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3 LIVROS QUE PAREI DE LER

Livros/Matérias

autorGilberto Schoereder
publicado porGilberto Schoereder
data26/03/2021
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Às vezes, eu simplesmente desisto da leitura.

Não sei se isso acontece com todos os leitores, ou com a maioria, mas comigo é assim: às vezes, eu simplesmente desisto da leitura no meio do caminho – ou em um quarto do caminho, ou menos.
Os motivos podem ser os mais variados, mas em linhas gerais é que eu simplesmente acho que não vale a pena continuar. Posso achar chato, incompreensível, mal escrito ou qualquer outra coisa. E confesso que não sinto qualquer constrangimento em dizer que parei de ler um livro.
Isso acontece desde que comecei a me interessar por livros, mas, aqui, vou comentar três dos mais recentes, que parei de ler por motivos diferentes.
 

Para começar, Fogo & Sangue – Volume 1 (Fire & Blood, 2018), de George R.R. Martin, um calhamaço com 664 páginas.
O que passou pela minha cabeça antes de comprar o livro? Bom... primeiro, que era um livro de George R.R. Martin, o cara que escreveu (ou quase) a série Crônicas de Gelo e Fogo. Depois, pensei que, provavelmente, ele não iria terminar a saga, já que os livros restantes não chegam nunca e, agora que a HBO já terminou a série na TV, nem faria muito sentido. Nem vou discutir as razões que o levaram a não terminar a série de livros.
Seja como for, o nome de Martin já é algo a ser levado em consideração antes de comprar um livro. Ou não? E mais: Fogo e Sangue se passa no mesmo ambiente, não é? Contando a história “antes”. Seria uma daquelas famosas prequelas, como alguns gostam de chamar. Mas... é uma história legal, não é?
Comecei a ler o que eu achava que seria uma introdução histórica à narrativa em si. Depois de umas tantas páginas, percebi que o livro seguia na mesma toada até o fim; não havia propriamente uma história sendo contada, mas a História da história.
Assim, parei de ler e resolvi fazer uma pesquisa atrasadíssima. E o que encontrei foi assustador. Só para dar um exemplo, a crítica do jornal Times disse que se tratava de uma longa sinopse para cerca de 50 livros que jamais serão escritos. O jornal Independent, da Inglaterra, considerou o livro completo, mas frequentemente enfadonho. Em algum lugar cheguei a ler que não se tratava de um romance, nem de um livro de história, então só restava saber o que George Martin tinha escrito.
Eu certamente não sei. E diria que enfadonho é pouco para descrever. Talvez, apenas talvez, eu tenha chegado à página 50, antes de deixar de lado, cuspindo marimbondos, furioso pelo dinheiro jogado fora e pelo fato de que Martin estava enganando seu público. E não é que eu tenha algum problema em ler um livro de História; afinal, li com prazer as mais de 700 páginas de A Humanidade e a Mãe-Terra, de Arnold Toynbee, entre outros livros de História. Mas, afinal, o livro de Martin não é uma coisa nem outra.
Um livro tenebroso. E ainda tem a Parte 2. Tenha paciência!
 

E cheguei a Nova York 2140 (New York 2140, 2017), de Kim Stanley Robinson. Nunca tinha lido nada dele, apesar de já ter visto seu nome sendo mencionado em muitos artigos, e quase sempre com elogios rasgados. Ele tem uma bibliografia extensa, e comecei a ler com atenção e grande expectativa.
Consegui chegar à metade do livro, antes de desistir. Eu tinha outros livros para percorrer, e todos foram bem mais interessantes.
O que pegou, para mim, foi chegar à metade do livro e ainda não saber o que o autor pretendia, que história ele queria contar. Os capítulos são divididos de forma interessante, cada qual com o ponto de vista de um personagem, mas as personagens simplesmente... fazem coisas, na cidade de Nova York, em 2140, quando o oceano tomou grande parte do litoral em todo o planeta, devido ao aquecimento global.
Existem capítulos inteiros descrevendo os pensamentos e ações de um especialista no mercado de ações, com detalhes entediantes para quem não conhece esse ambiente, e ainda mais para quem não tem o menor interesse em conhecer os míííííínimos detalhes. Da mesma forma, capítulos inteiros descrevendo a geografia de Nova York, mas de tal forma que só quem mora na cidade, ou quem a visita frequentemente, pode ter a menor ideia do que ele está descrevendo, incluindo detalhes históricos, comparando como era e como ficou após a invasão do oceano.
E cheguei à metade do livro, e nada tinha acontecido. Então, larguei.
 

Certamente muitos leitores irão me xingar por eu ter parado de ler O Arco-Íris da Gravidade (Gravity’s Rainbow, 1973), de Thomas Pynchon. O escritor é considerado entre os maiores – frequentemente, “o” maior – do planeta. O livro em questão também frequentemente é citado entre os mais importantes da literatura mundial. E, apesar de não ter sido apresentado como um livro de ficção científica, várias vezes foi considerado como tal pelos críticos e pesquisadores do gênero, chegando a ser indicado para o Prêmio Nebula de 1974.
Esse também é um livro imenso, com 792 páginas, e com uma letrinha daquelas. E eu fui um pouco assombrado por sua presença. Ficou olhando para mim durante semanas, antes que eu resolvesse lidar com a dificuldade que, já sabia, teria pela frente. Já tinha ouvido pessoas comentando sobre seus livros, principalmente sobre V., e a complexidade das histórias do autor.
Mas estava decidido, e comecei a ler. Cheguei à página 100 antes de desistir. Perdi, e perdi feio; acho que de goleada. Derrota pior do que essa só a que eu sofri, muito tempo atrás, para o Ulisses, de James Joyce, outro que deixei de lado após umas tantas enfadonhas páginas.
Claro que fica uma sensação de que sou meio burro, ou muito, sei lá... Que deveria ser capaz de, pelo menos, chegar ao fim da história incompreensível, dos eventos que não fizeram o menos sentido para mim, das construções de frases inusitadas, das palavras que tive de procurar, constantemente, no dicionário, da quantidade de personagens que se confundem.
Claro, consegui entender que a primeira parte da história se passa durante a Segunda Guerra Mundial, mas eu não tenho a menor ideia do que estava acontecendo no ambiente apresentado. Tudo o que sei vem das sinopses e estudos que li posteriormente, de modo que não adianta nada falar sobre isso, sobre coisas que não percebi, talvez, repito, porque sou meio, ou muito, burro, incapaz de lidar com as complexidades de uma análise semiótica que considere a forma literária como a quintessência da criação literária.
Pode ser que algum dia eu tente novamente, mas eu duvido.