens espaciais, mas não conseguem reparar ou repor suas naves. Um batalhão de manutenção dos Marines Espaciais Imperiais é enviado a um planeta para estabelecer uma base, mas quando a guerra civil explode entre os planetas, ele é esquecido. No entanto, por 500 anos as diferentes gerações de soldados mantêm sua missão, treinando para reparar espaçonaves que jamais aparecem. Eventualmente, surge um Protetorado Galáctico, tentando manter o poder que o Império possuía.
As federações e governos semelhantes também continuaram a surgir, como no caso do conto All the Way Back, de Michael Shaara, publicado em 1952 na revista Astounding Science Fiction. Mais exatamente, existe uma referência a um antigo império, ao narrar a história de uma raça que, em algum momento do passado, dominou a galáxia de forma violenta. Expulsos, fugiram para a Terra e tornaram-se os ancestrais da humanidade. Quando os humanos conseguem obter o voo espacial e entram em contato com outras raças, 30 mil anos depois dos eventos iniciais, uma Federação Galáctica os destrói preventivamente, para evitar que a história se repita.
Pattern for Conquest (Capa de William Timmins, 1946).
Ainda antes disso, em 1946, a história de George O. Smith, Pattern for Conquest, publicado em três partes na revista Astounding Science Fiction, mostrava uma federação terráquea combatendo outra federação de alienígenas semelhantes a gatos. Posteriormente, as duas unem-se para combater uma raça que ameaça todas as demais raças da galáxia.
No filme O Dia em que a Terra Parou (The Day the Earth Stood Still, 1951), o alienígena Klaatu também refere-se a uma federação de planetas que observa atentamente as atividades nucleares na Terra. O filme ficou muito conhecido, mas o conceito de uma federação galáctica não foi particularmente desenvolvido.
Brian Stableford diz que o escritor A.E. Van Vogt também era um apreciador dos impérios, galácticos ou não, e escreveu algumas histórias nesse contexto, como no conto Recruiting Station, publicado originalmente na revista Astounding Science Fiction, em 1942. Em 1950, a história foi adaptada e publicada com o título Masters of Time e, em 1960, com o título A Última Fortaleza Terrestre (Earth’s Last Fortress), e envolve uma luta entre os Planetarianos e os Gloriosos, ameaçando não apenas toda a galáxia, mas o próprio tempo, manipulado pelos envolvidos.
Stableford diz que, assim como Asimov, Van Vogt tomou emprestada a história do Império Romano, provavelmente por meio do livro Eu, Claudius, Imperador (I Claudius, 1934), de Robert Graves, em particular nas histórias com o personagem Clane, Império do Átomo (Empire of the Atom, 1957) e The Wizard of Linn (1962. Originalmente publicado em três partes na revista Astounding Science Fiction, em 1950). Como era comum com o autor, os dois livros são o que se chama de fix-up, ou seja, foram compostos a partir de vários contos, todos publicados na revista Astounding Science Fiction entre 1946 e 1950.
Abaixo: Recruiting Station, na Astounding Science Fiction (capa de Hubert Rogers, 1942); Masters of Time (capa de Edd Cartier. Fantasy Press, 1950); Earth's Last Fortress (capa de Ed Emshwiller. Ace Books, 1960).
Abaixo: Empire of the Atom (capa de Harold W. McCauley. Shasta, 1957); The Wizard of Linn, na Astounding (capa de Hubert Rogers, 1950); The Wizard of Linn, na edição em livro (capa de Ed Valigursky. Ace Books, 1962).
Capa de Richard Powers (Berkley Books, 1955).
Outro exemplo de utilização de governos galácticos na obra de A.E. Van Vogt é Missão nas Estrelas (Mission to the Stars, 1952. Também com o título The Mixed Men), outro trabalho fix-up, a partir de histórias publicadas na revista Astounding Science Fiction entre 1943 e 1945. Na história, os governos surgem com nomes como Cinquenta Sóis, Grande União Galáctica, além de um império terrestre.
Van Vogt também cita impérios que estão no centro das intrincadas e, muitas vezes, quase incompreensíveis ações de O Mundo de Zero-A (The World of Null-A, 1948), originalmente publicado em três partes na revista Astounding Science Fiction (1945). A história teve sequência com Os Jogadores de Zero-A (The Players of Null-A, 1956. Também com o titulo The Paws of Null-A), que também foi publicado anteriormente em quatro partes, em 1948 e 1949, na revista Astounding Science Fiction, com o título The Players of A. Van Vogt ainda escreveria uma sequência tardia à história com Null-A Três (Null-A Three, 1985), na qual o personagem central vai parar em uma parte do universo no qual um império gigantesco, governado por um jovem, trava uma batalha contra um inimigo não humano de outro universo. No geral, é uma das tramas mais complicadas da ficção científica.
