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Viagens no Tempo no Cinema e na TV

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autorGilberto Schoereder
publicado porGilberto Schoereder
data01/03/1998
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Dos livros, as viagens no tempo conquistaram a cinema e as séries de TV.

Viagens no Tempo no Cinema e na TV

As máquinas e alterações do tempo estão de volta. Agora nas versões para tela grande e pequena.

Gilberto Schoereder

Enquanto a literatura de FC já dava os primeiros passos nas viagens no tempo ainda no século 19, no cinema o tema demorou um pouco mais para engrenar. As primeiras viagens nas telas estão mais para a fantasia leve, como a adaptação da história de Mark Twain, Um Ianque na Corte do Rei Arthur (A Connecticut Yankee in King Arthur's Court; uma versão muda de 1921, e outras duas em 1931 e 1948), ou Romance Antigo (Berkeley Square, 1933), baseado em romance de Henry James sobre jovem que se desloca para o século 18, onde se apaixona.
Em 1944, um filme inglês chamado Time Flies, ao que se sabe inédito no Brasil, apresentava um cientista construindo uma máquina do tempo e viajando à época Elizabetana, onde encontrava Shakespeare. Mas nada é levado a sério.
A primeira aventura já com cara de FC talvez tenha sido Brick Bradford (1947), um seriado em 15 capítulos, baseado nas HQ criadas por William Ritt e Clarence Gray em 1933. Bradford tinha um aparelho chamado cronosfera com o qual conseguia viajar para outros planetas e no tempo, resolvendo os mais variados problemas.

Kane Richmond, como Brick Bradford, saindo de sua cronosfera com Linda Johnson.

Apesar da atração que as viagens no tempo exercem, sem falar nas imensas possibilidades para se compor histórias, a próxima viagem só iria ocorrer em 1956, em Vinte Milhões de Léguas a Marte (World Without End). O título em português é qualquer coisa, já que a viagem a Marte jamais ocorre. Uma expedição com quatro astronautas atravessa uma torção no tempo quando se dirige ao planeta vermelho. Vão parar na Terra mesmo, só que em 2508, quando mutantes vivem na superfície radioativa devido à guerra nuclear, e os humanos não radioativos vivem nos subterrâneos. Interessante no filme são as roupas das mulheres, desenhadas por Alberto Vargas, o famoso ilustrador das pin-ups da Playboy.

Essa ideia de romper a barreira do tempo colou e, em 1960, repetiram a dose em Além da Barreira do Tempo (Beyond the Time Barrier), com um piloto de testes surgindo no ano 2042. O planeta já estava arrebentado, camada de ozônio caindo pelas tabelas e a radiação causando mutações, muito em voga na época, assim como sobreviventes vivendo embaixo da terra. Como os do filme de 1956, estes também ficaram estéreis. A boa notícia: eles desenvolveram capacidades telepáticas. Apesar dos clichês, o filme é bem melhor do que se poderia esperar de uma pequena produção da época.
Um futuro parecido é encontrado em Passagem Para o Futuro (The Time Travelers, 1964), com uma sociedade devastada pela guerra nuclear desenvolvendo-se embaixo da terra e construindo um foguete com o qual pretendem se mudar para Alpha Centauri. Androides ajudam-nos. Um filme modesto, mas interessante.

A Máquina
A primeira adaptação da história clássica de H.G. Wells só surgiu em 1960. George Pal produziu e dirigiu A Máquina do Tempo (The Time Machine), com Rod Taylor e Yvette Mimieux, e conseguiu seu maior sucesso de bilheteria. Pouca coisa foi alterada do original e o destaque fica para os cenários e efeitos especiais excelentes que renderam um Oscar.
A década de 1960 oscilou entre maravilhas como A Máquina do Tempo e coisas ridículas como Viagem ao Núcleo do Tempo (Journey to the Center of Time, 1967), em que cientistas constroem máquina do tempo, vão até o ano 6968, voltam e encontram com eles mesmos, percebendo o quanto são chatos e trabalham mal, dando a história por encerrada. Menos ruim foi Cyborg 2087 (idem, 1966), produção para TV com Michael Rennie, o alien de O Dia em que a Terra Parou. Ele antecipa em muitos anos a viagem de Schwarzenegger, recuando no tempo para alterar o curso da história, mas a favor da humanidade.

 

O tempo também esteve no centro das preocupações do cineasta francês Alain Resnais, geralmente em filmes considerados um tanto "impenetráveis". Em O Ano Passado em Marienbad (L'Année Dernière a Marienbad, 1962), passado, presente e futuro mesclam-se até o ponto de ser impossível distingui-los. Mais tarde, ele retornaria às viagens em Eu Te Amo, Eu Te Amo (Je t'Aime, Je t'Aime, 1967), no qual elaborou uma espécie de máquina do tempo biológica que leva um homem desiludido de amor um minuto para o passado.
Para compensar os filmes ruins também surgiu o fantástico O Planeta dos Macacos (Planet of the Apes, 1968), que se desenvolveu numa série de cinco filmes que compõem o chamado "arco no tempo", uma série de acontecimentos de tal forma interligados que não se sabe qual a causa e qual o efeito. Esse tipo de círculo no tempo também surgiu mais tarde no excelente desenho animado O Garoto do Espaço (Les Maitres du Temps, 1982), de René Laloux, baseado no livro de Stefan Wul (L'Orphelin de Perdide, ou O Vagabundo das Estrelas, na edição portuguesa) e desenhos de Moebius.

