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AS DEZ MIL PORTAS

Livros/Lançamentos

autorGilberto Schoereder
publicado porGilberto Schoereder
data04/08/2020
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O romance de estreia da escritora Alix E. Harrow, com uma fantasia envolvente.

Alix E. Harrow é uma escritora norte-americana ainda pouco conhecida, mas que já tem em seu currículo o Prêmio Hugo de melhor conto, de 2019, com A Witch’s Guide to Escape: A Practical Compendium of Portal Fantasies (2018), publicado em Apex Magazine.
E, pelo que se vê em As Dez Mil Portas, é bem possível que Harrow tenha chegado para ficar e marcar seu nome no gênero, apresentando uma narrativa deliciosa, envolvente e inteligente.
É verdade que não se trata de um tema novo, como a própria protagonista, January Scaller, deixa claro no início de sua narração. E, ainda assim, de certa forma o tema é abordado de uma maneira nova. O conceito de portais que levam a mundos diferentes é frequente nas histórias de fantasia e, aqui, os mundos que se abrem aos viajantes também podem ser vistos como mundos paralelos, alguns mais parecidos com o nosso, outros muito diferentes.
Quando a história inicia, January tem apenas sete anos. Ela tem uma vida completamente diferente da maioria das crianças com pais de raças diferentes, nos Estados Unidos do início do século 20, e ela também começa a perceber que o mundo é bem mais complexo do que podemos imaginar.
Ela vive em uma mansão, de propriedade do rico senhor Locke, para quem o pai de January trabalha, coletando objetos raros para sua imensa coleção. E, aparentemente, é bem tratada pelo ricaço, ainda que eventos futuros vão mostrar a verdadeira face de inúmeros personagens do livro.
January, que vive em um mundo fechado na mansão e pela “proteção” de Locke, encontra refúgio e inspiração nos inúmeros romances fantásticos que lê enquanto os anos passam, período em que pouco vê seu pai, sempre viajando a serviço.
Mais do que isso, ela irá encontrar um livro especial, com uma história fantástica relacionada aos seus pais e à sua própria existência. E, sem querer contar muito do enredo, January irá descobrir como as portas, as passagens para outros mundos, funcionam, assim como vai perceber o poder das palavras escritas; e, mais exatamente, o poder que suas palavras escritas podem ter.
Também interessante é a ideia de um livro dentro de um livro, palavras explicando palavras, abrindo caminhos e, ao mesmo tempo, ampliando o mistério que cerca a vida de January. A história dentro da história não afasta o leitor do conceito central, mas leva-o cada vez mais para dentro do enredo.
As portas da história, além de passagens para outros mundos, também são instrumentos de mudança, de transformação e de variedade, dando aos viajantes uma visão mais abrangente do universo e de nossa Terra, colocando-os em contato com outros tipos de pessoas.
O contraponto às aventuras que January irá viver é um grupo de pessoas – entenda-se homens brancos e ricos – que deseja impedir que o conhecimento sobre as portas se torne público. Mais do que isso, eles pretendem fechar as portas como uma forma de manter o mundo intocado, sem transformações, sem rebeldias, sem transformações, mantendo seu poder e riqueza. E, para manter as coisas do jeito que desejam, essas pessoas são capazes de qualquer coisa, qualquer ato, inclusive assassinatos.
Uma beleza de estreia, que nos faz querer mais.


As Dez Mil Portas (The Ten Thousand Doors of January, 2019)
Alix E. Harrow
384 páginas
Universo dos Livros (2020)