Abaixo: The Mixed Men (capa de Ric Binkley. Gnome Press, 1952); The World of A (capa de Leo Manso. Simon & Schuster, 1948); World of A, na Astounding (capa de William Timmins, 1945); The Players of A, na Astounding (capa de Hubert Rogers, outubro de 1948); The Pawns of Null-A (capa de Ed Valigursky. Ace Books, 1956); Null-A Three (capa de Bruce Pennington. Sphere, 1985).
Assim como fizeram Isaac Asimov e Robert A. Heinlein com histórias que se enquadravam em uma proposta “história do futuro”, também Poul Anderson elaborou uma série de histórias no que foi chamado de Technic History, abordando tanto um período futuro governado por um império, como o período posterior, quando o império começa a ser ameaçado. Brian Stableford e David Langford dizem que seu conceito de um império galáctico foi aceito naturalmente porque Asimov preparou o caminho, mas que foi Anderson quem descreveu a era após a queda do império como a Longa Noite.
The Man Who Counts, na Astounding (capa de H. R. Van Dongen, 1958).
Foram dezenas de histórias cuja ordem cronológica ainda levanta dúvidas entre os críticos. Alguns citam duas sequências de histórias, outros três. De qualquer forma, em The Science Fiction Encyclopedia, diz-se que a primeira série está centrada no personagem Nicholas van Rijn, um príncipe mercante da Liga Polosotécnica (Polesotechnic League), que é um grupo de mercadores interestelares realizando negócios com planetas dispersos pela galáxia, seguindo o princípio conhecido como laissez-faire, um sistema econômico que é uma versão extrema do capitalismo, com os negócios sendo realizados sem a participação do estado e sem qualquer tipo de interferência ou regulamentação. Brian Stableford disse que “Anderson foi amplamente criticado pelas implicações conservadoras que são possíveis de extrair (ainda que com alguma dificuldade) de histórias cujas causas filosóficas ele modestamente minimiza”.
A segunda série inicia 300 anos mais tarde, após a primeira expansão do Império Terrano que, tornando-se decadente e corrupto, começa a ser ameaçado por outros impérios. Um dos personagens centrais das histórias dessa série é Dominic Flandry, um agente terrano que, segundo Stableford, apesar de ser sofisticado e pessimista, gradualmente tornou-se um personagem maior, com Anderson ampliando sua história.
Abaixo: Satan's World, em Analog (capa de Chesley Bonestell, 1968); Satan's World, em livro (capa de Bruce Pennington. Corgi Books / Transworld Publishers, 1973); Ensign Flandry (capa de Michael Whelan. Ace Books, 1979); Mundos Rebeldes (The Rebel Worlds, 1969. Edição da Panorama. Capa de John Schoenherr, variação da capa do livro Mission of Gravity, de Hal Clement).
