Artigos

O HOMEM QUE CAIU NA TERRA

Livros

autorGilberto Schoereder
publicado porGilberto Schoereder
data10/09/2016
fonte
A Darkside lança no Brasil O Homem que Caiu na Terra, importante livro de ficção científica, de Walter Tevis.

Certamente não foi por acaso que a Darkside escolheu para a capa do livro uma imagem do filme com David Bowie, baseado no livro de Walter Tevis. O filme acabou sendo mais conhecido do que o livro, em parte pela presença sensacional de Bowie.
Mas, no fim das contas, o livro é melhor do que o filme, que tomou algumas liberdades com a história original, que chegaram a ser criticadas na época de seu lançamento, mas que podem ser perfeitamente entendidas, uma vez que nenhum livro consegue ser adaptado literalmente para a tela.
O tom do livro é mais ácido, mais sarcástico e até mesmo deprimente, ao contar a história do alienígena que chega ao nosso planeta e se disfarça de humano o melhor que pode. Trazendo consigo muitos anéis de ouro, ele os vende para iniciar sua caminhada rumo à fortuna, tornando-se uma das “pessoas” mais ricas do planeta ao registrar nove patentes básicas. Seu plano vai sendo conhecido aos poucos, enquanto algumas pessoas mais próximas a ele percebem que ele é “diferente”. E não digo mais nada caso alguém ainda não conheça a história.
O livro já foi apresentado como um pequeno clássico da ficção científica. Não sei se chega a isso, mas é um livro importante, em particular na caracterização do alienígena e por centrar a história nele e como sua estadia na Terra transforma seu comportamento.
Já se disse que a história pode ser uma referência à Guerra Fria entre EUA e URSS que, na época do lançamento do livro, em 1963, ainda estava em curso, ameaçando a existência da humanidade. Numa matéria de 2004 no jornal The Boston Globe, o articulista James Sallis refere-se ao livro como um dos melhores de ficção científica jamais escritos. Pode ser um exagero, mas o livro é realmente uma maravilha. Sallis também se refere ao fato do próprio Walter Tevis (1928-1984) ter dito que a história também tinha um fundo autobiográfico, uma vez que ele saiu de São Francisco quando criança indo morar no interior do Kentucky; Tevis também teve uma doença quando criança, ficando muito tempo de cama e, depois, com uma saúde bastante frágil. E o autor também percebeu, após escrever o livro, que a história tinha a ver com o fato de ele ser alcoólatra.
Mas essas podem ser referências vagas para o leitor. O que fica mais claro é a solidão em que os personagens vivem. Mesmo quando estão juntos, cada um parece imerso em seu próprio mundo, em seus próprios problemas, aparentemente insolúveis, como deve ser insolúvel a permanência dos seres humanos na Terra, pelo menos sem tentarem constantemente destruí-la. O extraterrestre, o senhor Newton, vê os terrestres como crianças, totalmente sem controle de suas armas e capazes de acabar com um mundo belo. Mas sua fraqueza física, o peso moral e ético que carrega o impede de continuar com sua missão. De certa forma, Newton transforma-se em humano, ou é transformado, tanto pela ação dos órgãos do governo quanto pela convivência com os humanos e pelo desespero de sua situação e de seu planeta de origem, para ele um peso tão grande quanto o da gravidade terrestre.


O autor

Walter Tevis ficou bastante conhecido após o sucesso de seu livro Desafio à Corrupção (The Hustler, 1959. No Brasil, pela Editora Record), e principalmente após ter sido levado para o cinema em 1961, com direção de Robert Rossen, e com Paul Newman no papel do jogador de sinuca. Apesar do título em português não ter nada a ver com o original, a história é excelente.
Tevis escreveu uma sequência em 1984, A Cor do Dinheiro (The Color of Money, 1984), também adaptado para o cinema em 1986, com direção de Martin Scorsese, e Paul Newman reaparecendo, ao lado de Tom Cruise.
Na ficção científica, Walter Tevis escreveu outra excelente história, Ave do Arremedo (Mockingbird, 1980).

O filme e o livro

Dirigido por Nicolas Roeg em 1976, o filme tornou-se bem mais conhecido do que o livro, apesar de algumas críticas pesadas que chegou a receber. Hoje, é visto por muitos críticos como um clássico da ficção científica, e é realmente sensacional.
Numa cena não muito bem entendida, Newton (Bowie) passa de carro por uma estrada e, num local onde os humanos não veem ninguém, ele consegue perceber pessoas acampadas, certamente de uma época passada. As pessoas também veem o carro e se assustam. É como se fosse uma porta para o passado, que apenas o alienígena consegue ver.
Talvez tenha sido uma forma de Roeg fazer uma referência a algo que Newton diz no livro de forma bem mais explícita. Ele explica que os antheanos – sim, ele é do planeta Anthea – já estiveram na Terra em épocas passadas. Mais do que isso, Newton diz que os nossos idiomas derivam do idioma deles, além do que ele entende que as religiões terrestres tiveram origem nas visitas do antheanos, no passado longínquo.