O Garoto do Espaço.

Cult e Outras Viagens
Pouco conhecido é o filme brasileiro Homem das Estrelas (1971), em coprodução com a França. Uma nave alienígena cai na costa brasileira no século 14 e o sobrevivente assume a forma humana e viaja para o futuro em busca de tecnologia que o permita sobreviver. Claro que encontra muita violência e resolve partir mais para o futuro. Esperamos que não tenha viajado para nossa época, coitado.
Os aliens também tiveram papel importante nas constantes deslocações temporais do personagem central de Matadouro Cinco (Slaughterhouse 5, 1972), baseado no livro de Kurt Vonnegut Jr. e um dos melhores filmes de FC da época. As deslocações para o passado ficam por conta de sua memória, e as para o futuro por conta dos seres atemporais de Tralfamadore, que o levam para uma espécie de zoológico, onde querem que ele tenha relações sexuais com Valerie Perrine, no auge da forma física. Ele gosta!
O tempo virou cult movie nos anos 1970, quando Peter Fonda dirigiu Travessia Para o Futuro (Idaho Transfer, 1973), com uma viagem para o mundo pós-apocalíptico de 2044 e nítidas preocupações ecológicas. Apesar das boas intenções, ficou um tanto apagado por viagens no tempo mais elaboradas como as de Um Século em 43 Minutos (Time After Time, 1979), um verdadeiro achado que imagina o escritor H.G. Wells não apenas como o pai da FC, mas como alguém que realmente construiu uma máquina do tempo que, por acaso, é utilizada por Jack o Estripador (Malcolm McDowell). Ele vai parar no século 20 e Wells (David Warner) vai atrás dele. O contraste interessante é que Wells, o homem de visão, sente-se perdido no mundo futuro, enquanto Jack sente-se à vontade com a violência da cidade grande.

Malcolm McDowell como o escritor H.G. Wells, que realmente inventou a máquina do tempo, em Um Século em 43 Minutos.

Uma viagem no tempo que muita gente gostaria de ver ocorre em Nimitz, A Volta ao Inferno (The Final Countdown, 1980), com o super porta-aviões Nimitz atravessando uma irregularidade no tempo e surgindo em 1941, pouco antes do ataque japonês a Pearl Harbor. O que não ocorre é a decisão de interferir no curso da história, de modo que o filme se tornou uma gigantesca publicidade do poder norte-americano, e pouco mais que isso. O filme japonês Sengoku Jietai (1981), ao que se sabe inédito no Brasil, seguiu a mesma linha colocando uma tropa moderna no século 16, enfrentando samurais, porém envolvendo-se em batalhas, uma vez que seu comandante entende ser necessário alterar o curso da história para poder retornar ao seu próprio tempo.