São dezenas de histórias publicadas, e uma possível lista cronológica foi apresentada em The Science Fiction Encyclopedia: Wings of Victory (1972); Margin of Profit (1956); Guerra dos Homens Alados (War of the Wing Men, 1958. Também com o título The Man Who Counts); O Viajante das Estrelas (Trader to the Stars, 1964), com as histórias Esconderijo (Hidding Place, 1961), Território (Territory, 1963) e A Chave Mestra (The Master Key, 1964); Birthright (1970; variação, Esau); How to be Ethnic in One Easy Lesson (1973); O Sol Invisível (The Trouble Twisters, 1966; com as histórias The Three-Cornered Wheel [1963], A Sun Invisible [1966] e The Trouble Twisters [1965. Também com o título Trader Team]); The Season of Forgiveness (1973); Day of Burning (1967; variação de Supernova, 1967); O Mundo de Satanás (Satan’s World, 1969. Originalmente em Analog, 1968); A Little Knowledge (1971); The Problem of Pain (1973); Lodestar (1973); Mirkheim (1977); Wingless on Avalon (1973); Rescue on Avalon (1973); The Star Plunderer (1952); Sargasso of Lost Starships (1952); Espião Interestelar (Ensign Flandry, 1966); Outpost of Empire (1967); A Circus of Hells (1970); Mundos Rebeldes (The Rebel Worlds, 1969. Variação como Commander Flandry, 1978); A Stone in Heaven (1979); The Game of Empire (1985); The Day of Their Return (1973); The People of the Wind (1973, originalmente em Analog); Agent of the Terran Empire (1965), com as histórias Tiger by the Tail (1951), The Warriors From Nowhere (1954), Honorable Enemies (1951) e Hunter of the Sky Cave (também com os títulos A Handful of Stars e Essas Estrelas São Nossas [We Claim These Stars], 1959); Flandry of Terra, incluindo as histórias The Game of Glory (1958), O Planeta Neutral (Mayday Orbit, 1961. Também com o título A Message in Secret, 1959); The Plague of Masters (também com os títulos A Plague os Masters e Earthman, Go Home, 1960); A Knight of Ghosts and Shadows (1974); A Stone in Heaven (1979); A Tragedy of Errors (1968); Let the Spacemen Beware (1963; em 1960 publicado em Fantastic Universe como A Twelvemonth and a Day; e como The Night Face, em 1978); The Sharing of Flesh (1968; Prêmio Hugo de 1969 por melhor novelette); The Longest Voyage (1960; Prêmio Hugo de 1961 por melhor conto); Starfog (1967).
Abaixo: We Claim These Stars (capa de Ed Valigursky. Ace Books, 1959); We Claim These Stars (capa de Frank Kelly Freas. Ace Books, 1968); Mayday Orbit (capa de Ed Valigursky. Ace Books, 1961); A Message in Secret, na revista Fantastic Science Fiction Stories (capa de Ed Valigursky, 1959).
A Stone in Heaven (capa de Michael Whelan. Ace Books, 1979); The Longest Voyage, em Analog (capa de John Schoenherr, 1960).
Sandra Miesel, uma fã de ficção científica e fantasia que se tornou uma das maiores especialistas da obra de Poul Anderson, elaborou uma série de textos a respeito da cronologia interna das obras e da organização e história do império imaginado pelo escritor, incluindo ensaios publicados em edições de livros de Poul Anderson. Ela diz que o Império elaborado por ele prometia e entregava estabilidade, de tal forma que muitas regiões e sistemas uniam-se de boa vontade com a Terra para obter sua proteção. As regras impostas pelo Império eram suaves e valiam a pena pela segurança contra ataques, transporte e pela facilidade de comunicações. O Império Terrano cobrava taxas pequenas para manter seus serviços militares e civis, geralmente deixando que os planetas membros cuidassem de seus problemas internos.
Por essa exposição, não se vê muito de uma força imperial “do mal”, como geralmente se imagina, ainda que alguns planetas tenham sido anexados à força. Assim, o Império cresceu até “abranger uma esfera com 400 anos-luz de diâmetro, englobando quatro milhões de estrelas e cem mil planetas habitados”.
Também é um império bem menor do que aquele imaginado por Isaac Asimov em Fundação, que abrangia cerca de 25 milhões de planetas.
Spartan Planet (capa de John Berkey. Dell, 1969).
Brian Stableford e David Langford dizem que, além de Poul Anderson, vários escritores do pós-Segunda Guerra Mundial utilizaram o conceito de uma civilização galáctica de forma consistente e elaborada. No entanto, poucos preocuparam-se em elaborar uma estrutura sociopolítica da comunidade galáctica, geralmente deixando a comunidade em um estado de desorganização ou de harmonia nebulosa.
Missão de Vingança e O Espaço Exterior (edições da Argonauta. Capas de A. Pedro).
Eles também afirmam que, nas histórias pós-Guerra, ficou mais ou menos determinado que qualquer federação galáctica teria uma fronteira relativamente selvagem, muitas vezes chamada “the rim”, ou seja, a margem ou orla. Segundo eles, o termo foi popularizado na série de histórias de A. Bertram Chandler conhecida como Rim Worlds, apresentando o equivalente galáctico das histórias de faroeste.
A série de A. Bertram Chandler inclui dezenas de histórias escritas a partir de 1958, com Gift Horse, publicada na revista If. Posteriormente, a série foi acrescida com as aventuras do personagem John Grimes, do Serviço de Exploração Espacial da Federação e, depois, um cidadão da Confederação dos Mundos da Orla. O autor foi pouco publicado em português, especialmente com três histórias da série: O Planeta Esparta (Spartan Planet, 1968), Missão de Vingança (The Road to the Rim, 1967. Em Portugal, pela Argonauta nº 407 [1991]) e O Espaço Exterior (The Rim of Space, 1958. Em Portugal, pela Argonauta nº 519 [2000]).
