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COLOCANDO AS SÉRIES EM DIA: COUNTERPART

Séries de TV

autorGilberto Schoereder
publicado porGilberto Schoereder
data21/07/2019
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Um dos melhores seriados de ficção científica dos últimos anos.
J.K. Simmons, como os dois Howard Silk.

Vi poucos comentários sobre Counterpart, seja na internet, seja em jornais e revistas. O seriado, que teve sua segunda temporada apresentada pela TNT Séries em julho, já foi suspenso pelo canal Starz, mas os produtores e roteiristas conseguiram apresentar um final apropriado. Ainda assim, existem notícias de que a produtora, Media Rights Capital, está procurando outra mídia para continuar a apresentá-lo.
Seja como for, Counterpart é um dos melhores seriados de ficção científica apresentado na televisão em muitos anos. Em grande parte devido à atuação espetacular de J.K. Simmons. E é uma história a respeito de universos paralelos, o que não é muito comum nas séries do gênero.
Para apresentar a premissa básica, voltamos a 1987, quando um acidente não explicado cria uma conexão com um universo paralelo. Na verdade, o universo paralelo é criado a partir do acidente, exatamente igual ao original, o nosso. No entanto, quanto mais tempo passa, mais a história dos universos se diferencia.

                                                                              A passagem subterrânea entre os dois universos.

No momento em que a série inicia, os dois mundos já mantêm um relacionamento, que é mantido em segredo do resto da população; aparentemente, até mesmo os governos dos dois mundos não sabem da existência de uma passagem subterrânea em Berlim unindo os mundos. Até mesmo os funcionários dos escritórios que cuidam dos negócios realizados pelos mundos não sabem do que se trata, até que atinjam um nível mais elevado de segurança.
As instruções para os membros mais qualificados vêm de uma diretoria que jamais é vista, apenas ouvida por intermédio de um aparelho codificado; suas vozes são ouvidas apenas pelas pessoas escolhidas para repassar suas instruções. A ideia é que o intercâmbio entre os dois universos traz imensas vantagens no desenvolvimento científico, que eles negociam.
Mas esse relacionamento está longe de ser tranquilo e sem problemas. Agentes de ambos os mundos estão constantemente realizando missões secretas para suas diretorias, não apenas atravessando de um mundo a outro, mas interferindo nos eventos de ambos os lados. E, para complicar, existe um grupo terrorista conhecido como Indigo, que treina pessoas para assumirem o lugar de suas cópias no outro mundo, para infiltrar-se e, possivelmente, empreender uma ação terrorista em represália ao que eles entendem ter sido uma ação de guerra do mundo original, Alpha, ao soltar um vírus que eliminou grande parte da população do mundo criado, chamado Prime.

J.K. Simmons interpreta Howard Silk. No mundo original, ele tem uma personalidade pacata, trabalhando para o gabinete responsável pelo relacionamento entre os mundos, mas sem saber do que se trata, uma vez que não tem autorização de segurança. No mundo Prime, ele é um agente qualificado do mesmo escritório, com uma personalidade forte e capaz de matar com facilidade.

Simmons e Olivia Wiliams.

A esposa deles é interpretada por Olivia Williams que, no mundo Alpha, encontra-se em estado de coma após um acidente, e no mundo Prime está separada de Howard e é uma das figuras mais importantes do escritório de intercâmbio.
As ações dos dirigentes e dos agentes em ambos os mundos lembra muito o período da Guerra Fria entre EUA e URSS, com planos dentro de planos, contatos secretos e tentativas de adivinhar o que o “outro lado” está planejando. A desconfiança crescente cria uma atmosfera pesada, passando a impressão de que os personagens nunca estão falando o que realmente pensam, que sempre existe uma segunda intenção não revelada, ao mesmo tempo em que os dirigentes tentam manter uma relação diplomática minimamente sustentável.

                                                                                                                     O contato com a diretoria.

As interpretações são excelentes, mas Simmons é o destaque, mudando radicalmente de uma cena a outra – e, às vezes, na mesma cena, quando os dois Howard Silk se encontram – alterando até mesmo a postura corporal, com pequenos gestos fazendo toda a diferença. Quem viu e gostou de sua atuação no excelente Whiplash: Em Busca da Perfeição (Whiplash, 2014), dirigido por Damien Chazelle – atuação pela qual recebeu os prêmios de Melhor Ator Coadjuvante do Oscar, do Golden Globe e do BAFTA, entre outros – vai encontrar ainda mais momentos deliciosos em Counterpart. Ele ainda conseguiu desenvolver uma terceira interpretação uma vez que, na segunda temporada, seu personagem Howard Silk do mundo Prime está no mundo Alpha se fazendo passar pelo outro Silk, contendo-se para parecer o sujeito tímido e retraído do mundo original. É espetacular e engrandece ainda mais o seriado.
Olivia Williams também tem uma participação destacada, já que é personagem central nos dois mundos, e se vê dividida entre a vida que tem e a que poderia ter, tentando entender não apenas o que está acontecendo entre os universos, mas a relação com o marido que tem, ou que teve. Excelente.

Se a Media Rights Capital conseguir dar sequência à série em alguma plataforma, certamente ainda existem histórias para contar. Mas caso isso não ocorra, é bom que se diga que o final não é exatamente feliz. Longe disso. Ainda que exista a possibilidade para diferentes linhas de ação, o que se prevê é mais um mundo profundamente afetado pelas ações do outro. E também é bom que se diga que se trata de um final racional, dentro das expectativas a partir das ações tramadas de lado a lado.
Seja como for, Counterpart é um seriado maravilhoso, que mereceria um público muito maior do que o que teve, ainda que seja compreensível: em tempos em que as histórias na ficção científica (em particular no cinema e TV) ou são melosas ou são "ação e porrada", as tramas mais pesadas quase sempre levam a pior. Parece que o grande público espera mesmo pelo mais óbvio, pelo mais simples, o que não é o caso aqui.
Não sei se a TNT Séries vai manter a série disponível, mas é bom tentar encontrar e assistir desde o início. Quem gosta de boa ficção científica não vai se decepcionar.