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AS PRIMEIRAS QUINZE VIDAS DE HARRY AUGUST

Livros

autorGilberto Schoereder
publicado porGilberto Schoereder
data20/10/2017
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Ao que tudo indica, o mundo pode estar acabando. Essa é uma mensagem importante passada do futuro para Harry August, um dos kalachakras, pessoas que renascem inúmeras vezes, no excelente livro de Claire North.

Claro que a primeira coisa que chamou minha atenção para o livro foi o título. Eu tinha acabado de ler Revivente, de Ken Grimwood, que conta a história de um sujeito que morre, mas recobra a consciência com 18 anos, vivendo sua vida novamente, e de novo, e de novo. E me deparo com outra história, semelhante, mas ainda assim muito diferente. E fui pego de surpresa pela narrativa deliciosa e um enredo cativante e criativo.
A autora, Claire North, é Catherine Webb, nascida em 1986, que começou a carreira literária aos 14 anos, sendo publicada aos 16, para o público conhecido como “jovens adultos” (durma-se...). Depois, passou a utilizar o pseudônimo Kate Griffin para publicar obras de fantasia para adultos; e o pseudônimo Claire North para uma série de livros tidos como ficção científica. As Primeiras Quinze Vidas de Harry August ganhou o John Campbell Memorial Award como o melhor livro de ficção científica do ano (2015), e foi indicado para o Arthur C. Clarke Award e para o British Science Fiction Association. Ainda assim, é difícil entender a história como ficção científica, mas sim como fantasia. Ainda assim, é possível entender que cada vida de um kalachakra se passe em um mundo paralelo. Mas isso não importa muito.
Harry August, o personagem central e o narrador da história de suas vidas, é um entre, provavelmente, milhares de humanos que têm a capacidade de renascer. Quando morrem, renascem no exato momento em que a vida anterior começou, e iniciam novo ciclo, lembrando-se de sua vida anterior quando atingem cerca de seis anos de idade. Harry nasceu em 1919, e faz parte dos seres conhecidos como ouroboranos, ou kalachakras. O primeiro nome vem de Ouroboros, o símbolo da serpente ou dragão engolindo a própria cauda, significando, entre outras coisas, o “eterno retorno”, o ciclo eterno da criação e destruição; kalachakra é o termo sânscrito para a “roda do tempo”, o ciclo do tempo repetindo-se eternamente.
Apesar de a vida poder se tornar extremamente entediante quando se é obrigado a repeti-la dezenas de vezes, alguns kalachakras conseguem encontrar ânimo e novos interesses para seguir adiante fazendo algo mais do que enriquecer e levar uma vida de prazeres.
As vidas, e a missão singular de Harry August, assim como o cerne de todo o livro, são definidos na introdução, quando o narrador Harry diz: “Escrevo para você. Meu inimigo. Meu amigo. Você sabe, já deve saber. Você perdeu”. E a missão de suas vidas é definida no primeiro capítulo, em 1996, num momento em que Harry estava morrendo, novamente, e recebe a visita de uma menina de 7 anos, que lhe repassa importante mensagem do futuro: “O mundo está acabando”.
Os kalachakras conseguem algumas vantagens em suas novas vidas graças à atuação do Clube Cronus, uma organização com sedes em todo o planeta, reunindo ouroboranos e ajudando-os em suas reentradas no mundo. E eles conseguem mandar mensagens de um tempo para outro, por meio dos kalachakras mais jovens aos mais velhos, para que, quando renasçam no passado, possam passar a mensagem aos mais velhos de sua época.
A mensagem de que o mundo estava acabando realmente mexe com Harry e dá início a uma pesquisa intensa para saber exatamente do que se trata, o que realmente pode estar acontecendo no futuro.
O “meu inimigo, meu amigo” do início da narrativa é a nêmese de Harry, em algumas de suas vidas conhecido como Vincent Rankis, que tem como objetivo descobrir nada menos do que... tudo. Ele quer construir um aparelho, conhecido como "espelho quântico", que ele acredita que lhe dará a resposta não apenas para o que são os kalachakras, mas para qualquer pergunta sobre o universo. No entanto, a construção desse aparelho pode significar o fim do mundo.
O relacionamento entre o “vilão” Rankis e o “herói” August é um dos pontos altos do livro, uma relação de amor e ódio que só se define completamente ao final do livro, e de forma sensacional.
Uma beleza de obra.