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COLOCANDO A LEITURA EM DIA: O LIVRO DO JUÍZO FINAL

Livros/Matérias

autorGilberto Schoereder
publicado porGilberto Schoereder
data18/06/2020
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Livro premiado de uma das melhores autoras da ficção científica atual.

Conhecia pouco da obra de Connie Willis, uma das autoras mais respeitadas e premiadas da ficção científica. Já tinha lido Território Inexplorado e o conto Em Cartaz, publicado na coletânea O Príncipe de Westeros e Outras Histórias. Nas duas histórias, chamou a atenção o humor com que Willis trata os temas apresentados, e isso aparece também, pelo menos em parte da narrativa, em O Livro do Juízo Final.
Eu sabia que era uma história envolvendo viagens no tempo, mas confesso que não sabia que iria ler também sobre um tema dos mais atuais; uma epidemia. Na verdade, duas epidemias diferentes, ocorrendo em dois momentos distintos no tempo.
O livro faz parte de uma série a respeito de viagens no tempo realizadas por historiadores de Oxford. O bom é que pode ser lido independentemente dos demais, apesar de apresentar em todos os livros o personagem Professor James Dunworthy. O livro recebeu os prêmios Nebula (1992), Hugo e Locus (1993).
Em um futuro não especificado, as viagens no tempo tornaram-se comuns, e o departamento de História da Universidade de Oxford realiza uma série de pesquisas enviando especialistas a épocas específicas do passado. As viagens são realizadas de tal forma a evitar paradoxos temporais; a máquina simplesmente não funciona, ou não abre uma passagem para um período se isso for causar um paradoxo. Da mesma forma, os historiadores classificam as épocas de acordo com o perigo que podem representar para os viajantes, que vão devidamente preparados e instruídos, não apenas no que se acredita serem os costumes locais do período desejado, mas no idioma falado.
Em O Livro do Juízo Final, além do professor Dunworthy, a personagem Kivrin Engle, jovem historiadora, também é o centro da narrativa após realizar uma viagem para a Idade Média, mais exatamente para o ano de 1320, nas proximidades de Oxford. Só que algo sai errado, e ela vai parar no ano de 1348, quando a Peste Negra já havia chegado à Inglaterra.
Ao mesmo tempo, uma epidemia de influenza faz com que Oxford seja colocada de quarentena, complicando muito as tentativas de Dunworthy em abrir a passagem temporal e trazer sua protegida Kivrin de volta.
Connie Willis estabelece uma relação entre as condições de tratamento de uma epidemia na Idade Média e no futuro próximo apresentado, deixando ainda mais nítida a distância existente entre as duas civilizações, não bastasse o fato de os habitantes de 1348 falarem um idioma tão distante do inglês contemporâneo que é como se fosse outra língua.
A narração das dificuldades de Kivrin na Idade Média apresenta grande riqueza de detalhes, o que torna ainda mais notável a adaptação da personagem à sua nova condição.
As partes humorísticas ficam por conta dos personagens paralelos que importunam a vida do Professor Dunworthy, como se a epidemia em curso significasse quase nada em suas vidas, ainda que pessoas estivessem morrendo. Enquanto ele se desdobra para ultrapassar a barreira política interna da universidade, as brigas pelo poder e a tentativa de determinar como e onde a epidemia começou, as pessoas à sua volta continuam suas vidas com preocupações menores. O contraste entre as duas situações é um dos pontos altos da história.
Às vezes, o livro lembra muito algumas situações que estamos vivendo no mundo no momento. Existe, inclusive, uma referência a uma pandemia ocorrida alguns anos antes e que fez com que determinados protocolos de segurança passassem a ser imediatamente acionados diante do menor indício de uma nova onda epidêmica.
Seria muito bom que a editora publicasse os demais livros no Brasil.


O LIVRO DO JUÍZO FINAL (Doomsday Book, 1992)
Connie Willis
576 páginas
Suma de Letras (2017)