De Volta para o Tempo
Os anos 1980 e 90 foram marcados por grande número de bons filmes de FC na linha viagens no tempo, a começar pelo intrigante Cavaleiro do Tempo (Timerider: The Adventures of Lyle Swann, 1983), pequena produção dirigida por William Dear e com roteiro e música do ex-Monkee Michael Nesmith, sobre motociclista (Fred Ward) que vai parar, com moto e tudo, no velho oeste, onde conhece uma ancestral (Belinda Bauer) que tem a deliciosa ideia de violentá-lo. Ele se torna, assim, responsável por sua própria existência no futuro.
Também interessante é Projeto Filadélfia (The Philadelphia Experiment, 1984), que tem como ponto de partida uma experiência que, segundo alguns, foi realmente realizada em 1943, com um navio dos EUA, e que teve como resultado o envio de dois marinheiros ao futuro e a abertura de uma zona de irregularidade temporal na Terra.
Mas não há dúvida de que dois filmes marcaram o tema. O Exterminador do Futuro (The Terminator, 1984) foi um salto na carreira de Schwarzenegger e do diretor James Cameron, além de trazer ação de primeira qualidade aliada a uma boa história. Em 1991, Cameron retornaria com O Exterminador do Futuro 2 – O Julgamento Final, dessa vez com Schwarzenegger como o cara bonzinho, num filme com efeitos visuais inacreditáveis, mas sem conteúdo. E as demais sequências, totalmente inúteis.
E, em De Volta Para o Futuro (Back to the Future, 1985), as viagens no tempo atingem um novo patamar, num equilíbrio quase perfeito de bom humor, efeitos excelentes e uma história alucinada que teria seqüência em mais dois filmes, produzidos em 1989 e 1990, sempre com direção de Robert Zemeckis. Quase tudo o que se refere às possíbilidades das viagens está presente na trilogia, desde os arcos fechados e a possibilidade de encontrar-se consigo mesmo, até as alterações temporais que modificam o futuro.
A maior parte dos filmes sobre viagens no tempo tornaram-se pálidos diante da trilogia de Zemeckis, mas algumas boas ideias foram aproveitadas com classe, a começar por Jornada nas Estrelas 4 – A Volta Para Casa (Star Trek 4: The Voyage Home, 1986), talvez o melhor e mais bem humorado da série Jornada, com direção de Leonard Nimoy e uma mensagem ecológica. Kirk e seus colegas têm de retornar à Terra do século 20 para encontrar uma baleia, a única forma de salvar o planeta no futuro. Alguns momentos dos homens do futuro na São Francisco dos anos 1980 são hilariantes.
Uma boa história também é a marca registrada de Millenium – Guardiões do Futuro (Millenium, 1989), baseado em história do excelente escritor John Varley. Num futuro em que o planeta se encontra devastado pela poluição e ninguém vive mais de 30 anos, é construída uma máquina do tempo que traz pessoas sadias do passsado, retirando-as de aviões que estão prestes a sofrer acidentes fatais. Mas numa das incursões, deixam uma arma no passado, o que pode causar uma alteração nas linhas do tempo.
Uma das melhores histórias sobre alterações temporais foi transformada no curta-metragem Meio-Dia e Um (12:01 PM, 1991), com Kurtwood Smith preso num looping temporal interminável. O filme inspirou a fantasia Feitiço no Tempo e originou um longa-metragem, Meia-Noite e Um (12:01, 1993). Mas um grande destaque fica mesmo com Os Doze Macacos (Twelve Monkeys, 1995), dirigido por Terry Gilliam, com Bruce Willis como um viajante do tempo na marrra, passsando por tantos problemas e erros cometidos pelo cientistas do futuro que chega a duvidar de sua sanidade ou de ser de fato um viajante do tempo. O filme foi baseado no premiado curta-metragem La Jetée, de 1963.

Bruce Willis, passando o diabo em Os Doze Macacos (aqui com Madeline Stowe).

As viagens no tempo estão no centro da criação da ficção científica e, apesar da quantidade às vezes apavorante de péssimas histórias e filmes produzidos, quando acertam, vale a pena. E ainda existem inúmeras histórias interessantes a ser contadas, sem falar no outro lado do tempo, as viagens a universos e mundos paralelos. Mas isso já é uma outra história.

Viagens na TV
A maior série sobre viagens no tempo já produzida para a TV é praticamente desconhecida no Brasil. Doctor Who, a produção inglesa que começou em 1963 e que ainda está fazendo sucesso, só chegou aqui com um episódio lançado em vídeo (Os Robôs da Morte) e pelos longa-metragens A Guerra dos Daleks (Dr. Who and the Daleks, 1965) e Ano 2150: A Invasão da Terra (Daleks – Invasion Earth: 2150 AD, 1966), ambos com Peter Cushing como o doutor que viaja no tempo utilizando-se de sua máquina disfarçada de cabine telefônica. É verdade que as temporadas mais recentes puderam ser acompanhadas na TV por assinatura, mas os mais antigos não.
O seriado mais conhecido dos brasileiros é, sem dúvida, O Túnel do Tempo (Time Tunnel, 1966/67), com Doug e Tony conseguindo cair sempre no meio de algum acontecimento histórico importante, apesar dos cientistas não terem qualquer controle sobre suas deslocações temporais. Alguns dizem até que a Lei de Murphy foi inventada por eles.
O fraquinho Viagem no Tempo (It's About Time, 1966) seguiu para o lado cômico, apresentando dois astronautas que vão parar nos tempos pré-históricos.

Em 1974, surgiu O Planeta dos Macacos (Planet of the Apes), criado por Glen A. Larson e baseado, pero no mucho, no filme clássico. Não foi um sucesso. Viajantes do Tempo (Voyagers From the Unknown, 1982) também não foi muito longe com as aventuras de um rapaz e um menino que viajam pelo tempo utilizando um aparelho chamado Omni. Encontram personagens históricos e "corrigem" o curso da história.
Em 1993 surgiu Time Trax (idem), com Dale Midkiff repetindo seu papel no filme Time Trax – Um Detetive do Futuro (Time Trax, 1993), como um policial atrás do malvadão do tempo, que envia criminosos ao passado. Uma lástima, como o original. Bem mais interessante é a premissa de Seven Days (1998), em que a viagem no tempo é realizada apenas sete dias ao passado, com tecnologia obtida da nave alienígena que teria caído em Roswell, em 1947.
Em 1994 uma minissérie apresentou uma interessante alteração temporal, ainda que não envolvesse uma viagem propriamente dita. Fenda no Tempo (The Langoliers) foi baseado em história de Stephen King (no Brasil, publicada no livro Depois da Meia-Noite), sobre pessoas que acordam no meio de um vôo e descobrem que atravessaram uma fenda no tempo. Arrepiante.