The Star King, na revista Galaxy (capa de Ed Emshwiller, 1963).
Outra série que se destaca é a dos Príncipes Demônios (Demon Princes), de Jack Vance, com histórias situadas no Oikumene, um termo grego que significa o mundo conhecido ou habitável, ou Ecúmeno, em português. Na série de cinco livros, o Oikumene é uma confederação dos planetas civilizados na galáxia, o que inclui a Terra. Nesse universo também existe a fronteira desconhecida ou selvagem, chamada The Beyond, o Além, com alguns mundos com pouca civilização e não sujeitos às leis da confederação. E, apesar de cada planeta ter sua própria força policial, as ações são coordenadas pelo IPCC (Interworld Police Coordinating Company).
Os livros da série são: Star King – A Saga dos Príncipes Demônios (The Star King, 1964); A Máquina Assassina (The Killing Machine, 1964); O Palácio do Amor (The Palace of Love, 1967. Francisco Alves Editora); The Face (1979); The Book of Dreams (1981).
Abaixo: O Palácio do Amor; Star King (capa de Chris Foss. Grafton, 1988); The Killing Machine (capa de Richard Powers. Berkley Medallion, 1964); The Palace of Love (capa de Richard Powers. Berkley Medallion, 1967); The Face (capa de Gino D'Achille. DAW Books, 1979); The Book of Dreams (capa de Ken Kelly. DAW Books, 1981).
Stableford e Langford também afirmaram que qualquer lista das histórias pós-Segunda Guerra Mundial utilizando a estrutura de um império galáctico seria muito seletiva, mas que existem histórias notáveis que realmente lidam com questões relacionadas à comunidade mais do que com mundos específicos dessa comunidade. E, é claro, a denominação “império” muitas vezes é utilizada nesses casos apenas como uma referência de governo galáctico.
Way Station (capa de Ronald Fratell. Doubleday, 1963).
No livro Estação de Trânsito (Way Station, 1963), de Clifford D. Simak, uma das “histórias notáveis” que eles citam como exemplo, o sentido de uma comunidade galáctica é evidente, mas nada indica tratar-se de um império. O livro é, certamente, um dos melhores de Simak, e vencedor do Prêmio Hugo de 1964 (originalmente publicado como Here Gather the Stars, em Galaxy Magazine).
Way Station (capa de Richard Powers. Macfadden Books, 1964).
O personagem central é Enoch Wallace, um veterano na Guerra Civil Norte-Americana, e que está com 124 anos, mas com aparência de 30, morando em uma casa que também não envelhece. Enoch foi escolhido por um ser alienígena para operar a estação de trânsito, um ponto de parada de viajantes intergalácticos que, de tempos em tempos, materializam-se em sua casa, a caminho de outro ponto da galáxia. As operações são geridas por uma Central Galáctica.
Way Station (capa de Barclay Shaw. Collier / Macmillan, 1993).
Esse é um livro um tanto diferente de outras histórias de Clifford D. Simak, com uma narração mais lenta, sem uma frequência frenética de eventos, arrastando-se pelo tempo como a longa vida de Enoch, um personagem que não faz nada com pressa. E a história ainda envolve a existência de um talismã que pode ser um elemento vital para a manutenção da harmonia no universo. E, aí sim, voltamos aos elementos mais utilizados na literatura de Simak, a união de ciência e tecnologia com magia, ou pelo menos com algo que se aproxima da magia, uma força comum que permeia o universo.
O conceito, como se sabe, seria utilizado posteriormente na série de filmes Guerra nas Estrelas, a partir de 1977, com a Força sendo apresentada como um manancial de poder que está em toda a parte. Não por acaso, Guerra nas Estrelas surgiu, na época e até hoje, como a mostra mais clara da dualidade entre Império – o representante das forças do Mal – e Federação, no caso, com o nome de República Galáctica, representando as forças do Bem e a boa utilização da Força.
Entre outros exemplos da utilização do ambiente imperial galáctico estão o excelente Estrela Imperial (Empire Star, 1966), de Samuel R. Delany, e The Ring of Ritornel (1968), de Charles L. Harness, livro que, segundo David Pringle, apesar de ser um tanto antiquado, ainda é uma história impressionante sobre um império galáctico.